HITLER TINHA RAZÃO
 
Certa vez Hitler foi convocado para arbitrar discussão entre dois grupos “científicos” que divergiam sobre determinada questão. A dúvida era se o interior da terra era oco (tese defendida por um grupo de místicos teosofistas) ou se seu núcleo era preenchido por rochas e metais, como diziam os geólogos. Hitler, que não entendia absolutamente nada do assunto, deu de ombros e respondeu: “Tanto faz. Ambos podem ter razão”. Quando lhe objetaram que a ciência precisa ser coerente em seus postulados, ele respondeu que a coerência era um vício mortal.
Essa passagem está registrada no livro “O Despertar dos Mágicos” de Pauwels e Bergier. Lembrei-me dela ao ouvir o presidente eleito Bolsonaro e conclui que pelo menos no gênero, Hitler acertou. Políticos, de fato, não precisam ter coerência em seus pensamentos e ações. Assim, podem mudar de idéia e de posturas mais do que o Nei Matogrosso muda de roupa em seus shows, que ninguém vai lhes cobrar isso.
Em política, principalmente no Brasil, a coerência é, de certo, um vício mortal. Se não fosse não haveria tantos partidos políticos com tantas trocas de legenda entre eles, como  acontece em épocas que antecedem e precedem eleições. Não há tantas ideologias no mercado das ideias para justificar a existência de tantos partidos nem tantos programas partidários para suportar um número tão grande de aventureiros em busca de uma mamata, ou uma sinecura qualquer, no serviço público.
O discurso do Bolsonaro sugere que ele não tem nenhum amor pela coerência. Diz para todo mundo que seu governo não se pautará por critérios ideológicos, mas age tão ideologicamente como o mais fundamental dos petistas. Se a ideia de transferir a embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém não é motivada por questões ideológicas, então nenhuma mais será. Se acabar com o Ministério do Trabalho por ele ser manipulado pelos sindicatos e estar infestado de petistas, também não é motivado por ideologia então talvez não mais existam ideologias. Também disse que não nomearia ninguém por indicação de partidos e nomeou a deputada Tereza Cristina, indicada pelo DEM.
Isso não quer dizer que ele não esteja certo. Se o governo de Israel considera que a capital do país é Jerusalém, é lá que a embaixada do Brasil deve estar. E o Ministério do Trabalho como engrenagem da máquina pública nunca serviu para nada, a não ser fornecer empregos para líderes sindicais e políticos afinados com seus interesses. Sua extinção não prejudicará o país. E a Justiça do Trabalho também não, se ele, por acaso, decidir acabar com ela.
Bolsonaro é um político de direita, mas se precisar, flertará com a esquerda sem nenhum constrangimento.  É da essência dos políticos o desprezo pela coerência. E não podemos condená-los por isso. Afinal, se usamos guarda-chuva e galochas nos dias de chuva, também precisamos de bermudas e óculos escuros nos dias de sol. Hitler tinha razão. Se até a natureza é incoerente, porque os políticos não podem ser?