Meu voto vai para...

A história da República brasileira tem divisões bem nítidas.

Primeiro, veio o período de transição, a mando dos generais da virada do século XIX para o século XX. O objetivo foi o de manter a ordem e assegurar o estabelecimento das instituições republicanas.

Passada a fase inicial, o poder foi entregue à sociedade civil. No entanto, já nesse primeiro momento, uma elite se encarregou de ocupa-lo e dividi-lo entre oligarquias: 1) a do café, representada pela elite paulista; 2) a do leite, representada pela elite de Minas.

A crise de 29, ao enfraquecer a elite dominante, nos rendeu a possibilidade de sair daquela bolha, num vazio ocupado por Getúlio Vargas, nosso primeiro trabalhista.

O período de Vargas é historicamente reconhecido como aquele em que ocorreram os maiores avanços em nossa sociedade e economia. O período em que o país mais cresceu e em que direitos sociais e trabalhistas mais proliferaram.

Após uma pequena trava de nossas elites, com JK, tínhamos a oportunidade de alçar à presidência um político disposto e capaz de aprofundar as políticas de Getúlio. Mas João Goulart foi deposto.

E então veio o período militar. E não vou me esgotar sobre o assunto relacionado a esse período. A história está aí, e estou apenas a refletir um pouco.

Chegamos, enfim, ao início dos anos 80, com a redemocratização. O ponto que quero salientar é que, na década de 60 tínhamos uma economia mais competitiva que China, Coréia e outros tigres asiáticos. E que tal vantagem ainda se verificava no fim do regime militar.

Veio então a nova República, e os últimos trinta anos foram comandados especialmente por três partidos: PMDB, PSDB, PT.

O PMDB deu o tom da conversa: exerceu a presidência da República e depois passou a agir nos bastidores. Sempre "na pista para negócio" com todos os governantes que alcançassem o palácio do planalto. Ressalte-se que Fernando Collor de Mello era dos quadros do partido, assim como seu vice, Itamar Franco. Deixaram o partido porque este insistira na candidatura de Ulisses Guimarães (candidatura que, assim como a de Henrique Meirelles hoje, é apenas para inglês ver. O PMDB realmente não gosta da presidência, os bastidores lhe são muito mais proveitosos).

Seguiu-se a era do PSDB, o qual aparentemente manteria uma hegemonia. Representa a direita beneficiada pela queda do muro de Berlim e o colapso soviético, "o fim da história" de Fukuyama, enfim. E, assim como a geopolítica externa decretou sua ascensão, também ditou seu declínio: a crise econômica de 1998 bombardeou as pretensões do partido de se perpetuar no poder.

Assim, tivemos o início da "era Lula". E por treze anos, tão recentes que não há aqui, a meu ver, a menor necessidade de descrevê-los, fomos comandados por um líder carismático, porém dúbio. Muitos brasileiros saíram, temporariamente, da zona de miséria. Temporariamente, já que as medidas não criaram raízes, tanto que foram rapidamente extintas por um governo golpista de transição no qual nos encontramos hoje. Por outro lado, quero registrar que nunca antes na história desse país os banqueiros lucraram tanto.

Sou adepto de uma teoria segundo a qual as elites brasileiras, na eminência de terem de devolver o poder à sociedade civil com o fim do regime militar, e com receio de que o poder fosse devolvido ao trabalhismo, representado agora por figuras como Leonel Brizola - que voltaria do exílio - teriam se preocupado em criar um trabalhista para chamar de seu. E assim surgiu, então, o PT.

Desse modo, o PT, na condição de "fogo amigo" da aristocracia, impediu Leonel Brizola de vencer as eleições de 89, e perdeu não só o segundo turno como também toda a década seguinte para os Fernandos.

Agora, às vésperas da eleição, vejo o embate principal entre Bolsonaro e Haddad. Haddad é o PT que acabei de descrever. Com um agravante: como dizem os próprios eleitores de Lula, é um poste nomeado por este (Lembra Dilma?).

Bolsonaro, por sua vez, é o supra-sumo, o puro-suco do que há de pior da elite brasileira.

Aqui, cabe fazer uma observação sobre as nostalgias e sobre os tipos de candidatos presentes nesta eleição:

1) Existe a nostalgia dos anos recentes, governados pelo PT, concretizados na candidatura de Fernando Haddad;

2) Existe outra nostalgia, que remete aos anos de chumbo do período do golpe militar (Você era feliz e não sabia? Sério?)

3) Mas há, também uma nostalgia silenciosa, porém mais importante que as demais, que é a do trabalhismo e do nacional desenvolvimentismo. Essa representada pelo candidato do PDT, Ciro Gomes.

Em relação aos candidatos que eram presidenciáveis há aproximadamente um ano, eu os dividi em três grupos: 1) os nanicos; 2) os da bolha; 3) os de real candidatura. Cabem aqui definições a respeito:

NANICOS - Os candidatos nanicos são aqueles cuja candidatura não tem a menor pretensão de vitória. Em alguns casos, o objetivo da candidatura é levantar uma bandeira, como foi o caso de Luciana Genro, na eleição passada, e como seria, a priori, a candidatura de Jair Bolsonaro, nesta. Há também aqueles cujo objetivo é fazer negócios no segundo turno. Há candidaturas nanicas meramente estratégicas, que visam retirar votos de um ou de outro campo e, por fim, há os "marronzinhos" de sempre.

BOLHA - Os candidatos da bolha são figuras carismáticas que, no entanto, perguntadas sobre seu objetivo de exercer o governo, aparentemente não possuem muita definição. Valem-se de suas imagens que inspiram idoneidade, caráter e carisma. São candidaturas que, na maioria das vezes, tendem a murchar. Não foi assim com Collor, em 89, cuja bolha fora inflada pela mídia, que o batizou com a alcunha de "o caçador de marajás". Identifiquei que nesta eleição haveria três candidaturas deste tipo: a de João Dória, a de Marina Silva e a de Jair Bolsonaro.

João Dória murchou antes mesmo da largada. Marina Silva, mais uma vez, perdeu o fôlego no meio do caminho.

Já em relação a Jair Bolsonaro cabe uma observação. Em condições normais de temperatura e pressão, o que representaria sua candidatura? Jair nunca administrou nada,não foi prefeito, governador, secretário de alguma prefeitura ou governo de Estado, nunca foi ministro. E, mesmo na legislatura, em trinta anos apenas desempenhou o cargo de deputado federal, e, em tanto tempo, jamais aprovou uma medida. Desse modo, se nada demais tivesse acontecido, Jair bem que poderia ser o Marronzinho da vez.

Mas o PT lhe fez um grande favor. Partidos de esquerda trabalham em sistema de duas fases. A primeira, visa reduzir a pobreza. Depois, busca-se as mudanças sociais no campo dos costumes.

E, como naquelas aulas de física elétrica em que aprendemos sobre indução eletrostática, um corpo neutro ao ser posto em contato com um corpo eletricamente carregado assume uma carga contrária à deste. Ora, quando o PT estimulou a mudança de costumes, inflou o setor conservador, diametralmente oposto a essa mudança. Jair Bolsonaro se utilizou desse movimento como o trampolim que o elevou de nanico à condição de bolha.

Ora, mas como disse acima, bolhas tendem a desinflar. E isso vinha acontecendo. Achava eu que, com o início dos debates e entrevistas, parcela do eleitorado mais centrado e com os pés no chão, ao avaliar os candidatos, compreenderia que tal candidatura não poderia ser levada muito a sério. E isso, de fato, começou a ocorrer. Aos poucos, a vantagem de Jair Bolsonaro começou a declinar, a medida em que o candidato ou seus vices abriam a boca.

Mas aí veio o atentado, e com este a solidificação de sua condição eleitoral.

OS DE REAL CANDIDATURA - Finalmente, há os candidatos de real candidatura, que são aqueles que, independentemente de terem carisma, têm propostas e plano de governo plausível e bem definido. Apenas três candidaturas preenchem tais requisitos: a do PT, a do PSDB e a do PDT.

NACIONAL DESENVOLVIMENTISMO versus NEOLIBERALISMO

Não vamos aqui discutir o que é melhor para o país, mas há uma candidatura que defende o primeiro, e outras duas que defendem o segundo. Isso dentre as principais. Recentemente, vimos a privatização de ativos de muito valor para o povo brasileiro, vendidos a preço de banana, o que afeta, indubitavelmente, nossa soberania. O candidato do PT já avisou que respeita os contratos anteriormente firmados, de modo que a venda da EMBRAER e a entrega dos postos de pré-sal deverão, em seu governo, ser mantidos.

Cabe aqui meu conceito de engrenagem neo liberal, no qual temos uma embreagem, representada pelo PMDB; um acelerador, o PSDB; e um freio, o PT. A embreagem está em ação neste exato momento. O acelerador no momento é substituído pelo conveniente (para a elite) PSL, com Jair Bolsonaro. O freio é o que dá à população das camadas mais humildes a sensação de ter um governo paizão, que olha para elas. Mas basta olhar para a lucratividade do setor bancário e para a manutenção das taxas de juros elevadas para compreendermos que o freio neoliberal é apenas isso, neoliberal. É como aquela história do tira bom e do tira malvado.

CONCLUSÃO

O PSDB ficou em 20 anos atrás, com suas ideias engessadas e, há muito, reprovadas pela maioria do eleitorado brasileiro. Perdendo o protagonismo nestas eleições e, ainda, com a possibilidade de perda do governo (de seu feudo) em São Paulo, e sem que haja nomes novos em seus quadros (apesar de FHC ter tentado emplacar Doria e Huck!... Sério!) a tendência é que o partido murche, como seu picolé de chuchu.

O PT deseja voltar ao poder. Alega que em seu governo o Brasil foi mais feliz e próspero. Em verdade, entendo que os banqueiros também pensem assim, e que a resistência em aceitar seu retorno talvez apenas reflita alguma necessidade que o sistema tenha, agora, de alavancar certas agendas neoliberais. Hora de usar o acelerador.

Ciro Gomes é hoje o único que, para mim, representa uma saída do escopo neoliberal rumo a um caminho próprio. Muitos diriam ser isto impossível, mas o que diria hoje alguém que viu a até então pobre China "comunista" dos anos 80 se tornar, hoje, a principal ameaça à hegemonia mundial americana?

Enfim...

Ciro Gomes tem trinta e oito anos de vida pública sem que haja contra ele qualquer denúncia por corrupção. Não aceitou nenhuma das aposentadorias que, por lei, lhe eram devidas por conta dos mandatos que exerceu. Alguém que votaria em Bolsonaro por ser "contra tudo o que é errado", deveria pensar nisso. E acredito que pensaria, não fosse o atentado, que afastou o referido deputado de sua campanha, bem como dos debates e entrevistas (que inconveniente, não, Bolsonaro?).

Ademais, Ciro representa a nostalgia certa, que é a do trabalhismo e do nacional desenvolvimentismo de Vargas. O verdadeiro Brasil que cresce. Sua proposta é fazer governo para o povo brasileiro em detrimento da elite financeira. Por outro lado, Haddad e Bolsonaro já foram procurar o Meireles...

Como não têm nada que possa ser usado para atacar o candidato, atacam sua fúria verbal, enquanto apóiam Bolsonaro porque ele "diz certas verdades" (metralhar petralhas e acabar com o décimo terceiro seriam algumas delas?)

Enfim, meu voto vai para Ciro Gomes, sem sombra de dúvida e até o fim. E os lúcidos ainda terão tempo de fazer como eu: ouvir todos os candidatos, ver se suas condutas batem ao menos com o lado positivo de seus discursos e, finalmente, e com todas as informações à mão, decidir.

Porque por algum tempo de minha vida fui desiludido com política, e anulei e votei em branco. Hoje, vivendo no Estado do Rio de Janeiro, vejo claramente a necessidade de levar o meu voto a sério.

Abraços.

Daniel A Vianna
Enviado por Daniel A Vianna em 29/09/2018
Reeditado em 01/10/2018
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