Uma grande confusão se aproxima
Publicado na revista Afrodite, Caxias do Sul
Uma grande confusão se aproxima
Lendo as notícias do mundo e do Brasil chego à conclusão de que estamos sem saber o que fazer perante os vários conflitos: miséria, violência, drogas, falta de legitimidade dos representantes do povo, degradação ambiental, desemprego causado pela automação crescente, alterações climáticas e mais dezenas de outros problemas.
Creio que o que está acontecendo é gerado pela falta de uma ideologia, majoritariamente aceita, que possibilite uma visão global da sociedade e uma análise interdisciplinar da realidade que nos cerca. Com essa visão, global e crítica, surgiria, com maior facilidade, a possibilidade de se encontrar a melhor solução possível para as questões propostas pelo nosso tempo.
Acredito que, por falta de reflexão competente, as esquerdas vão ressuscitar o marxismo, com seu forte apelo popular e suas soluções estatizantes aparentemente justas e corretas.
No entanto, também acredito que a exaurida caixa de mágicas liberais capitalistas não resolverão os problemas pela extensão, complexidade e intensidade a que chegaram as desigualdades de renda e de educação formal entre regiões e pessoas. O individualismo ganancioso de uma minoria, que detêm os poderes político e econômico, não será suportado por muito mais tempo pela crescente maioria de excluídos das benesses do progresso.
As alternativas terão de ser, necessariamente, voltadas para os problemas sociais, no sentido de que se deverá colocar em primeiro plano a solução dos seus mais graves problemas: emprego, fome, educação de qualidade, saúde, transporte, moradia, segurança pública. Os sistemas econômicos são instrumentos para possibilitar a vida digna das populações, o objetivo maior da história da humanidade e não um instrumento de dominação política.
O liberal capitalismo precisa compreender que não poderá tudo justificar pela ação do mercado – o melhor sinalizador para a sociedade das atividades de produção e consumo –, mas que necessita de correções morais. Não se trata de intervenção, mas garantir a efetiva igualdade de oportunidades de participação e de atendimento das necessidades básicas, para toda a população. O atual modelo de organizar e de fazer funcionar as sociedades democráticas não poderá mais justificar a exclusão da maioria da população dos benefícios do progresso e das decisões políticas.
Não teremos de esperar muito pela confrontação: os conflitos estão ganhando as ruas e os políticos aparvalhados, sem saber o que fazer, apenas simulam preocupação...
Eurico Borba é economista e escritor, foi professor e vice-Reitor da PUC-Rio e presidente do IBGE. Em O Viver Coletivo, reflete sobre política e sociedade.
Fonte: Afrodite