BREVE DEBATE SOBRE A SITUAÇÃO DO SINDICALISMO NO BRASIL: OS MOVIMENTOS SOCIAIS DOS ANOS 2000 E SAÍDA PARA O FUTURO.
*Sineimar Reis
De acordo com Armando Boito percebe-se que a construção de um projeto político entre os principais movimentos sociais do Brasil contemporâneo permanece inacabada. Por diferentes razões, às quais aludimos brevemente. A hipótese que explica o contato entre os movimentos sociais e da esfera governamental em termos de cooptação política, com o problema do processo de colonização mais complexo e movimentos que causaram uma profunda distorção de seus princípios de identidades entre os processos é essencial realocar teoricamente e historicamente, para suas respectivas análises, a maneira como os principais movimentos sociais do Brasil sempre estiveram ligados aos partidos de esquerda que se dirigem ao apoio do povo. Por vezes, vários integrantes de partidos políticos, movimentos sociais, estudantis, além de intelectuais se juntam para discutir os projetos para o País e o futuro da esquerda no país; isso se relaciona com uma onda de debates principalmente em locais públicos, que tem a ideia central é assegurar as pessoas e aos jovens para não se perder para o futuro, sendo assim podendo contar com novos representantes e não deixar cair a principal força classe trabalhadora.
A organização de trabalhadores desempregados imporia duas ordens de problemas para o movimento sindical: primeiramente, esse tipo de trabalhador teria dificuldade em contribuir financeiramente para a manutenção do sindicato e, em segundo lugar, essas organizações teriam dificuldades para definir métodos de luta e uma estratégia reivindicativa eficaz. (BOITO, 2010 p. 325).
Tanto no Brasil quantos em outros países da América, há um ciclo político em que os partidos políticos assumem o governo com o apoio dos movimentos sociais. O desafio é enorme, pois parte da tarefa política está em gerar processos de integração social, após a decomposição social gerada pelas políticas de inspiração neoconservadora.
De acordo com Rodrigues (2002) tem aumentado o desinteresse dos trabalhadores pelo sindicato. Isso se daria porque, diante do risco de diminuição do emprego, os sindicatos tendem a moderar as demandas e, assim, a se mostrarem menos úteis para os empregados. Como outras organizações sociais, os sindicatos não definem sua política em condições de plena liberdade: sofrem pressões e constrangimentos por parte do Estado e dos empregadores com os quais interage. O grau de militância ou de moderação é, pois, resultado dessa interação, e não da mera vontade ou preferência de seus integrantes (Boito, 2010).
Há, portanto, vários aspectos a serem contemplados: o projeto políticoideológico, as formas de ação empregadas, as prioridades do movimento, as alianças que estabelece, a conjuntura na qual intervém, a maneira pela qual essa conjuntura é analisada. As concepções político-ideológicas dos sindicatos fazem com que eles sejam mais próximos ou distantes dos movimentos sociais, priorizem determinadas reivindicações e formas de luta, circunscrevam seu espaço de atuação ao campo propriamente sindical ou o ampliem em direção ao campo político e ao “espaço de movimentos sociais”. Mas essas concepções mudam conforme muda a conjuntura.
Rodrigues acrescenta as conquistas sindicais anteriores diminuem, ironicamente, a necessidade atual dos sindicatos. Acrescentam-se a isso as novas políticas de relações humanas das grandes empresas, mais integrativas e democráticas (RODRIGUES, 2002, p.275).
Nesse contexto histórico, o contato entre a esfera governamental e os movimentos deve ser revisto. Neste trabalho expõe-se que a geração de processos de integração social está inscrita em espaços conflituosos.
Deixando de lado o pressuposto, no mínimo duvidoso, segundo o qual as novas formas de produção e organização do trabalho democratizariam as relações de poder dentro das empresas (Rodrigues, 2002), ou que elas permitiriam uma maior autonomia do trabalhador (Leite, 1994), é preciso reconhecer que as idéias e fatos que levam Rodrigues (2002) e outros autores a concluírem que o sindicalismo estaria em um processo de declínio histórico é um encadeamento lógico de idéias que parece, no seu conjunto, fazer sentido: mudanças tecnológicas e organizacionais que levam ao desemprego que, por sua vez, ocasiona o descrédito na capacidade de o sindicalismo reverter a situação, o que provoca a desfiliação e a desindentificação sindical. Há outros elementos que compõem esse quadro de crise ou de declínio: a burocratização do funcionamento dos sindicatos, a desconfiança dos trabalhadores frente às lideranças sindicais (Labbé; Croisat, 1992) e a politização ou partidarização dos sindicatos (Mouriuax, 2006); mas eles entram de maneira secundária nas explicações gerais sobre a crise ou o declínio do sindicalismo. (BOITO, 2010, p, 325).
O conceito de sindicalismo de movimento social passou a ser questionado a partir da experiência do setor ferroviário francês e britânico entre o final do século XX e a primeira década do século XXI7 . Trata-se de um sindicalismo altamente militante e politizado, que se caracteriza pela mobilização de seus membros, pela preferência por greves por tempo indeterminado, ao invés de jornadas de paralisação; pela realização de greves por motivações políticas e por uma forte oposição ideológica de esquerda aos empregadores e ao governo. Essa tendência surge com a crise do sindicalismo socialdemocrata, contrapondo-se ao caráter politicamente moderado e conciliador do sindicalismo predominante em países como Inglaterra e França, sendo denominada de sindicalismo radical.
Os motivos da crise ou do declínio histórico do sindicalismo, arrolados pela bibliografia que aborda o tema, podem ser classificados em cinco tipos: a) motivos ou causas de ordem econômica, como o desemprego e o crescimento econômico baixo, que são características do modelo capitalista neoliberal, particularmente na Europa e na América Latina; b) motivos ou causas referentes à reorganização dos processos de trabalho e das formas de contratação: introdução de mecanismos flexibilização do aparato produtivo, ampliação da terceirização, trabalho temporário, etc; c) motivos ou causas que versam sobre o funcionamento da organização e do movimento sindical: burocratização dos sindicatos, vinculação com partidos políticos, etc. d) motivos ou causas de ordem ideológica e política: ascensão da ideologia liberal, individualismo crescente, perda da referência socialista e comunista, etc. e) motivos ou causas da ordem da composição da força de trabalho: maior resistência à atuação sindical demonstrada por jovens e mulheres, dois segmentos que tiveram participação bastante ampliada nas últimas décadas, no mercado de trabalho. (BOITO, 2010, p, 326).
Assim, o elo diferencial de "diálogo crítico" ou "crítica frontal" que estabeleceu os movimentos e o governo brasileiro durante os anos 2000 contribui para a orientação de políticas públicas para promover processos de integração social.
Os sindicatos, ainda que mais ativos no governo Dilma, eram apenas uma sombra do seu antigo passado. Os pobres seguiram sendo beneficiários passivos do governo petista, que nunca se dispôs a educa-los ou organizá-los, quanto muito mobilizá-los em torno de uma força coletiva. Movimentos sociais – dos sem-terra e dos sem-teto – foram mantidos distantes do governo. Intelectuais acabaram sendo marginalizados. Mas não houve apenas uma ausência de potencialização política das energias vindas dos subalternos. Também não existiu uma verdadeira política de redistribuição de riqueza ou de renda: a infame estrutura tributária regressiva legada de Fernando Henrique Cardoso para Lula, que penalizava os pobres e deixava os ricos intocados, foi mantida. Houve, de fato, alguma distribuição que acabou melhorando consideravelmente as condições de vida dos mais miseráveis, mas isso foi feito de forma ainda individualizada. Com o ‘Bolsa Família’ tomando forma de recompensa para mães de filhos em idade escolar, isso era um resultado esperado. Aumentos no salário mínimo significaram também um aumento no número de trabalhadores com ‘carteira assinada’, o que lhes garantiria acesso aos direitos formais do emprego; mas não houve aumento, e pode ter havido até mesmo uma queda, na sindicalização. Acima de tudo, com a chegada do ‘crédito consignado’ – os empréstimos bancários com juros altos deduzidos diretamente dos salários – o consumo privado cresceu sem amarras e às custas dos gastos com serviços públicos, cujas melhorias teriam sido uma forma mais cara de estimular a economia. A compra de eletrônicos, bens de consumo e veículos foram estimuladas (a compra de automóveis recebeu incentivos fiscais), enquanto o suprimento de água, pavimentação, ônibus eficientes, saneamento básico aceitável, escolas decentes e hospitais públicos foram negligenciados. Os bens coletivos não tinham prioridade nem ideológica e nem prática. Logo, junto com a tão necessária melhoria nas condições de vida doméstica, o consumismo em sua forma mais deteriorada se espalhou nas camadas populares através de uma hierarquia social em que a classe média se deslumbrava, ainda que por padrões internacionais, com revistas e shopping centers. (PERRY, 2016, p. 5).
De fato, tais CUT talvez a análise mais complexa porque foi puxado por exigências do governo e as necessidades dos movimentos para afastar tal crise, o que constitui um caso de referência essencial.
Nas teses sobre o declínio do sindicalismo, também há outro pilar mal colocado: a tese de que as classes trabalhadoras são hoje mais fragmentadas e heterogêneas do que em outras fases do capitalismo. Em primeiro lugar, podemos nos perguntar se essa tese não subestimaria a heterogeneidade das classes trabalhadoras ao longo de toda a história do capitalismo. O historiador Eric Hobsbawm insiste na ideia de que, na passagem do século XIX para o século XX, foi o movimento operário que criou a unidade da classe operária, pois, do ponto de vista socioeconômico, essa classe era por demais heterogênea e fragmentada (Hobsbawm, 2009).
Boito afirma que a tese da fragmentação como causa fundamental da crise do sindicalismo ignora, também, que há, no capitalismo contemporâneo, um processo contrário à fragmentação que é o de homogeneização entre os trabalhadores de classe média e os operários; entre os trabalhadores de diferentes nacionalidades; entre os trabalhadores e as trabalhadoras.
Não pode ser satisfatoriamente compreendido pelo termo sindicalismo de movimento social”, que muitos tomam como sinônimo de sindicalismo de comunidade, sindicalismo de justiça social ou cidadão . Segundo os autores, isso se deve à sua dependência excessiva das teorias dos novos movimentos sociais, que minimizam tanto a importância da relação capital-trabalho quanto do sindicalismo, e reduzem o papel das classes sociais como fator explicativo da ação coletiva. Armando Boito e Perry Anderson consideram importante resgatar a dimensão política do sindicalismo, analisando-o à luz de sua relação com o Estado, assim como das oportunidades políticas que incentivam ou reprimem os ciclos de protesto9 . Procuram trazer o Estado para dentro da análise, considerando o impacto da prática sindical numa variedade de contextos institucionais.
Os sindicatos são instituições ambíguas: são componentes do capitalismo ao mesmo tempo em que atuam para impor limites a seu poder; dividem-se entre a luta contra o capital e a negociação (Anderson, 1980).
A oposição e a formação estão gravadas em sua essência, sendo que ambas as práticas são sustentadas em nome dos interesses dos trabalhadores. Para os autores, o movimento sindical é uma formação social fluida e multidimensional que é produzida e reproduzida relacionalmente, num contínuo entre ação direta e poder institucionalizado, entre democracia e burocracia.
Boito descreve que vivemos, pelo menos desde 2004, uma conjuntura de recuperação da atividade sindical no Brasil. Na base, a ação grevista mantém-se num nível razoavelmente alto, e a grande maioria das greves tem permitido ganhos reais de salários; na cúpula do movimento, a disputa política acirrou-se com o surgimento de cinco novas centrais sindicais. Essa recuperação da luta sindical pode ser tomada como um indicador da vitalidade do sindicalismo como movimento social.
Vale ressaltar nesta resenha, que, a atividade grevista como uma porta de entrada para analisar a situação do movimento sindical brasileiro na década de 2000. A nossa escolha se justifica por duas razões. A primeira é uma razão de ordem prática: os dados mais sistemáticos e gerais que temos sobre o sindicalismo brasileiro na década de 2000 são os dados sobre greves, coletados pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, o Dieese. A segunda é uma razão sociológica: a greve não é a única ação importante e pertinente do movimento sindical, mas é, seguramente, uma de suas ações mais contundentes e de maior visibilidade política e social. Façamos, a esse respeito, alguns esclarecimentos.
Entre 2004 e 2007, cinco novas centrais sindicais foram criadas: Conlutas, criada em 2004 como dissidência da Central única dos Trabalhadores (CUT) e fortemente vinculada ao Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU); Intersindical, de 2006, também dissidência da CUT e com forte presença do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e do Partido Comunista Brasileiro (PCB); Nova Central Sindical (NCST), formalizada em 2005 por um grupo de sindicatos, federações e confederações que se consideraram isolados durante o Fórum Nacional do Trabalho; Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), formada por antigas correntes da CUT, uma ligada ao Partido Comunista do Brasil (PC do B) e outra ao Partido Socialista Brasileiro (PSB); e, por fim, União Geral dos Trabalhadores (UGT), criada em 2007 como resultado da fusão da Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), da Social Democracia Sindical (SDS) e da Central Autônoma dos Trabalhadores (CAT). É certo que essa onda de novas centrais sindicais não pode ser vista, em sua totalidade, como expressão de pujança do sindicalismo na década de 2000. A NCST e a UGT representam, fundamentalmente, a parte mais conservadora do sindicalismo brasileiro – conhecida, tradicionalmente, pela designação de “pelegos”. Contudo, a criação da Conlutas, da Intersindical e da CTB expressa a luta entre correntes socialistas e democráticas pela hegemonia no movimento sindical brasileiro. (BOITO, 2010. P. 328).
É claro que, atualmente, a prioridade da chegada ao socialismo e o caráter de classe de alguns dos movimentos e nucleações sindicais foram relegados. No entanto, o propósito da transformação política não. Neste ponto, ele começa a ter relevância na ligação com a esfera governamental e a próxima tensão se manifesta com a impossibilidade de programar as mudanças substantivas do Estado para realizar o mesmo. Nesse sentido, pode-se afirmar que os contatos entre os movimentos sociais e o Estado não resultaram em mera cooptação política, nem na perda dos princípios de identidade que viveram e vivem os movimentos.
A história do sindicalismo mostra que a atividade grevista não apresenta uma trajetória linear. As greves ocorrem em ciclos, com fases ascendentes, de estabilização e de declínio. Esses ciclos apresentam perfis característicos e fatores determinantes variados. O perfil das greves de cada ciclo e os fatores que as determinam estão, na maioria das vezes, relacionados. Um ciclo poderá ter a greve de massa como característica, outro, a greve localizada; um poderá atingir números excepcionalmente elevados na atividade grevista, outro, manter-se num padrão mais modesto; aquele poderá representar uma ação política contra um regime ditatorial, esse, uma resposta à corrosão dos salários pela alta taxa de inflação na economia.
Durante a década de 2000, foram outras as condições econômicas e políticas, assim será também outro o perfil do ciclo de greves no futuro.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDERSON, Perry. Problemas e limites do sindicato. São Paulo: Revista Oitenta, L&PM, vol. 3, 1980.
BOITO, Armando e MARCELINO, Paula. O sindicalismo deixou a crise para trás? Um novo ciclo de greves na década de 2000. São Paulo: Caderno CRH, vol. 23, núm. 59, 2010.
BOITO JR., A. Classe média e sindicalismo. In: ______. Estado, política e classes sociais. São Paulo: Unesp, 2007. p.223-245.
HOBSBAWM, E. A era dos impérios, 1875-1914. 13.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2009. 600p.
RODRIGUES, L. M. Destino do sindicalismo. São Paulo: Edusp/Fapesp, 2002. 335p.