Como iremos sobreviver?
COMO IREMOS SOBREVIVER?
Miguel Carqueija
(Nota: este artigo foi escrito para a "Tribuna da Imprensa" de Hélio Fernandes, que saía nas bancas do Rio de Janeiro; dele só localizei uma xerox muito escurecida e sem data, mas foi produzido durante o governo FHC, portanto na década de 90 ou início da década de 00; creio que não perdeu sua atualidade)
(Encontrado o original em 29/7/2019: o artigo saiu na edição de 3 e 4 de agosto - sábado e domingo - de 1996)
Há muitos anos li um curioso e desconhecido livrinho de ficção científica, “The rebbelers”, assinado por Jane Roberts, que a Editora La Selva publicara em 1965, sob o absurdo título “As estrelas são nossas” — mais tarde republicado pela Bruguera com outro título que não tinha nada a ver: “Rebelião no Cosmo”. O mundo futuro, imaginado naquele romance, era aterrorizador: “No século XX, uma calma e típica cidadezinha norte-americana. No século XXIII uma “Contrópolis”, selvagemente superpopulada, onde milhões de pessoas famintas, semiloucas, cambaleavam pelas ruas numa busca inútil de alimentos, descanso ou morte. Sobre esta cena louca, semelhante a um carnaval macabro, os auto-falantes gritavam seus comandos de trabalho, até que a noite trazia o silêncio e os “limpadores de ruas” vinham para levar os corpos dos agonizantes.”
Estará o Brasil se transformando numa grande Contrópolis?
Algo já parecido com aquela descrição tétrica podemos vizualizar nos fins de semana, se tivermos a temeridade de caminhar pelas ruas do Centro do Rio. Uma legião de pessoas já mora e se multiplica por aquelas ruas, com seus trastes, uma legião de miseráveis. Mas, tirando fora as crianças, evidentemente nascidas na miséria, podemos perguntar: e onde moravam aquelas pessoas antes de serem despejadas nas ruas deste “admirável mundo novo”?
O Brasil sempre sofreu com maus governos. Nas últimas décadas, porém, tudo o que há de pior vem se acumulando e o quadro se deteriora a cada ano que passa. Hoje, vivemos na catástrofe. A destruição dos salários, a desvalorização do trabalho e do trabalhador, o desemprego e o subemprego, a total degradação dos serviços públicos (educação, saúde, segurança etc), a dívida interna e externa, a extrema corrupção do sistema, o achincalhe sobre os idosos (inclusive com a desmoralização do setor previdenciário), o desaparecimento do patriotismo e dos valores éticos ou verticais, a explosiva situação no campo, o caos habitacional, a queda da produtividade e da própria criação intelectual, a mortalidade infantil (agravada pelo flagelo do aborto) que o Estado liberal favorece com sua política de fome, o imenso desencanto do povo com os políticos e sua desesperança de um futuro melhor, a inegável perda de confiança nos governantes — eis o Brasil atual: onde a moral, o nacionalismo, a cultura ou brio próprio de um povo soberano entram em eclipse.
Já caminhávamos para isso com a transferênccia da capital para a cidade absurda. O que restou? A fome, o crime organizado, a corrupção, a medicina inacessível, e através principalmente das elitistas novelas de televisão, o circo para um povo anestesiado. A classe média foi destruída. O cidadão honesto e trabalhador empurrado para a divida, o calote, a inadimplência, pois seus filhos precisam comer e a comida tem que ser comprada. Até suicídios são gerados em tal contexto.
Como sobreviveremos? Os que moram em aluguel estarão condenados, a prazo curto ou longo, a morar na rua, aumentando a legião dos sem-teto? Ou iremos amontoar várias famílias em cada casa, à moda da extinta União Soviética?
O capitalismo é eficiente na área econômica e também na social. Pensamos nos verdadeiros países capitalistas, como o Canadá. O que está estragando o mundo é o liberalismo, condenado a mais de um século pela Igreja Católica. Um sistema que é sinônimo de profundo egoísmo, desprezo com os menos favorecidos, insensibilidade perante a dor dos humildes. Que legiões morram de fome, doença e vida ao relento; que as crianças já não tenham defesa contra os maus costumes; que a agricultura seja sucateada; que a própria honra nacional caia na penumbra.
Nada disso importa para o governo Fernando Henrique Cardoso,desde que o Plano Real seja mantido. Mas e nós outros? Como iremos fazer as coisas mais elementares da vida: casar, gerar filhos, sustentá-los e educá-los; comprar ou alugar imóveis; pagar a conta de luz; comprar remédios de sobrevivência para nossos pais; honrar nossos compromissos; ter feijão e arroz em casa? Meu Deus! E que dizer de nossos sonhos, nossos ideais? Publicar aquele livro, comprar micro-impressora, viajar para o exterior, ou mesmo para outro estado, auxiliar em obras de caridade... quando o povo brasileiro em peso já precisa de caridade. Exceto o grupo privilegiado, lá em cima.
Que Deus nos ajude!
COMO IREMOS SOBREVIVER?
Miguel Carqueija
(Nota: este artigo foi escrito para a "Tribuna da Imprensa" de Hélio Fernandes, que saía nas bancas do Rio de Janeiro; dele só localizei uma xerox muito escurecida e sem data, mas foi produzido durante o governo FHC, portanto na década de 90 ou início da década de 00; creio que não perdeu sua atualidade)
(Encontrado o original em 29/7/2019: o artigo saiu na edição de 3 e 4 de agosto - sábado e domingo - de 1996)
Há muitos anos li um curioso e desconhecido livrinho de ficção científica, “The rebbelers”, assinado por Jane Roberts, que a Editora La Selva publicara em 1965, sob o absurdo título “As estrelas são nossas” — mais tarde republicado pela Bruguera com outro título que não tinha nada a ver: “Rebelião no Cosmo”. O mundo futuro, imaginado naquele romance, era aterrorizador: “No século XX, uma calma e típica cidadezinha norte-americana. No século XXIII uma “Contrópolis”, selvagemente superpopulada, onde milhões de pessoas famintas, semiloucas, cambaleavam pelas ruas numa busca inútil de alimentos, descanso ou morte. Sobre esta cena louca, semelhante a um carnaval macabro, os auto-falantes gritavam seus comandos de trabalho, até que a noite trazia o silêncio e os “limpadores de ruas” vinham para levar os corpos dos agonizantes.”
Estará o Brasil se transformando numa grande Contrópolis?
Algo já parecido com aquela descrição tétrica podemos vizualizar nos fins de semana, se tivermos a temeridade de caminhar pelas ruas do Centro do Rio. Uma legião de pessoas já mora e se multiplica por aquelas ruas, com seus trastes, uma legião de miseráveis. Mas, tirando fora as crianças, evidentemente nascidas na miséria, podemos perguntar: e onde moravam aquelas pessoas antes de serem despejadas nas ruas deste “admirável mundo novo”?
O Brasil sempre sofreu com maus governos. Nas últimas décadas, porém, tudo o que há de pior vem se acumulando e o quadro se deteriora a cada ano que passa. Hoje, vivemos na catástrofe. A destruição dos salários, a desvalorização do trabalho e do trabalhador, o desemprego e o subemprego, a total degradação dos serviços públicos (educação, saúde, segurança etc), a dívida interna e externa, a extrema corrupção do sistema, o achincalhe sobre os idosos (inclusive com a desmoralização do setor previdenciário), o desaparecimento do patriotismo e dos valores éticos ou verticais, a explosiva situação no campo, o caos habitacional, a queda da produtividade e da própria criação intelectual, a mortalidade infantil (agravada pelo flagelo do aborto) que o Estado liberal favorece com sua política de fome, o imenso desencanto do povo com os políticos e sua desesperança de um futuro melhor, a inegável perda de confiança nos governantes — eis o Brasil atual: onde a moral, o nacionalismo, a cultura ou brio próprio de um povo soberano entram em eclipse.
Já caminhávamos para isso com a transferênccia da capital para a cidade absurda. O que restou? A fome, o crime organizado, a corrupção, a medicina inacessível, e através principalmente das elitistas novelas de televisão, o circo para um povo anestesiado. A classe média foi destruída. O cidadão honesto e trabalhador empurrado para a divida, o calote, a inadimplência, pois seus filhos precisam comer e a comida tem que ser comprada. Até suicídios são gerados em tal contexto.
Como sobreviveremos? Os que moram em aluguel estarão condenados, a prazo curto ou longo, a morar na rua, aumentando a legião dos sem-teto? Ou iremos amontoar várias famílias em cada casa, à moda da extinta União Soviética?
O capitalismo é eficiente na área econômica e também na social. Pensamos nos verdadeiros países capitalistas, como o Canadá. O que está estragando o mundo é o liberalismo, condenado a mais de um século pela Igreja Católica. Um sistema que é sinônimo de profundo egoísmo, desprezo com os menos favorecidos, insensibilidade perante a dor dos humildes. Que legiões morram de fome, doença e vida ao relento; que as crianças já não tenham defesa contra os maus costumes; que a agricultura seja sucateada; que a própria honra nacional caia na penumbra.
Nada disso importa para o governo Fernando Henrique Cardoso,desde que o Plano Real seja mantido. Mas e nós outros? Como iremos fazer as coisas mais elementares da vida: casar, gerar filhos, sustentá-los e educá-los; comprar ou alugar imóveis; pagar a conta de luz; comprar remédios de sobrevivência para nossos pais; honrar nossos compromissos; ter feijão e arroz em casa? Meu Deus! E que dizer de nossos sonhos, nossos ideais? Publicar aquele livro, comprar micro-impressora, viajar para o exterior, ou mesmo para outro estado, auxiliar em obras de caridade... quando o povo brasileiro em peso já precisa de caridade. Exceto o grupo privilegiado, lá em cima.
Que Deus nos ajude!