O marxista messiânico
É tragicômico ver alguém citar “O Manifesto Comunista” enquanto fala da inexorável vinda da Revolução Socialista. É cômico notar nesta atitude o mesmo ato de fé de um cristão citando a Bíblia, enquanto fala na igualmente inexorável volta do Messias. Daí a alcunha carinhosa de marxistas messiânicos. Note que não estou fazendo referência a pessoas que se dizem, ao mesmo tempo, cristãos e adeptos da revolução socialista. Estes levam o ridículo ao nível de um pastelão mal feito. Não tem graça. Me refiro àqueles que justamente consideram os cristãos seus opostos, sem perceber o quanto são semelhantes. O lado trágico é perceber em alguns, nos mais sérios, o desejo de matar ou morrer.
Ninguém pode me chamar de vendido, afinal eu não encontro quem me compre! Porém podem, precipitadamente, querer me lançar adjetivos carinhosos (democrata, esclarecido), ofensivos (coxinha, reacionário) ou impublicáveis (correspondente do Manhattan Connection). Deixem antes que eu esclareça minha visão de mundo, para depois me lançarem os adjetivos que considerem mais adequados. Desde que não ofendam minha mãe nem me associem ao Manhattan Connection!
Me considero um social-democrata ateu. O capitalismo é um regime de exploração, mas não serão revoluções sangrentas, que culminam em regimes totalitários, o caminho para o Comunismo. Se estas declarações soam contraditórias, e de certa forma o são, é porque tenho a humildade de dizer: é um problema para o qual não tenho solução. Provisoriamente, devemos tentar amenizar o capitalismo, por uma questão de sobrevivência, lutar para que cada vez mais pessoas desenvolvam senso crítico, e buscar descobrir meios que tornem viáveis a passagem do regime em que vivemos para um que seja melhor.
Karl Marx foi um grande Cientista. Construiu ideias, no âmbito das Ciências Políticas, Econômicas e Sociais, as quais o colocam no rol dos grandes pensadores da humanidade. Porém não era um Profeta. Suas ideias foram construídas com base no que se sabia em meados do séc. XIX. Antes do Fordismo Taylorismo, da Revolução Russa, das grandes guerras mundiais, da televisão, das armas atômicas, da guerra fria, da globalização, da Internet, das redes sociais etc. A base da crítica que faço aos marxistas messiânicos é a de esquecerem algo simples: o Manifesto Comunista foi escrito há mais de 150 anos.
Não digo que suas ideias devam ser abandonadas, como não diria que o advento da Relatividade jogou no lixo o trabalho de Newton. Prédios são construídos usando apenas a Mecânica Clássica. Digo, no melhor espírito da dialética, que suas ideias devem ser superadas, que devemos dar o passo seguinte. Certamente, se estivesse vivo, ele tentaria fazê-lo. A obra de Marx é um começo, não o fim. É uma obra científica, não a Bíblia. É um conjunto de Teorias, não de Profecias. Como podem alguns marxistas criticarem os religiosos e agirem de forma tão similar?
A diferença entre religião e ciência é a de que, enquanto uma é questão de fé, a outra é uma questão de falta de fé. Enquanto uma é baseada em dogmas, revelação, verdades eternas que nunca devem ser contestadas, a outra é baseada em teorias, construção, verdades transitórias que sempre devem ser contestadas. É o cúmulo da contradição quando alguém, para abraçar o socialismo científico, rompe os laços da religião, mas mantém uma postura dogmática.
Seria engraçado, se não fosse trágico. A postura dogmática de ambos os grupos, religiosos e marxistas, matando quando podem aqueles que deles discordem, gerou mais mortes que me atrevo a contar. Os religiosos, pelo menos, estão sendo coerentes…