NAS MÃOS DE DEUS
                   
Está virando moda prefeitos recém empossados entregarem as chaves de suas cidades a Deus. Evidentemente são pilhérias que esses “administradores” públicos quiseram fazer com a situação caótica em que está a maioria das prefeituras do país, especialmente aquelas que não têm economia própria e dependem de repasses estaduais e federais. Se são pilhérias, convenhamos, as piadas são de muito mau gosto. Deus merece respeito e não deve ser associado a indivíduos incompetentes e irresponsáveis que se meteram em aventuras eleitoreiras, com certeza com o olho grande nas benesses que o cargo de prefeito proporciona. E depois se viram a braços com uma situação financeira catastrófica, que ao invés de lhes trazer os benefícios pessoais que esperavam vai é lhes dar muita dor de cabeça.
É verdade que a crise econômica pela qual passa o nosso país deve ter diminuído sensivelmente as receitas desses municípios. E para aquelas prefeituras, cujas despesas, em sua maior parte, são fixas, torna-se ainda mais aflitiva a situação, pois quando se trata de reduzi-las, sempre se mexe com um setor muito poderoso, que são os sindicatos e principalmente os “amigos”, que geralmente constituem o contingente de funcionários que são hospedados nas máquinas públicas, como paga pelo serviço que prestaram ao prefeito na campanha pela eleição.
Um dos grandes problemas do Brasil é o sistema federativo, que facilita a criação de municípios, sem exigir que eles tenham economias capazes de garantir seus sustentos. Daí sucede que grande parte deles, principalmente no norte e no nordeste do país, vive dos repasses dos governos estaduais e federal. De acordo com o IBGE, nos municípios pequenos, com menos de 5.000 habitantes o FPM (Fundo de Participação dos Municípios)  é responsável por quase 60% das suas receitas. Em alguns casos ele chega praticamente a 100%.  E no grosso desses casos toda essa receita é usada para pagar funcionários.
Tive a oportunidade de fazer uma pós-graduação com o saudoso professor Geraldo Ataliba, um dos mais ferrenhos municipalistas do mundo jurídico brasileiro. Ele era defensor incansável de uma reforma tributária que destinasse uma fatia maior dos tributos arrecadados no país aos municípios, porque, segundo ele, é nele que as pessoas vivem, e é aí que suas necessidades devem ser atendidas, não nos estados ou na União. Assim, maior autonomia dos municípios para criarem receitas tributárias e uma fatia maior do bolo tributário nacional seriam muito bem vindas.
Mas isso deveria ser precedido por uma mudança de critérios nas regras de municipalização. Municípios sem economias próprias não poderiam ser criados, independente da quantidade de pessoas que moram neles. Acabaria assim a mamata de muitos políticos que só criam municípios para receber os repasses e empregar parentes e amigos para formar seus currais eleitorais.
Com isso ninguém precisaria entregar sua prefeitura nas mãos de Deus. Afinal, o Criador deve ter muito mais importante para fazer do que ficar socorrendo políticos irresponsáveis e incompetentes.