Política, eleições e accountability
Finalizadas as eleições para Prefeito e para Vereador, creio ser importante destacar algumas temáticas que perpassam a gerência de instituições públicas que sobrevivem com o dinheiro proveniente da população. As Prefeituras e as Câmaras Legislativas são desaguadouras de dinheiro e, não por acaso, faz-se necessário não somente o cuidado, mas também a urgente criação de mecanismos de accountability visando a transparência e o controle com os gastos e/ou investimentos públicos. Nesse caminho, espinhoso para muitos, especialmente em cidades de médio e pequeno porte, é bom a lembrança de algumas questões:
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Em primeiro lugar, a despeito de já ser velho o discurso, o processo de accountability ainda é deficiente em muitas das instituições brasileiras. O fortalecimento das instituições - após a democratização confirmada na carta de 1988 - aparentemente não foi o bastante para amadurecer os mecanismos de responsabilização em meio aos nossos agentes públicos. A ideia é essa: não é possível um governo democrático e sério sem a responsabilização (accountability) dos governantes. A concepção é óbvia: Prefeitos e Secretários, no poder executivo, e Vereadores e Assessores, no poder legislativo, não podem fazer o que querem e desejam sem o crivo da responsabilização. Não é possível mais esperar que os atores políticos resolvam em um sonho a prestação de contas. Eles não fazem mais do que a obrigação; pois a responsabilidade cobrada é a garantia do certificado para o cidadão de que as coisas podem ir bem, que elas devem ir bem, e que tanto governante como governado não precisam se acusar por corrupção, mal uso do dinheiro público ou prevaricações e desvios indevidos de toda ordem.
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Em segundo lugar, ressalta-se a cobrança da responsabilidade proveniente dos servidores públicos. Não faz mais do que a obrigação o agente público - concursado ou não - trabalhar as horas diárias que são pagas pela população. Não cumpre ao servidor público abrir mão do seu poder discricionário, tampouco de seus direitos como concursado e apto para o cargo que ocupa. Mas, de qualquer forma, a assiduidade, a pontualidade, a discrição e a urbanidade são princípios que fazem parte dos deveres deste ator. E, detalhe importante: deveres que atingem também aqueles que ocupam os famigerados “cargos de confiança”. Ambos, na verdade, possuem a dura tarefa de fazer um projeto de governo funcionar e, processos de responsabilização, não podem conviver sem tais princípios. As regras devem ser claras e o pessoal deve estar longe ou mesmo inexistir nos mecanismos impessoais de responsabilidade. Longe disso, restam o nepotismo, o patrimonialismo, a promiscuidade com o dinheiro público, as contratações indevidas, a corrupção desenfreada, os acordos, as “comissões” e a má utilização do dinheiro público. Todo cuidado é pouco. Poucos também são os recursos e, não somente por isso, mas justamente por isso, seria de bom tom à cultura política brasileira deixar os parentes sempre de fora.
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Em terceiro e último lugar, no que tange ao gerenciamento da coisa pública, é de suma importância a preparação dos agentes. Tanto a utilização de recursos públicos como a prestação de contas devem ser atividades cotidianas e, estas, demandam coragem, pois não é fácil cortar privilégios, mudar rotinas, contrapor culturas familiares e aplicar processos impessoais de gerenciamento. Hoje, vemos, inclusive, uma forte penalização de algumas autoridades que seguiram em frente na privatização do erário público. Todavia, não é raro a co-culpabilidade do Estado com sua larga e grande burocracia que impede um governo ágil e potente em determinações que deem resultados a curto prazo. Por isso, é importante a responsabilização do próprio Estado no sentido de fortalecer os mecanismos de controle de suas atividades e para uma prestação de serviço rápida, eficiente e transparente. O controle social também exerce importante papel na distribuição dos mesmos recursos, porque impedem vantagens a certas categorias, classes e grupos, obrigando o governante a optar por uma ética que atenda os que realmente precisam da ação pública. Uma ética que, a longo prazo, possa ser incorporada à cultura política e incutir - ou se tornar natural - na cabeça do agente de que lidar com o público é lidar com o futuro, com recursos que demandam ações infinitas e com cidadãos que, nos dias atuais e vindouros, merecem muito mais do que o simples respeito.