“Foie gras interdit”

Nacib Hetti

Depois de 30 anos de investimentos equivocados, finalmente a lagoa da Pampulha está limpa, com águas cristalinas, convidando para o banho e para o agradável velejar. Os hospitais municipais de Belo Horizonte estão uma beleza, atendendo as consultas com presteza e na hora agendada. As cirurgias são marcadas e cumpridas conforme as necessidades dos pacientes.

As escolas públicas municipais estão um brinco. Os alunos recebem a melhor qualidade de ensino, com aulas de educação ambiental; e suas merendas são da melhor qualidade. As professoras estão alegres e satisfeitas com o salário que recebem.

As ruas de Belo Horizonte estão limpas, sem buracos, facilitando a vida dos motoristas e dos pedestres, que andam em passeios nivelados, sem riscos de torcer os pés. O trânsito flui na qualidade de uma cidade escandinava, com sinalizações claras e com direções lógicas e bem-definidas. Os camelôs, mendigos e moradores de rua, que chegaram a 2.500, praticamente não mais existem.

Os parques e jardins da cidade estão no padrão vienense, com seus gramados bem conservados, criando um ambiente agradável para os moradores. As empreiteiras que efetuam obras nas ruas da metrópole fazem um trabalho perfeito, não deixando qualquer entulho ou buraco ao fim de suas intervenções.

O transporte coletivo é de Primeiro Mundo, com um metrô que percorre toda a cidade, permitindo ao trabalhador se deslocar com facilidade, gastando apenas 30 minutos de casa para o trabalho. A segurança pública deixou de ser um problema. Podemos andar pelo centro da cidade sem nos preocupar com roubos e assaltos. A cidade acabou com a pichação em seus muros e prédios, com a “maravilhosa” ideia de aprovação da lei que proíbe a venda de tintas para menores.

Sem preocupações e sem mais nada para fazer, nossos brilhantes vereadores resolveram voltar seus piedosos olhares para os coitados dos gansos que fornecem seus gordos fígados para o patê da classe média. Aprovaram o PL 1637 em primeiro turno, proibindo a venda de foie gras na cidade, alegando o sofrimento das aves com a alimentação forçada para produzir um bom fígado. Pelo consumo desenfreado da iguaria em BH, os vereadores devem estar salvando uns cinco ou seis gansos por ano.

Os perus estão pedindo isonomia. São criados sob estresse, sofrem mutações genéticas, recebem alimentação forçada e, 20 semanas após nascidos, são sacrificados, com a obrigação de fornecer um gordo peito de três quilos para engordar uma bela ceia para a classe média. Tal qual o ganso, o peru pensou em exigir um nome também sofisticado para sua carne. Acha que o nome em francês é um pouco feminino (la dinde), prefere ser chamado de “turkey”, norte-americanizado, mas bem melhor. Se for complicado para a sapiência dos parlamentares, podem chamar de peru mesmo. Em tempo: não gosto de foie gras; meu ganso está salvo.