Editores alemães anunciam que vão relançar o Mein Kampf, (Minha Luta) livro escrito por Adolf Hitler nos idos de 1929, quando ele esteve curtindo uma temporada na prisão por ter liderado o chamado Putsch da Cervejaria, em Munique. Esse golpe visava a destituição do governo da Baviera e sua substituição pelo modelo nazista, o qual, mais tarde, seria estendido á Alemanha toda. Confesso que sou fissurado em história e o fenômeno nazista sempre me impressionou pela forma como ele conquistou o povo alemão e pela influência que exerceu no espirito de uma gente tão culta e preparada. Li, nos anos setenta, os quatro volumes da obra escrita pelo jornalista-historiador William Shirer, que faz uma crônica completa da ascensão e queda do Terceiro Reich, historiando toda a ascensão de Hitler ao poder, e depois, como ele consolidou o seu governo e promoveu o maior de todos os conflitos que a humanidade já enfrentou. É uma saga terrível, só comparável aos tempos da Roma dos Césares, em que a intriga, a conspiração, o assassinato e todo tipo de maldade era válida para perder o inimigo e conquistar o poder.
A leitura da obra de Shirer me levou ao Mein Kampf. Nos anos setenta era difícil obter um exemplar. Depois de muita procura consegui encontrar um em um sebo na Praça da Sé. Paguei uma nota por ele, na esperança de ler um livro que me levasse a entender a razão do porque, em pleno século vinte, um povo tão educado, culto e inteligente como o alemão conseguira ser seduzido por uma ideologia de ódio como aquela.
Confesso que fiquei decepcionado e com a nítida impressão de ter jogado o meu dinheiro fora comprando aquele livro. Não consegui chegar sequer á metade dele. Era uma leitura tão maçante, chata, difícil e tediosa que nem como livro de história servia. Além de distorcer os fatos, o livro todo era tão mal escrito, com opiniões e teses tão desordenadas, que custava crer que o povo alemão tivesse adotado aquilo como uma espécie de cartilha política e sociológica e a tivesse seguido com o ardor que uma Testemunha de Jeová segue a Bíblia.
Shirer diz que os originais que Hitler mandou para a editora eram piores ainda. Assemelhavam-se a uma redação feita por um vestibulando mal preparado. Alinhava um monte de ideias sem concatenação nem sentido. Antes de ser lançado, o editor, Max Amann, teve que pagar a um revisor para colocar um pouco de ordem na confusa tempestade de ideias que o futuro ditador alemão tinha escrito.
De fato, as ideias de Hitler estavam longe de ser originais. Refletia apenas o ambiente político e social vivido pelo mundo nas primeiras décadas do século XX. A Alemanha estava saindo de duas guerras, vividas num período de menos de cinquenta anos. Uma, a guerra pela sua unificação, que terminou com o famoso Cerco de Paris e a derrota final dos franceses em 1871. Nessa guerra os franceses foram obrigados a assinar o famoso Tratado de Versailhes e entregar aos alemães uma parte do seu território (a Alsácia-Lorena). Depois a Primeira Guerra Mundial, na qual a Alemanha sairia derrotada depois de quatro anos de lutas (1918). Foram duas guerras que nunca terminaram pois levou a uma terceira, que foi a Segunda Guerra Mundial (1939).
O ódio racial e a amargura pela derrota sofrida pela Alemanha na Primeira Guerra Mundial envenenaram a alma alemã naqueles cruciais anos. O ódio contra os judeus já existia há mais de cinco séculos, incubados no espirito do povo alemão. O próprio Martinho Lutero era um virulento antissemita. Desde a época da Reforma Protestante o antissemitismo já vinha sendo incentivado por importantes escritores e filósofos alemães, chegando ao auge em fins do século XIX com as obras de Nietszche, Gobineau e Chamberlain. Hitler, em sua juventude boêmia e miserável, vivida na Viena do início do século, bebeu bastante desse veneno, ao ver os prósperos judeus em suas lojas e joalherias, como donos de bancos e fábricas, e o povo alemão, segundo acreditava, vivendo das migalhas que caiam da mesa desses “abutres de capote preto”, como ele os chamava.
A deterioração econômica e política que tomou conta da Europa nas primeiras décadas do século XX fizeram o resto. Hitler não precisou de muito esforço para convencer os alemães de que era preciso fazer uma limpeza racial na Europa, eliminando não só os judeus, mas também ciganos, eslavos e outros inimigos da sua ideologia, como maçons e Testemunhas de Jeová, por exemplo.
Mais de setenta anos se passaram depois que Hitler morreu e seu odioso partido foi proscrito. Mas ideologias não morrem. Há muita gente na Alemanha e outros países que idolatra esse maluco. A recente guerra sérvia, que fracionou a antiga Iugoslávia é uma prova disso. Foi muito mais um conflito racial do que político. A ideia nacional-socialista ainda seduz os radicais alemães, principalmente os jovens que chegam a idade de trabalhar e não encontram facilmente um lugar no mercado de trabalho. Então eles botam a culpa nos “estrangeiros” que entram no país e ocupam as vagas, trabalhando por salários menores. Não existe forma mais segura de começar a odiar alguém do que pela inveja ou pela sensação de que esse alguém está nos tirando alguma coisa.
Esse livro estava proibido na Alemanha desde o final da Segunda Guerra. O relançamento pode ser bom e pode ser ruim. Pode ser bom porque a maioria do povo alemão, tomando conhecimento dessa doutrina em sua própria fonte pode, de uma vez por todas, se livrar desse vírus que ainda infesta boa parte da sua população. Mas pode ser ruim porque isso acontece justamente no momento em que a Europa está sendo invadida por uma horda de refugiados do Oriente Médio e África. E a Alemanha, o mais próspero país da Europa é o destino buscado pela maioria deles. É coincidência demais para ser ignorada.
Hitler ainda está vivo, ao que parece. O fogo só queimou a sua carne. O seu espírito ainda vaga pelas ruas da Alemanha. Nietszche, o filósofo mais influente entre os nazistas, dizia que estamos condenados a viver o mesmo momento infinitas vezes. Ao que parece ele também não morreu. Continua vivo e destilando a peçonha que a sua vida de mal amado depositou na sua alma. Precisamos tomar muito cuidado para não fazer com que ele acabe tendo razão.
A leitura da obra de Shirer me levou ao Mein Kampf. Nos anos setenta era difícil obter um exemplar. Depois de muita procura consegui encontrar um em um sebo na Praça da Sé. Paguei uma nota por ele, na esperança de ler um livro que me levasse a entender a razão do porque, em pleno século vinte, um povo tão educado, culto e inteligente como o alemão conseguira ser seduzido por uma ideologia de ódio como aquela.
Confesso que fiquei decepcionado e com a nítida impressão de ter jogado o meu dinheiro fora comprando aquele livro. Não consegui chegar sequer á metade dele. Era uma leitura tão maçante, chata, difícil e tediosa que nem como livro de história servia. Além de distorcer os fatos, o livro todo era tão mal escrito, com opiniões e teses tão desordenadas, que custava crer que o povo alemão tivesse adotado aquilo como uma espécie de cartilha política e sociológica e a tivesse seguido com o ardor que uma Testemunha de Jeová segue a Bíblia.
Shirer diz que os originais que Hitler mandou para a editora eram piores ainda. Assemelhavam-se a uma redação feita por um vestibulando mal preparado. Alinhava um monte de ideias sem concatenação nem sentido. Antes de ser lançado, o editor, Max Amann, teve que pagar a um revisor para colocar um pouco de ordem na confusa tempestade de ideias que o futuro ditador alemão tinha escrito.
De fato, as ideias de Hitler estavam longe de ser originais. Refletia apenas o ambiente político e social vivido pelo mundo nas primeiras décadas do século XX. A Alemanha estava saindo de duas guerras, vividas num período de menos de cinquenta anos. Uma, a guerra pela sua unificação, que terminou com o famoso Cerco de Paris e a derrota final dos franceses em 1871. Nessa guerra os franceses foram obrigados a assinar o famoso Tratado de Versailhes e entregar aos alemães uma parte do seu território (a Alsácia-Lorena). Depois a Primeira Guerra Mundial, na qual a Alemanha sairia derrotada depois de quatro anos de lutas (1918). Foram duas guerras que nunca terminaram pois levou a uma terceira, que foi a Segunda Guerra Mundial (1939).
O ódio racial e a amargura pela derrota sofrida pela Alemanha na Primeira Guerra Mundial envenenaram a alma alemã naqueles cruciais anos. O ódio contra os judeus já existia há mais de cinco séculos, incubados no espirito do povo alemão. O próprio Martinho Lutero era um virulento antissemita. Desde a época da Reforma Protestante o antissemitismo já vinha sendo incentivado por importantes escritores e filósofos alemães, chegando ao auge em fins do século XIX com as obras de Nietszche, Gobineau e Chamberlain. Hitler, em sua juventude boêmia e miserável, vivida na Viena do início do século, bebeu bastante desse veneno, ao ver os prósperos judeus em suas lojas e joalherias, como donos de bancos e fábricas, e o povo alemão, segundo acreditava, vivendo das migalhas que caiam da mesa desses “abutres de capote preto”, como ele os chamava.
A deterioração econômica e política que tomou conta da Europa nas primeiras décadas do século XX fizeram o resto. Hitler não precisou de muito esforço para convencer os alemães de que era preciso fazer uma limpeza racial na Europa, eliminando não só os judeus, mas também ciganos, eslavos e outros inimigos da sua ideologia, como maçons e Testemunhas de Jeová, por exemplo.
Mais de setenta anos se passaram depois que Hitler morreu e seu odioso partido foi proscrito. Mas ideologias não morrem. Há muita gente na Alemanha e outros países que idolatra esse maluco. A recente guerra sérvia, que fracionou a antiga Iugoslávia é uma prova disso. Foi muito mais um conflito racial do que político. A ideia nacional-socialista ainda seduz os radicais alemães, principalmente os jovens que chegam a idade de trabalhar e não encontram facilmente um lugar no mercado de trabalho. Então eles botam a culpa nos “estrangeiros” que entram no país e ocupam as vagas, trabalhando por salários menores. Não existe forma mais segura de começar a odiar alguém do que pela inveja ou pela sensação de que esse alguém está nos tirando alguma coisa.
Esse livro estava proibido na Alemanha desde o final da Segunda Guerra. O relançamento pode ser bom e pode ser ruim. Pode ser bom porque a maioria do povo alemão, tomando conhecimento dessa doutrina em sua própria fonte pode, de uma vez por todas, se livrar desse vírus que ainda infesta boa parte da sua população. Mas pode ser ruim porque isso acontece justamente no momento em que a Europa está sendo invadida por uma horda de refugiados do Oriente Médio e África. E a Alemanha, o mais próspero país da Europa é o destino buscado pela maioria deles. É coincidência demais para ser ignorada.
Hitler ainda está vivo, ao que parece. O fogo só queimou a sua carne. O seu espírito ainda vaga pelas ruas da Alemanha. Nietszche, o filósofo mais influente entre os nazistas, dizia que estamos condenados a viver o mesmo momento infinitas vezes. Ao que parece ele também não morreu. Continua vivo e destilando a peçonha que a sua vida de mal amado depositou na sua alma. Precisamos tomar muito cuidado para não fazer com que ele acabe tendo razão.