Dilma & Sartori: Habermas explica

Jurgen Habermas (foto acima), sociólogo alemão oriundo do grupo de pensadores e pesquisadores que ficou conhecido no século XX como Escola de Frankfurt, possui uma vasta obra teórica (é o formulador da Teoria da Ação Comunicativa) e pode nos ajudar na compreensão da conjuntura brasileira, tomando-se por base sua noção de capitalismo tardio e a tese de que crises econômicas se transformam rapidamente em crises sociais.

O também alemão Karl Marx, economista e filósofo político, escreveu no século XIX que as sociedades capitalistas tendem, por suas contradições internas, à sucessivas crises econômicas que iriam piorando até o ponto em que os trabalhadores se revoltariam e, por meio da revolução, chegariam à sociedade socialista. O que se viu, contudo, é que essa tese não se concretizou historicamente em várias sociedades.

É aqui que entra Habermas: na década de 1970, ele considerou que as sociedades do século XX, já na fase do capitalismo tardio, se tornaram mais democráticas e realizaram reformas sociais que se corporificaram na experiência conhecida como estado do bem-estar social. Nessas sociedades do capitalismo tardio, tais características compensam as desigualdades sociais e diminuem o potencial revolucionário das classes sociais. Entretanto, as medidas que devem ser tomadas pelos estados em períodos de crise econômica em tais sociedades, geralmente recessivas e voltadas contra os assalariados, levam a uma crise de legitimidade dos governos. E é aqui que entram os Dilma Rousseff e José Ivo Sartori.

No caso específico dos governos Dilma e Sartori, a crise econômica, como vemos, repercutiu rapidamente numa crise social e, igualmente, política, característica essa que se dá principalmente no âmbito federal. Em ambos os casos estão em curso políticas de “ajuste fiscal” que atingem os direitos e os salários dos trabalhadores do serviço público e da iniciativa privada, tanto ativos quanto inativos. Assim, como coloca Habermas, os governos “ajustam” a economia em favor do capital, dos negócios e dos proprietários em detrimento dos trabalhadores, o que leva a população a questionar a legitimidade do governo, visto que seus interesses são atingidos.

Essa realidade é mais visível atuando sobre o governo federal, visto que a sua crise política, oriunda do refluxo econômico e de sua repercussão na esfera social, é mais aguda, eis que, ainda, é acossado pela grande mídia. A recente reforma ministerial é reflexo disso, com a presidente buscando recompor sua governabilidade cedendo mais ministérios ao PMDB, partido do vice-presidente. O PMDB, por sua vez, é um partido heterogêneo, que avança na pauta recessiva para além das medidas propostas pelo governo, propondo, via alguns de seus segmentos, junto com o PSDB, políticas como a ampliação da terceirização, que, além das atividades meio, abrangeria também as atividades fim.

Já no Rio Grande do Sul, o governo tem maioria consolidada na Assembléia Legislativa e apoio velado dos setores majoritários da grande imprensa. Logo, o refluxo econômico o atinge de maneira menos perceptível, sem os mesmos reflexos sociais e políticos, embora aplicando uma variação mais incisiva do mesmo modelo de “ajuste fiscal” recessivo adotado pelo governo brasileiro.

Essa realidade é coerente com as perspectivas formuladas por Habermas para o que ocorre durante as sucessivas crises econômicas nas sociedades do capitalismo tardio. Não é só Freud que explica. Habermas também.


Artigo publicado no jornal Portal de Notíciashttp://www.portaldenoticias.com.br