A CPMF – parece nova, mas tem a cara da velha...
A CPMF – parece nova, mas tem a cara da velha...
- Artigo publicado originalmente no jornal Diário da Manhã (Goiânia-GO), do dia 19.09.2015.
O governo federal diz que precisa cortar 30 bilhões de reais, para fechar a proposta orçamentária de 2016. E agora, já em meados de setembro, o ministro da fazenda diz que vai-se cortar dois terços da quantia em gastos, ficando o outro terço para ser preenchido o sacrifício dos contribuintes.
Numa estrutura de governo gigantesca e perdulária seria fácil cortar os outros 10 bilhões, bastaria sacrificar mais uns ministérios e subsidiárias de estatais inúteis - você deve estar pensando. Mas, porque o governo não o faz?
Entre outros motivos, porque parece bem mais fácil apresentar a conta da crise que o próprio governo criou ao contribuinte do que enfrentar uma reforma administrativa que vá ao ponto, eliminando as fontes geradoras dos problemas que levaram a tanto e também, porque o governo está em busca de um imposto novo, que possa ser utilizado sem as sucessivas vinculações promovidas, ao longo da última década.
E o imposto que preenche este requisito é a CPMF – Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, já cobrada no passado, conhecida, detestada e combatida, em virtude de seu caráter invasivo, a sua contraditória e anedótica tendência à durabilidade, além geração do chamado "efeito cascata", isto é, a sua incidência e arrecadação em diferentes e repetidos momentos, durante o processo de produção ou venda de produtos, bens e serviços, e cujo retorno tem sido aventado por motivos diversos, nos últimos anos, no governo federal e governos estaduais.
Para o governo, além de se constituir em tributo novo, o tal imposto tem outra supina vantagem - a inevitabilidade de sua arrecadação, que é feita mediante repasse a partir da conta bancária de pessoas físicas e jurídicas, que a transforma numa espécie prática de posto virtual de acesso e arrecadação governamental, sem que os seus titulares das mesma possam fazer qualquer coisa a respeito.
Não custa recordar: o IPMF (governo Itamar Franco – alíquota inicial de 0,25
%), que se transformou depois, em CPMF (governo FHC – alíquota anterior, de 25% e aumento para 0,38%, que se estendeu até o governo Lula), teve a criação originalmente atrelada à geração de recursos para serem aplicados na área da saúde, mas no fim, servia até para pagamento de despesas de custeio da máquina governamental (papel e material de expediente, água tratada, energia elétrica, etc.) ou seja, já não se distinguia de outros tributos, como fonte de arrecadação, nem tinha justificativa, como fundamento de sua existência.
E para quê servirá a volta da velha CPMF, com indicação de mordida inicial de 0,20%? Ao contrário da antiga, não vem com a esperança de gerar algum produto ou serviço com relevância social para a população do país. Servirá apenas para tapar o rombo de caixa da previdência social, questão da qual o governo foge feito o diabo da cruz, faz mais de década. Ou seja, ela servirá apenas como fonte circunstancial de receita para aplacar os efeitos de um problema que só se resolve com reforma. Mas, diz o governo, a alíquota de arrecadação será de apenas 0,38% e que vai promover um fórum para a discutir a situação de caixa da previdência social, depois que o tributo estiver aprovado. Ah bom!...
Dado o retrospecto da arrecadação do tributo, é impossível que o contribuinte não imagine que, em algum ponto, o governo não inquine o novo tributo novo com o vício paulatino que levou à extinção do antigo em 2006 (governo Lula).
Indício em tal sentido: quando o ministro Joaquim Levy e membros do governo aventaram a possibilidade de sua reinstauração, não fizeram qualquer menção inicial à vinculação que existiu na primeira.
A despeito ter adoçado a boca dos governadores com a promessa de um naco da nova CPMF, o governo federal terá provavelmente grande dificuldade com a sua aprovação no Congresso Nacional, dentro do conjunto de medidas anunciadas para o combate do déficit público no governo federal, dado o caótico ambiente político e administrativo atual, pontuado pela sucessão diária e vertiginosa de revelações de fatos relacionados com a ineficiência e práticas criminosas ligadas ao desvio de recursos públicos, diante do qual parcela majoritária dos eleitores reagem negativamente à volta de sua cobrança, dada a frustração e os sinais claros de descontentamento e reivindicação de mudanças de rumo.
Neste sentido, vale registrar: no final de seu segundo mandato, FHC, prevendo a redução legal da alíquota de arrecadação do tributo no governo seguinte (0,008% de alíquota), estabeleceu o aumento da alíquota do IOF – Imposto sobre Operações Financeiras, como medida de compensação. E depois da perda da arrecadação da CPMF, o governo Lula lançou um pacote compensatório de arrecadação – novo aumento da alíquota do IOF e da CSSL – Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido, cobrada das entidades bancárias. A motivação da instituição da CPMF, portanto, é bastante questionável, pois indica, ao fim, o descontrole de sucessivos governos com os gastos governamentais.
Falando sobre a necessidade de aumento de alíquota de arrecadação de tributos existentes e a recriação da CPMF, como forma de debelar uma crise gestada no âmbito do próprio governo federal ao longo dos últimos anos, o ministro da fazenda Joaquim Levy (que é ruim na arte de vender cenários e estranho, nos comentários de humor negro) disse em entrevista que o governo precisa de uma “ponte de sustentabilidade fiscal”.
E o povo e as empresas, já no limite de sua capacidade contributiva, parecem ter ficado com a sensação de que a referência é a uma ponte que, no fim das contas, não leva a lugar nenhum, posto que a reforma administrativa que se propõe está voltada para as consequências dos atos governamentais passados (e a crise decorrente) e não, para a projeção do governo e do país para o futuro...