O parcelamento de salários é um perigoso bode na sala
O parcelamento de salários dos servidores públicos estaduais não é um fato novo (1) no Rio Grande do Sul: já foi adotado nos governos de Antônio Britto (1995/1998), Germano Rigotto (2003/2006) e Yeda Crusius (2007/2010), os dois primeiros do PMDB e o último do PSDB. No governo José Sartori (PMDB), agora, a medida administrativa se repete, visando criar um clima favorável à aprovação de alguns projetos do governo que tramitam na Assembleia Legislativa (AL/RS) gaúcha.
O jornalista Juremir Machado da Silva, em artigo recente, matou a charada: “Sartori faz um jogo político que não encontra justificativa moral: poderia usar o aumento dos depósitos judiciais para pagar em dia o funcionalismo. O dinheiro existe, a Assembleia Legislativa está disposta a aprovar e o judiciário abriu mão de parte dos juros. Por que o projeto ainda não foi enviado? Porque o governo só quer fazer isso depois de ter seus projetos mais amargos, como o aumento de impostos, aprovado. É pressão. Ou chantagem. Joga o funcionalismo contra a sociedade”.
Por outro lado, nas ocasiões acima citadas em que o parcelamento também ocorreu, o funcionalismo não fez greve (2). Porque o faz agora? A resposta está no fato de que a luta dos servidores se motiva, na verdade, contra projetos que afetam diretamente seus direitos e salários, como, por exemplo, a PEC 244/2015, que alterara o artigo 46 da Constituição Estadual (que prevê aposentadoria após 30 anos de serviço para servidores e 25 para servidoras da BM), e o PLC 206/2015, que atingirá os aumentos parcelados até 2018, concedidos pelo governo anterior, para as categorias da segurança pública (Brigada Militar, Polícia Civil, Serviços Penitenciários e Instituto de Perícias), além de, na prática, congelar os salários dos demais servidores. No caso dos policiais civis e servidores penitenciários, a situação é ainda mais complicada: essas categorias abriram mão de todas as suas vantagens (adicionais, triênios, etc) a fim de receber os aumentos.
Nesse sentido, a mobilização dos servidores pelos seus sindicatos, calcada na ponta mais visível do problema, ou seja, o parcelamento de salários, configura-se numa tática perigosa, visto que o governo, ao retirar tal bode da sala (o que tem plena possibilidade de fazer em curto prazo, com os depósitos judiciais), vai tentar dar a impressão à sociedade de que o movimento grevista não mais se justificaria.
Além de usar o parcelamento como pressão, um outro constrangimento polítco-moral para o governo Sartori consiste na atitude dos deputados estaduais de sua base aliada no governo anterior, quando oposição, por terem votado favoravelmente aos aumentos, aprovados por unanimidade na AL/RS. Com um agravante: tentaram aumentar os índices, afirmando que o governo Tarso poderia ter oferecido mais aos servidores...
A greve do funcionalismo estadual também se relaciona a uma outra questão, que já abordei anteriormente em artigo aqui no Portal: existe um modelo alternativo aos ajustes fiscais recessivos propostos pelos governos Dilma Rousseff (PT) e Sartori, assim como o proposto pelo BCE e FMI à Grécia? O governo grego perdeu a queda de braço, o brasileiro aderiu ao jogo e o gaúcho está tentando colocar nas costas dos seus servidores a conta da reestruturação financeira do Estado.
Existem outras saídas para essa crise? O debate é complexo, mas, a propósito, podemos mencionar a Lei Complementar 148/2014, que reestruturou a dívida do Estado com a União, abrindo um espaço fiscal de mais de 4,5 bilhões de reais, que pode ser utilizado já no final de 2015, como uma possibilidade de curto prazo, sem necessidade de bodes na sala...
Artigo publicado na versão impressa e na seção de Opinião online do jornal Portal de Notícias: http://www.portaldenoticias.com.br/noticia.php?id=4170&tipo=C&editoria=15&include=NOTICIAS
O parcelamento de salários dos servidores públicos estaduais não é um fato novo (1) no Rio Grande do Sul: já foi adotado nos governos de Antônio Britto (1995/1998), Germano Rigotto (2003/2006) e Yeda Crusius (2007/2010), os dois primeiros do PMDB e o último do PSDB. No governo José Sartori (PMDB), agora, a medida administrativa se repete, visando criar um clima favorável à aprovação de alguns projetos do governo que tramitam na Assembleia Legislativa (AL/RS) gaúcha.
O jornalista Juremir Machado da Silva, em artigo recente, matou a charada: “Sartori faz um jogo político que não encontra justificativa moral: poderia usar o aumento dos depósitos judiciais para pagar em dia o funcionalismo. O dinheiro existe, a Assembleia Legislativa está disposta a aprovar e o judiciário abriu mão de parte dos juros. Por que o projeto ainda não foi enviado? Porque o governo só quer fazer isso depois de ter seus projetos mais amargos, como o aumento de impostos, aprovado. É pressão. Ou chantagem. Joga o funcionalismo contra a sociedade”.
Por outro lado, nas ocasiões acima citadas em que o parcelamento também ocorreu, o funcionalismo não fez greve (2). Porque o faz agora? A resposta está no fato de que a luta dos servidores se motiva, na verdade, contra projetos que afetam diretamente seus direitos e salários, como, por exemplo, a PEC 244/2015, que alterara o artigo 46 da Constituição Estadual (que prevê aposentadoria após 30 anos de serviço para servidores e 25 para servidoras da BM), e o PLC 206/2015, que atingirá os aumentos parcelados até 2018, concedidos pelo governo anterior, para as categorias da segurança pública (Brigada Militar, Polícia Civil, Serviços Penitenciários e Instituto de Perícias), além de, na prática, congelar os salários dos demais servidores. No caso dos policiais civis e servidores penitenciários, a situação é ainda mais complicada: essas categorias abriram mão de todas as suas vantagens (adicionais, triênios, etc) a fim de receber os aumentos.
Nesse sentido, a mobilização dos servidores pelos seus sindicatos, calcada na ponta mais visível do problema, ou seja, o parcelamento de salários, configura-se numa tática perigosa, visto que o governo, ao retirar tal bode da sala (o que tem plena possibilidade de fazer em curto prazo, com os depósitos judiciais), vai tentar dar a impressão à sociedade de que o movimento grevista não mais se justificaria.
Além de usar o parcelamento como pressão, um outro constrangimento polítco-moral para o governo Sartori consiste na atitude dos deputados estaduais de sua base aliada no governo anterior, quando oposição, por terem votado favoravelmente aos aumentos, aprovados por unanimidade na AL/RS. Com um agravante: tentaram aumentar os índices, afirmando que o governo Tarso poderia ter oferecido mais aos servidores...
A greve do funcionalismo estadual também se relaciona a uma outra questão, que já abordei anteriormente em artigo aqui no Portal: existe um modelo alternativo aos ajustes fiscais recessivos propostos pelos governos Dilma Rousseff (PT) e Sartori, assim como o proposto pelo BCE e FMI à Grécia? O governo grego perdeu a queda de braço, o brasileiro aderiu ao jogo e o gaúcho está tentando colocar nas costas dos seus servidores a conta da reestruturação financeira do Estado.
Existem outras saídas para essa crise? O debate é complexo, mas, a propósito, podemos mencionar a Lei Complementar 148/2014, que reestruturou a dívida do Estado com a União, abrindo um espaço fiscal de mais de 4,5 bilhões de reais, que pode ser utilizado já no final de 2015, como uma possibilidade de curto prazo, sem necessidade de bodes na sala...
Artigo publicado na versão impressa e na seção de Opinião online do jornal Portal de Notícias: http://www.portaldenoticias.com.br/noticia.php?id=4170&tipo=C&editoria=15&include=NOTICIAS
- (1 ) – “O governo Britto, por exemplo, estabeleceu datas de pagamento para quem recebia até R$ 900,00 (no último dia útil do mês) e os demais recebiam no dia 15 ou 20 do mês seguinte. Em 1995 o 13º salário foi pago em duas parcelas, em janeiro e em fevereiro de 1996. Durante o governo Rigotto, em fevereiro de 2004, foram pagos os salários de quem recebia até R$ 1.000,00 e o restante dos servidores recebeu em 11 de março. Em todo o período daquela gestão os servidores tiveram que optar entre o pagamento do 13º através de empréstimos, junto ao Banrisul, ou de parcelamento em cinco meses a contar de maio do ano seguinte, com correção. Já, durante o governo Yeda, houve o parcelamento do pagamento do funcionalismo por 11 meses (de março a junho de 2007 a parcela salarial acima de R$ 2.500,00 era paga no dia 10 do mês seguinte, e, de julho de 2007 a fevereiro de 2008, o limite baixou para R$ 1.950,00). Na época não houve atraso no 13º salário, pois a gestão contou com os recursos da venda de ações do Banrisul, desde 2007” - Raquel Wunsch:(http://www2.al.rs.gov.br/noticias/ExibeNoticia/tabid/5374/IdOrigem/1/IdMateria/298486/language/pt-BR/Default.aspx)
- (2 )– Um dos motivos para isso é o fato de que o corte salarial nunca foi tão baixo como agora, atingindo todos os servidores estaduais. Nas ocasiões anteriores, uma parcela minoritária era atingida. Na nota 1, acima, deve-se levar em conta que os valores não estão atualizados, sãos os da época.