Nazismo e tragédia

O COMEÇO DA TRAGÉDIA

HÁ OITENTA ANOS, EM JANEIRO DE 1933, HITLER TORNOU-SE PRIMEIRO-MINISTRO. AS CIRCUNSTÂNCIAS QUE O LEVARAM AO PODER PRECISAM SER CONHECIDAS PARA NÃO SER REPETIDAS

O poder nas mãos de um partido único e sustentado na ação violenta de grupos paramilitares, o culto à personalidade do líder, a supressão das liberdades individuais e o controle absoluto da imprensa e da economia são características dos regimes fascistas, as quais o nazismo levou à sua expressão mais trágica. Guiados pelo austríaco naturalizado alemão Adolf Hitler, seus seguidores fanatizados transformaram o estado em uma máquina de matar e lançaram o mundo na guerra mais letal da história, que levou à morte mais de 70 milhões de pessoas - 6 milhões de vítimas, predominantemente judeus, foram abatidas em campos de extermínio administrados com férrea disciplina e exigência de produtividade. O produto? Corpos humanos incinerados.

A tragédia do nazismo começou a ser montada no aparelho de estado alemão em 30 de janeiro de 1933, há oitenta anos, quando Adolf Hitler se tomou primeiro-ministro. O empuxo social e político que o levou ao poder foi alimentado por uma mistura de ressentimento, ódio racial, fanatismo, falta de informação e sonho de glória nacional de uma população desmoralizada pelos termos de rendição da Alemanha derrotada na Grande Guerra, como até hoje os europeus se referem ao que chamamos de I Guerra Mundial.

O ressentimento era real e disseminado. A Alemanha foi obrigada a se render em 1918, quando não havia em seu território um único soldado inimigo. Cansados das agressões bélicas alemãs, os vencedores da Grande Guerra (França, Inglaterra, Rússia e Estados Unidos) decidiram fazer terra arrasada da economia da Alemanha. Como sempre, quem mais sofreu foi o povo, vergado pelo desemprego, pela fome e pela hiperinflação. Em 1918, com 3 marcos alemães se comprava 1 dólar americano. Três anos depois, a taxa de conversão estava em 1 200 marcos por dólar. O ódio racial foi direcionado aos judeus, escolhidos como bodes expiatórios da miséria. A falta de informação veio com a destruição da imprensa livre e o monopólio das comunicações pelo mais poderoso instrumento de propaganda, o rádio. Mais tarde, pretextando o estado de guerra, os nazistas confiscaram aparelhos domésticos de rádio e distribuíram à população milhões de outros sem dial, que só pegavam as transmissões oficiais. Hitler explorou a ânsia dos alemães por mais território. Sem tradição colonial, o espaço vital, o Lebensraum, tinha de ser conquistado pela Alemanha na própria Europa.

As circunstâncias históricas aproveitadas pelo nazifascismo para crescer e abafar todas as demais forças políticas não podem se repetir no mundo de hoje. Mas, como a natureza, que abomina o vácuo, o fascismo se infiltra em toda brecha deixada pelas instituições democráticas. Diz a historiadora americana Wendy Lower, da Universidade Claremont McKenna, na Califórnia: "Fenômenos políticos que exploram o sentimento de vitimização, o nacionalismo exacerbado e a escolha de um bode expiatório podem ressurgir a qualquer momento. A diferença é que hoje nenhum ditador pode se dar ao luxo de adotar um projeto de expansão territorial. O custo político é impagável". Mas o expediente de Hitler de usar a democracia para chegar ao poder e depois destruí-la tornou-se uma manobra clássica no século XX e continua sendo tentada nos dias de hoje.

O ovo da serpente nazista foi chocado na democracia. O regime que viu a ascensão do nazismo foi moldado pela República de Weimar, nome da cidade onde uma assembleia se reuniu para criar uma democracia parlamentar com uma câmara alta e outra baixa, o Reichstag. Todos os homens e mulheres com mais de 20 anos ganharam o direito de votar, o que colocou o país na vanguarda do sufrágio feminino. As Forças Armadas foram subordinadas ao Poder Legislativo. Entre os direitos previstos pela Constituição de Weimar estava a proibição de demitir alguém do serviço público por questões de gênero, religião ou política.

Mas a República de Weimar ficaria conhecida mesmo pelas agruras econômicas derivadas dos termos da rendição na Grande Guerra, o Tratado de Versalhes, assinado em junho de 1919. No acerto imposto pelos vitoriosos, a Alemanha perdeu 13% do território, 70% da produção de ferro e um quarto das minas de carvão. O acordo exigia o pagamento, principalmente à França e à Inglaterra, de uma enorme soma em marcos alemães a título de reparação de guerra. Um jovem mas já reputado economista inglês assessorou os mandatários de seu país nas negociações que levaram à redação final do tratado. Ele se chamava John Maynard Keynes. Em pouco mais de um mês, ele escreveu um livro que viria a se tornar um dos maiores sucessos de seu tempo, As Consequências Econômicas da Paz. Na obra, Keynes previu que o esmagamento da Alemanha pelas exigências dos aliados criaria naquele país as condições para o surgimento de uma força política salvacionista tendo à frente um líder carismático. De certa forma, Keynes previu a ascensão de Hitler como resultado do que ele chamou famosa 'mente de "Paz Cartaginesa", referência aos termos catastróficos impostos a Cartago pelos vitoriosos romanos em 146 a.c.

A Alemanha entrou em parafuso. Radicais da esquerda e da direita culpavam os membros do Parlamento pela escassez e hiperinflação. Foram muitas as tentativas de aproveitar o caos para fazer uma revolução bolchevique, inspirada na Rússia de 1917. Hitler projetou-se nesse caldo político em ebulição cavalgando uma ideologia que atendia aos anseios de diferentes setores da sociedade. Aos empresários, ele prometia impedir a revolução comunista. Aos humilhados pelo Tratado de Versalhes, dizia que o país deveria expandir seu território e cancelar o pagamento das reparações de guerra. Para os desiludidos com a crise econômica, discursava contra os judeus capitalistas. Para os jovens, prometia empregos.

Hitler era filiado ao pequeno e fascista Partido Alemão dos Trabalhadores desde 1919. No ano seguinte, ele refundou a legenda, acrescentando ao nome o termo "Nacional-Socialista", de onde vem a corruptela "nazista". Em 1923, tentou o famoso e fracassado Putsch na cervejaria BÜfgerbraukeller, em Munique. O golpe visava a aprisionar os líderes regionais da Baviera que estavam reunidos na cervejaria. A região se sublevaria contra o poder central e deixaria de pagar sua parte nas reparações de guerra. Por mais patético que tenha sido, o Putsch de Munique rendeu a Hitler a notoriedade nacional que ele procurava. Em um julgamento em que os juízes mal conseguiam esconder sua simpatia pelo nazismo e por seu líder, Hitler foi condenado a cinco anos de prisão. Cumpriu nove meses, que gastou escrevendo Mein Kampf (Minha Luta), livro autobiográfico em que expunha o ódio aos judeus e pregava a expansão territorial da Alemanha. "Os nazistas, assim como os comunistas, nutriam um rancor pelo cosmopolitismo, pelo liberalismo, pelos imigrantes e pela ideia de que direitos humanos são universais. São valores que, na Alemanha, foram personificados nos judeus", diz o sociólogo Demétrio Magnoli.

Os nazistas entenderam que o antissemitismo, embora disseminado, não rendia votos. Nas campanhas eleitorais, o ódio racial foi abrandado, dando a muitos a falsa esperança de que a obsessão pudesse desaparecer. Afinal, a comunidade judaica representava menos de 1% da população alemã. "Havia uma crença de que Hitler no poder seria pragmático e esqueceria o assunto", diz o historiador israelense Guy Meron. Foi um doloroso engano. O ódio racial permaneceu guardado como brasa dormida para se reavivar como fogo depois que os nazistas chegaram ao poder.

Em sua escalada final, o partido nazista conseguiu pouco mais de um terço dos votos nas eleições parlamentares de 1932, e Hitler arrancou o cargo de chanceler do respeitado mas debilitadíssimo presidente Paul Von Hindenburg. Não seria mais possível conter Hitler. Aproveitando as circunstâncias pouco claras de um incêndio no Reichstag, Hitler culpou os comunistas e Hindenburg deu-lhe poderes ditatoriais para combater o que lhe foi vendido como uma insurgência bolchevique. Hindenburg morreu logo depois. Seu funeral solenemente prussiano foi usado pelos nazistas como a primeira demonstração pública do poder de Adolf Hitler. Na mesma noite milhares de nazistas com tochas nas mãos marcharam por Berlim e se aglomeraram defronte ao edifício onde ficavam os aposentos de Hitler. Ele chegou à janela, acenou, sorriu meio nervosamente. Começara a maior tragédia da história contemporânea.

SEM RAÇA

A ideia da raça pura não foi inventada pelos nazistas, mas eles se apropriaram dela: "Não pode fazer parte do povo senão aquele que tem sangue alemão". Foi preciso embasar a crença em critérios científicos, e os nazistas recorreram à antropometria. Mediam-se a largura do nariz e o tamanho da cabeça para, assim, distinguir os parâmetros característicos dos arianos dos de outras raças. Seis meses depois de Hitler chegar ao poder, ele promulgou a lei eugenista que dava ao estado o direito de esterilizar cidadãos considerados geneticamente defeituosos. Até o fim do regime, cerca de 400.000 pessoas passaram pelo procedimento. O conceito de raça está, hoje, totalmente desmoralizado. Cerca de 85% da variação genética do DNA humano ocorre entre indivíduos, não entre grupos étnicos. Pode haver diferença genética maior entre dois indivíduos brancos do que entre um branco e outro negro. Todos os 7 bilhões de habitantes do planeta descendem de um mesmo grupo de algumas dezenas de antepassados - e, a se fiar nas pesquisas, de uma única mâe, a "Eva Mitocondrial", chamada assim por se ter chegado a ela pelo estudo da evolução da mitocôndria, organela celular cujo DNA é transmitido às gerações seguintes apenas pelas mulheres.

(Por Duda Teixeira – Veja 30/1/13 ed. 2306)

ATENÇÃO! NAS QUESTÕES OBJETIVAS ABAIXO, MARQUE UM X

1. Na Alemanha, o difícil contexto econômico e social ao longo dos anos 1920 foi marcado pela grave situação de 1922-1923 (com a queda do marco e a hiperinflação), seguida das consequências dramáticas da crise de 1929 [...]. [...] O NSDAP [pequeno partido político liderado por Hitler] aproveitou-se da franca decomposição do regime. Hitler estrategicamente

aproximou-se dos meios industriais e dos partidos conservadores [...]. Em janeiro de 1933, o presidente da República [...] convidou Hitler para fazer parte do governo. Um mês depois, o Reichstag estava em chamas [...]. Com a crise deflagrada, os parlamentares (exceto os social-democratas) aprovaram a cessão de plenos poderes a Hitler pelo período de quatro anos. Com Hitler no poder, o NSDAP tornou-se [...] o único partido autorizado na Alemanha. Os prisioneiros políticos foram colocados em campos de trabalho [...]. ENDERS, Armelle et al. História em Curso: Da Antiguidade à Globalização. São Paulo: Editora do Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2008. p.308. Adaptado.

No contexto apresentado acima, com a chegada de Hitler ao poder, instaurou-se na Alemanha o(a)

(A) regime político totalitário

(B) ordem democrática

(C) sistema econômico socialista

(D) Estado republicano

(E) partido progressista

2. (Modificada) Afinal, de que maneira Adolf Hitler ascendeu ao poder na Alemanha, nos anos 1930

a) pelas mãos do exército alemão que quis desforrar-se das humilhações impostas pelo Tratado de Versalhes.

b) através de uma ação golpista cuja ponta de lança foram as forças paramilitares do partido nazista.

c) em conseqüência de uma aliança entre os nazistas e os comunistas.

d) a partir de sua convocação pelo presidente Hindenburg, para chefiar uma coalizão governamental.

e) através de uma mobilização semelhante à que ocorreu na Itália, com a marcha de Mussolini sobre Roma.

3. [...] todo cruzamento de dois seres de valor desigual dá como produto um meio termo entre os valores dos pais [...] Tal ajuntamento está em contradição com a vontade da natureza, que tende a elevar o nível dos

seres. Este objetivo não pode ser atingido pela união de indivíduos de valores diferentes, mas só pela vitória completa e definitiva dos que representam o mais alto valor. O papel do mais forte é o de dominar e não o de se fundir com o mais fraco, sacrificando assim sua própria

grandeza. Adolf Hitler

No livro "Mein Kampf", Hitler expressava que:

a) a necessidade de preservação da raça pura justificava o domínio e a eliminação das demais raças e a expansão da Alemanha.

b) o racismo e o autoritarismo serviriam para defender a elevação da raça pura eslava e o extermínio dos judeus.

c) o movimento nacional-socialista desaprovava o antisemitismo e o aperfeiçoamento genético através da eugenia.

d) os alemães eram superiores e a raça ariana inferior, justificando, desse modo, o espaço vital.

e) o mito da superioridade da raça ariana servia para que os nazistas estimulassem o internacionalismo e o liberalismo.

4. Em 1933, Adolf Hitler assumiu o título de Fuhrer e anunciou ao mundo a fundação do III Reich (Terceiro Império) alemão. Começava uma longa série de crimes que a humanidade não pode esquecer.

Sobre esse fato, assinale a(s) proposição(ões) VERDADEIRA(S).

01. A ideologia nazista pregava o mito da superioridade da raça ariana, encarnada pelo povo alemão. A necessidade de preservação da "raça pura" justificou a perseguição e eliminação dos judeus.

02. A ascensão do nazismo pode ser explicada, entre outros fatores, pela incapacidade do governo em solucionar o colapso da economia alemã, provocado pela crise mundial de 1929.

04. As leis raciais na Alemanha limitavam a liberdade e proibiam os judeus de exercerem atividades comerciais e industriais.

08. As idéias nazistas tiveram amplo apoio dos nacionalistas e comunistas. Viam-na, os primeiros, na esperança de impedir a influência estrangeira; os segundos, uma forma de combater a burguesia.

16. Durante a Segunda Guerra Mundial, as autoridades nazistas passaram a executar a "solução final", isto é, o extermínio total dos judeus.

32. Ao término da Segunda Guerra Mundial, um número significativo de nazistas refugiou-se em países da América do Sul.

( ) A resposta é a somatória das proposições verdadeiras.

5. "Hitler considerava que a propaganda sempre deveria ser popular, dirigida às massas, desenvolvida de modo a levar em conta um nível de

compreensão dos mais baixos. 'As grandes massas', dizia ele, 'têm uma capacidade de recepção muito limitada, uma inteligência modesta, uma memória fraca'. Por isso mesmo, a propaganda deveria restringir-se a pouquíssimos pontos, repetidos incessantemente...Tudo interessa no jogo da propaganda: mentiras, calúnias; para mentir, que seja grande a mentira, pois assim sendo, 'nem passará pela cabeça das pessoas ser possível arquitetar uma tão profunda falsificação da verdade'".

(Lenharo, Alcir, Nazismo, "o triunfo da vontade". 6• ed., São Paulo, Ática, 1998, p.47-48.)

A respeito do nazismo é CORRETO afirmar:

a) Não pode ser definido como um regime totalitário, uma vez que a aceitação de sua doutrina foi conseguida pelo convencimento das massas populares, através de uma intensa propaganda.

b) Utilizou-se da propaganda para construir uma imagem grandiosa da Alemanha, para louvar seu líder Adolph Hitler e para estimular a perseguição a grupos considerados perigosos, traidores e inferiores à raça ariana.

c) Os grandes espetáculos eram espontaneamente organizados pelas massas e contavam com uma diversidade de símbolos e bandeiras representando a pluralidade étnica característica da Alemanha.

d) A celebração procurava interferir na educação da juventude alemã, uma vez que as escolas conseguiram manter-se a salvo das influências nazistas.

e) Apesar da intensa propaganda, o número de parlamentares eleitos pelo partido nazista manteve-se estável na década de 1930, formando uma ruidosa minoria que só chegaria ao poder pelo golpe de Estado de 1933.

6. Eugenia

(a) teoria que busca produzir uma seleção nas coletividades humanas, baseada em leis genéticas.

(b) garantia que o estado tem o direito de esterilizar cidadãos considerados geneticamente defeituosos.

(c) não era praticada em Esparta aos recém-nascidos com algum defeito ou anomalia.

(d) seu objetivo é melhorar ainda mais a espécie humana dadas suas imperfeições e produzir uma raça superior as demais.

(e) todas anteriores são falsas.

RESPONDA ÀS QUESTÕES ABAIXO (copie as perguntas)

A) Explique como se deu a tragédia do nazismo há oitenta e três anos, que fatores foram fundamentais para isso?

B) Com base no texto e de acordo com os seus conhecimentos, afinal, o que é fascismo, quais são as características do fascismo, e o ocorreu com o Estado?

C) O que aconteceu com a Alemanha ao fim da Primeira Guerra, quem mais sofreu, o que aconteceu com a imprensa livre e por que o rádio se tornou o maior veículo do regime?

D) Afinal, qual o objetivo da Lei Eugenista - promulgada por Hitler ao chegar ao poder – e quantas pessoas foram submetidas ao procedimento?

E) É correto o conceito de raça, isto é, em relação aos seres humanos, explique em detalhes?