O ETERNO RETORNO
O ETERNO RETORNO
Estamos diante, mais uma vez, para que se cumpra a maldição de uma nação predestinada a parir filhos não gentis, de um escândalo de corrupção, sendo que desta vez, apresentando contornos diferenciados, visto envolver pessoas reincidentes.
Não digo isso pelo ineditismo da situação, pois reincidir em atos de corrupção é tão costumeiro quanto tomar cafezinho na padaria da esquina. O diferencial se dá pela reincidência em público de uma forma mais escrachada que as anteriores, inclusive com mais recursos de documentação audio- visual.
O principal personagem desta mais recente novela tragicômica brasileira, o governador do distrito federal José Roberto Arruda, esteve envolvido em 2001, quando senador da república pelo PSDB, no escândalo da violação do painel eletrônico utilizado na votação que cassou o mandato do ex-senador Luis Estevão, tendo como comparsa o finado todo poderoso senador baiano Antônio Carlos Magalhães.
Ainda tenho na memória a deprimente atuação do falastrão, que entre desmentidos, contradições e reconhecimento de mea-culpa, acompanhados de lágrimas e desabafos sobre dignidade e formação familiar, renunciou para não perder seus direitos políticos.
Sempre é bom lembrar para um povo de fácil esquecimento que, à época, era o líder do governo Fernando Henrique Cardoso, fato importante quando se trata de um político que após todo um desgaste de réu confesso, ingressou no partido irmão do PSDB, o antigo PFL, recebendo total apoio de seus líderes como Jorge Bornhausen e ACM.
Não perdeu tempo. Após aproximadamente um ano e meio, estava novamente na meada política circulando entre afetos e desafetos, visando o governo do distrito federal e pasmem... logrando êxito ao se eleger como o deputado federal mais votado do Distrito Federal e o mais votado do país em termos proporcionais, cumprindo mandato até 2006, quando foi eleito governador do Distrito Federal através de manobras políticas capitaneadas por Bornhausem e que envolviam o ex-governador Joaquim Roriz .
Este resumo curricular introdutório tem uma razão que vai ao cerne da questão: como pode um povo razoavelmente esclarecido, mormente de uma das regiões mais desenvolvidas do país, habitantes da capital e arredores, terem reeleito tal indivíduo? Este é um exemplo entre inúmeros outros semelhantes que ocorrem nos quatro cantos do país.
Nessas horas, inevitavelmente me vem à cabeça o ¨Discurso da Servidão Voluntária¨ de Etiénne de La Boétie, que faz o questionamento acerca das possíveis causas que levariam os povos a se submeterem à vontade de um tirano, o que se mostra como uma grande interrogação e indignação opressora. Claro que para nossa época e lugar, com outra roupagem... sendo exatamente aí onde mora o perigo. Explico: nesta outra roupagem, o que se discute não é a figura de um tirano e sim as formas de governo, especificamente a democracia, a qual pode ficar sériamente ameaçada.
Ora, se tirania é uma forma de governo usada em situações excepcionais como alternativa à democracia, na qual o chefe governa com poder ilimitado, embora sem perder de vista que devia representar a vontade do povo, podemos então afirmar que no caso brasileiro - onde o povo se curva consciente e voluntariamente aos descalabros, irregularidades e sucessivas ações de corrupção de seus governantes, com todo o aparato e legitimação das urnas, a ponto de conduzi-los repetidas vezes ao poder - a democracia representa o tirano de La Boétie.
Urge que a sociedade brasileira, composta por uma esmagadora maioria de cidadãos de bem, promova de forma mais contundente e em diversos níveis e fóruns, a necessária discussão e educação da sua população, reagindo enérgica e prontamente a essas ações criminosas e repugnantes, antes que sejamos engolidos por esses calhordas que se locupletam à custa da miséria, exploração e sofrimento de seus semelhantes.
Marco Antônio Abreu Florentino
OBS: Texto escrito em 2009 sobre a reeleição de Roberto Arruda, ex governador do Distrito Federal e que na sua saga corrupta, nem chegou aos pés do que estamos a presenciar nos dias de hoje, portanto, conforme o título do texto, tem tudo haver com a atual situação do Brasil.
Aliás, ¨O Eterno Retorno¨, expressão emprestada de Nietzsche, que afirma ocorrer sempre no infinito, também na vida social e política brasileira vai continuar, a não ser que haja uma revolução, não armada, mas cultural e dos costumes, vinda do seio do povo brasileiro e não das instâncias do poder.
Em verdade é que, atualmente, temos o agravante da generalização e banalização da corrupção, onde assistimos os políticos, autoridades e empresários corruptos agirem naturalmente com uma ganância insaciável por bilhões, aliado à constatação de uma direita medíocre e canalha, que visa tão somente seu intestino e o desencanto e desapontamento com uma esquerda burra, incompetente e radical, que acabou se deixando levar pelos mesmos caminhos da direita que tanto critica e combate. Hoje, o tirano de La Boétie tem um nome: Dilma Rousseff. Tudo somado ao comodismo e passividade histórico-cultural de um povo de natureza servil e a inexistência de uma terceira via adequada para que se cumpra o natural movimento dialético hegeliano, a qual chamo de ¨a síntese da esperança¨, como ocorreu no início do século XX com o socialismo Marxista, fica completa a receita da feijoada podre à brasileira.
Marco Florentino