NOVO APARTAMENTO DE LULA NO GUARUJÁ

(Jornal o Globo)

Cooperativa entrega triplex de Lula, mas três mil ainda esperam imóvel

Bancoop, que foi presidida por Vaccari e sofre investigação, contratou a OAS

por Germano Oliveira

07/12/2014 7:00 / Atualizado 07/12/2014 8:36

Esqueletos de prédios da Bancoop inacabados na zona leste de SP - Fernando Donasci / Fernando Donasci

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SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já pode passar o “reveilon” na Praia das Astúrias, no Guarujá, área nobre do litoral Sul de São Paulo. De sua ampla sacada, poderá ver a queima de fogos, que acontece na orla bem defronte do seu prédio, feito pela OAS, empresa investigada pela Operação Lava-Jato. É que na semana passada terminaram as obras de reforma do apartamento triplex no Edifício Solaris, que ele e dona Marisa Letícia, sua mulher, compraram por meio da Bancoop — a Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo —, ainda na planta, em 2006. Acusada de irregularidades e em crise financeira, a Bancoop deixou três mil famílias sem receber os sonhados apartamentos.

Por isso, o então presidente da cooperativa, João Vaccari Neto, tesoureiro do PT e investigado na Lava-Jato pela suspeita de operar parte do esquema de corrupção na Petrobras, precisou contratar a OAS para terminar pelo menos cinco prédios da Bancoop. Um deles foi o prédio onde Lula tem o triplex.

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O Edifício Solaris, onde a família Lula da Silva tem apartamento, ficou pronto em dezembro do ano passado. A reforma do apartamento 164 é tocada por seu filho Lulinha, segundo funcionários do edifício, e foi vistoriada por dona Marisa o tempo todo. Ela mesmo providenciou a decoração do local, visitado por Lula apenas três vezes.

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A família Lula construiu um elevador privativo para levá-los do 16º ao 18º, que no projeto original tinha apenas escadas internas. Lulinha usou também parte do quarto de empregada e um canto da sala para fazer um escritório. Mandou também colocar porcelanato em tudo. A cobertura com piscina também recebeu uma boa área gourmet.

Na declaração de bens do ex-presidente em 2006, quando disputou a reeleição, ele confirmava ter pago naquele ano R$ 47.695,38 à Bancoop pelo apartamento do Guarujá. As obras no prédio de Lula só terminaram porque a empreiteira OAS foi contratada por João Vaccari Neto, ex-presidente da Bancoop até 2010, para concluir o projeto. Para a OAS terminar o prédio de Lula, cada morador teve que pagar um adicional de R$ 120 mil. O apartamento de Lula, de 297 m2, no 16º andar, beira-mar, é avaliado pela Imobiliária Factual, que ainda vende apartamentos no local, por algo entre R$ 1,5 milhão e R$ 1,8 milhão.

A assessoria de Lula afirma que o imóvel está declarado. “O ex-presidente informou que o imóvel, adquirido ainda na planta, e pago em prestações ao longo de anos, consta na sua declaração pública de bens como candidato em 2006”.

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Enquanto Lula já pode desfrutar do triplex, mais de três mil famílias associadas à Bancoop não conseguiram o tão sonhado apartamento comprado no início dos anos 2000. A cooperativa dos bancários levantou 57 empreendimentos, mas 14 estão inacabados. Cinco mil famílias já receberam seus apartamentos.

— O João Vaccari Neto, que está sendo processado por estelionato, é o responsável por esse pesadelo dos associados da cooperativa dos bancários. O mínimo que pode lhe acontecer é a cadeia — diz Marcos Sérgio Migliaccio, presidente da Associação das Vítimas da Bancoop, que esta semana entregou ao Ministério Público Federal (MPF) um documento relacionando o caso Bancoop com a Lava-Jato.

A “cooperativa habitacional dos companheiros do PT”, como a Bancoop é chamada por adversários, foi fundada em 1996 tendo o ministro das Relações Institucionais do governo Dilma Rousseff, Ricardo Berzoini, como diretor técnico, e João Vaccari Neto como diretor do conselho fiscal. Nos anos 2000, passou a ter oito mil associados, dos quais três mil ainda não receberam seus apartamentos. Isso levou João Vaccari Neto a ser denunciado por estelionato, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica.

Por não ter entregue os apartamentos vendidos, a juíza Cristina Ribeiro Leite Balbone Costa, da 5ª Vara Criminal de São Paulo, aceitou no final de 2010, denúncia contra Vaccari. E mandou quebrar o sigilo bancário e fiscal do tesoureiro do PT nos dez anos anteriores à denúncia. Além de Vaccari, foram acusados outros quatro ex-funcionários da Bancoop, entre eles Edson Botelho Fraga, o primeiro funcionário da cooperativa e que foi contratado pelo ministro Berzoini.

Vaccari agora é réu na ação criminal. Embora tenha sido denunciado em 2010, Vaccari não foi localizado para ser "citado" judicialmente, o que só aconteceu no dia 6 de fevereiro do ano passado. O processo ainda não teve uma sentença judicial. O promotor do caso, José Carlos Blat, que fez a denúncia contra Vaccari, acha que uma sentença deverá sair por volta de agosto de 2015, porque ainda segue os ritos processuais.

Na quebra de sigilo de Vaccari e da Bancoop, o promotor conseguiu provas de que, na gestão do ex-tesoureiro do PT, empresas fantasmas foram criadas para interceptar parte dos R$ 460 milhões captados pela cooperativa ao longo dos anos. O promotor Blat estima que a cooperativa deu um prejuízo aos oito mil associados de pelo menos R$ 100 milhões, que teriam ido para o PT e seus dirigentes. Quebrada, a cooperativa deixou uma dívida total no mercado avaliada hoje em R$ 86 milhões. Entre as empresas estavam a Mizu, Germany e Mirante. Quando Vaccari era dirtetor financeiro da Bancoop, a Mizu tinha sede dentro da sede da Bancoop.

— A Bancoop era um verdadeiro balcão de negócios a serviço de uma organização criminosa. Uma arapuca que deixou mais de 3.100 vítimas (os que não receberam os imóveis já pagos há uma década) — diz Blat.

Até Freud Godoy, braço direito de Lula e que chegou a ser citado em 2006 na operação em que petistas foram suspeitos de "comprar" um dossiê contra o ex-ministro da Saúde, José Serra (PSDB), aparece nessa investigação. Depois que a cooperativa teve a quebra de sigilo determinada judicialmente, apareceram pagamentos de R$ 1,5 milhão da Bancoop para Freud Godoy, de 2005 a 2007. Na CPI da Assembleia de São Paulo, aberta para investigar os desvios da cooperativa habitacional, Vaccari disse que contratou Godoy para dar segurança a empreendimentos da Bancoop (Godoy tem uma empresa de segurança armada, que já prestou inclusive serviços à sede nacional do PT).

Nessa CPI da Bancoop, o engenheiro Ricardo Luiz do Carmo disse que, quando as obras da cooperativa começaram, no início dos anos 2000, havia um computo de despesas por empreendimento, mas como a situação começou a sair do controle por volta de 2004, criou-se um “pool” de despesas, unindo os gastos de todos os 57 imóveis em obras, dos quais apenas 20 foram totalmente finalizados.

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— A conta única virou uma bola de neve e tudo virou uma incógnita — disse Carmo à CPI.

O promotor afirma que entre as despesas pagas pela Bancoop houve pagamentos para um centro espírita, para pesque e pague, para um hotel cinco estrelas onde o PT promovia reuniões, e até compra de convites para a Fórmula 1.

Vaccari informou, por meio de sua assessoria, que não iria comentar o assunto porque já deixou a Bancoop há quatro anos e que a cooperativa é que deveria responder. Já a Bancoop diz que “a denúncia contra a Bancoop não procede e não tem fundamento. Isso está sendo demonstrado no processo”. (Colaborou Cleide Carvalho)

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Luiz Pádua
Enviado por Luiz Pádua em 09/12/2014
Reeditado em 09/12/2014
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