O Brasil em acelerado processo de "enmerdacimento".
O Brasil em processo de acelerado “enmerdacimento”.
Eurico de Andrade Neves Borba
“As horas perderam seu relógio...”
(Vicente Huidobro, poeta chileno, 1893/1948)
Não me agrada usar palavras chulas, aquelas palavras que até pouco tempo atrás eram chamadas de palavrões. Mas não me ocorre, na ânsia de transmitir com clareza o que me vai à mente, com cada vez com maior intensidade e convencimento, é a idéia de que o nosso querido Brasil está se transformando num país de merda.
O que mais me preocupa, (e me deixa profundamente infeliz), é a minha progressiva desconfiança de que esse processo já pode ter se transformado em algo social e politicamente irreversível, haja vista a extensão e a profundidade do processo de “enmerdacimento’ que, hoje, permeia todos os setores da nossa sociedade.
Uma palavra, uma pequena frase pode resumir, com imediata compreensão o que se quer dizer, mesmo que seja grosseira, substituindo extensos relatórios analíticos que, muitas vezes, afastam os leitores desacostumados de pesquisas mais cuidadosas sobre a real situação do país.
Não quero viver nessa situação indigna, nem minha família. Tenho a certeza de que milhões de brasileiros também a rejeitam. Para superar tal processo o povo brasileiro tem a obrigação moral de fazer alguma coisa, independente dos partidos políticos e das atuais lideranças que não representam nada – apenas interesses de grupos que almejam o poder. Vamos nos unir e tentar. Não vamos ficar inertes assistindo a catástrofe nacional.
Perdemos, creio eu, o nosso momento histórico de poder reagir às mazelas do subdesenvolvimento, no seu sentido mais amplo, e de nos transformar num país com que um dia sonhamos: um movimento nacional denso no rumo ao encontro de um grande destino: democracia, liberdade, justiça social, desenvolvimento integral, paz e solidariedade, com alta densidade ética presidindo a vida coletiva. Estes momentos ocorreram, no meu entendimento, no governo do Presidente Juscelino Kubitschek e no instante da eleição do Presidente Tancredo Neves – naqueles instantes, sentia-se isso - a nação foi como que possuída de orgulho e determinação de participar da construção de um novo Brasil. Depois foi só um descer a ladeira da desilusão e do desanimo, com raros espasmos de recuperação da dignidade da nação ultrajada e traída, com a implantação exitosa do Plano Real e com o julgamento do “mensalão” pelo Supremo Tribunal Federal.
Percebo, com angustia e muita raiva, que os cidadãos que refletem e analisam criticamente o que está ocorrendo, (e não são muitos), pouco ou nada podem fazer de efetivo para mudar o rumo dos acontecimentos – e lá vamos nós, o povo brasileiro, rumo à merda total e definitiva.
O cansaço e a covardia da maioria do povo imperam sobre o dia a dia da nação brasileira fazendo-nos coniventes com o processo de contínua desmoralização e responsáveis pela atual situação de catástrofe.
Cansaço de reagir aos fatos nitidamente errados na condução da vida coletiva, pela descrença na possibilidade de superarmos a atual conjuntura e pela sensação dos riscos de novas desilusões, além das dificuldades do difícil trabalho de organizar o povo, em todos os rincões do país, para, nas ruas e no voto, fazer reverter a atual trágica situação.
Covardia de divulgar e defender valores morais, que a maioria da população ainda acredita, mas dominada pelo pensamento do “politicamente correto”, divulgado pelos meios de comunicação e pelo sistema educacional de baixíssima qualidade, nada fazem. Domina a idéia de que é assim mesmo que caminha a humanidade... Propala-se como verdade moral e social, modernas, a atual pratica social de conduta. Corrupção sempre existiu – a questão é não ser pego em flagrante... Liberdade é cada um determinar qual a moral que mais lhe convém para que, no ambiente de generalizado individualismo egoísta, possa o povo escolher o estilo de vida mais adequado para a realização pessoal. A maioria, com certeza, repudia o que vê, mas esconde-se no silêncio, retrai-se no imobilismo cívico, tentando adaptar-se aos “novos tempos”. Assim podem conviver cinicamente, sem conflitos e discussões, com a família, com os amigos, com os colegas de trabalho e vizinhos. Assim procedendo não serão excluídos dos grupos a que pertencem por serem considerados conservadores retrógados, “chatos”, desajustados às imposições da modernidade. É bom participar de grupos sociais expressivos – que oferecem a segurança de aceitação e de consideração pelo que se pensa. É penoso fazer parte de grupos menores que defendem idéias e valores diferentes do pensamento dominante – é preciso fé no que se acredita e coragem para defender formas de pensar e de agir destoante daquilo que é considerado, pelo “povão”, como moderno, mesmo que sejam conceitos evidentemente errados, lógica, histórica e moralmente.
Certamente a classe dominante, aquela que detém a maior parte da riqueza do país, move-se com inteligência para manter seus privilégios e suas formas de dominação política. O sistema liberal capitalista sabe muito bem assimilar e superar movimentos de oposição e continuar, com algumas poucas concessões, a dominar as sociedades, onde os donos do poder e os beneficiários do sistema que os apóiam continuem a usufruir do progresso e das benesses da modernidade. O resto da população, marginalizados do poder, são contidos ou pela polícia, ou pela própria estrutura sócio política adotada pela sociedade, ou pela mídia que hábil e facilmente constrói as formas de pensar e de agir, uma vez que opera sobre uma população com péssima formação cultural, impedindo criticas contundentes ao que é oferecido pela publicidade como verdades absolutas, sejam produtos, serviços ou candidatos políticos.
Os trabalhadores estão sem rumo, os sindicatos não sabem o que reivindicar em face das intimas interligações dos sistemas político, produtivo, financeiro e publicitário, que sempre tem explicações “científicas” para não conceder reajustes salariais, benefícios justos como planos de saúde e alimentação, ou então o pior: a permanente ameaça de demissão. Em 2012 escrevi um livro publicado pela Edições Loyola – “ Posto de Trabalho: propriedade privada do trabalhador”. O título da obra resume o seu conteúdo. Não é uma reinvenção socialista: é uma tentativa de utilizar, para o momento atual, os ensinamentos da Doutrina Social da Igreja Católica. Poucos a conhecem, inclusive muitos religiosos e religiosas nunca dela tiveram notícia. Trata-se de um notável repositório de imensa e diversificada reflexão sobre a natural dignidade da pessoa humana na sua dimensão social, suas exigências e potencialidades. Poucos a leram. Aliás, neste nosso Brasil, pouco se lê, pouco se debate, pouco se reflete sobre questões sociais, políticas, econômicas e éticas. O resultado desta apatia aí está: empresários e banqueiros, espertos e inteligentes, manipulam a sociedade através dos políticos e da mídia, financiando ou corrompendo expressivas parcelas desses segmentos da sociedade, estabelecendo as regras de organização e de convívio, a seu bel prazer, da maneira que proporcione, sempre, maior lucro para as empresas e bancos, bem como maiores remunerações para os seus dirigentes.
Conviver num sistema, numa sociedade de merda facilita a opressão e a dominação – muitos até que se satisfazem com a “esculhambação” sócio política, com o deboche generalizado, com a falta de referenciais éticos sólidos e perenes, com a corrupção generalizada, com a violência, com as drogas, com a indisciplina social, achando que participando deste quadro caótico estão a exercer seus direitos, na expectativa de mal delineados e indefinidos melhores dias. Não é difícil iludir o “povão”- basta ser canalha, irresponsável, demagogo, e fornecer algumas melhorias sociais, prometer outras e ir levando... Eleições de vez em quando, consentimento oficial para a realização de algumas passeatas e greves, aumentos salariais irrisórios que ampliam a distancia entre os mais ricos, (os que dominam e efetivamente mandam), e os mais pobres, (os que apenas sobrevivem), algumas inaugurações de hospitais, algumas prisões dos bandidos mais notórios, algumas melhorias no sistema de transportes, alguns conjuntos habitacionais, satisfazem as multidões mais humildes que têm muito pouco e aceitam essas pequenas e furtivas alegrias como momentos em que se imaginam possuídos do sentimento de participação nas decisões políticas maiores, tornando-se, então, cidadãos por alguns instantes.
Talvez muitos dos que estão a ler este trabalho não tenham tido conhecimento do livro, recentemente lançado na França – “O Capital no sec. XXI”, da autoria do economista Thomas Piketty. Os pensadores sociais estão considerando a obra citada como uma das mais importantes contribuições para a compreensão da economia e da dinâmica das sociedades. É um livro brilhante. Este artigo não comporta uma análise do pensamento de Pikertty mais elaborada, apenas uma notícia. Não entrarei tão pouco nas criticas metodológicas, importantes, que estão surgindo sobre a análise estatística utilizada por um grupo de excelentes colaboradores do professor francês. A revista Economist analisa o livro, considerando a obra como interessante estudo, onde o autor aponta, basicamente, o aprofundamento do fosso entre os mais ricos do mundo e os mais pobres. Diz a conhecida revista inglesa que Piketty “é o Marx do sec. XXI...”. Na verdade o economista francês abala um dos mais caros princípios do capitalismo, qual seja a justificativa das altas remunerações e ganhos dos empreendedores capitalistas, como prêmio pela inventividade e riscos que correm com seus empreendimentos. Para o pensador francês, que adota esta tese e a aprofunda, afirmando que a concentração de renda faz parte da lógica do capitalismo, tornando-se, assim, uma ameaça à democracia pois aumenta a desigualdade entre os cidadãos no médio e longo prazos. Prega que uma das soluções para esse problema é a taxação das grandes fortunas, o que de imediato foi rechaçado com a acusação de ser esta proposição uma volta ao pensamento comunista. O premio Nobel de Economia, Paul Krugmam, insuspeito de ser um “pensador vermelho”, em artigo publicado no prestigioso jornal New York Times, aplaude o trabalho de Thomas Pikertty e afirma sobre o que discorríamos: “Mas como fazer essa defesa se os ricos derivam boa parte de suas rendas não do trabalho que fazem mas dos ativos que controlam? E que fazer se a grande riqueza cada vez mais estiver relacionada a heranças e não ao espírito empreendedor? Não tenham duvidas de que a velha questão está de novo colocada para o debate. O lastimável é que os políticos, que deveriam conduzir a elaboração de leis que providenciassem uma justa tributação progressiva das grandes fortunas, estão “por fora, ou o pior - “estão por dentro” das folhas de pagamento dos grandes capitalistas e não farão nada contra os interesses dos seus patrões. A esperança de que leis cada vez mais justas, elaboradas em sociedades democráticas, providenciassem, pouco a pouco, uma melhor redistribuição da renda gerada, devidamente tributadas, não se realizou a não ser em pequena parte. O resultado dessas arrecadações deveriam ser destinadas para a adoção de sistemas educacionais de qualidades, saúde publica decente, seguridade social e aposentadorias dignas, sistemas de transportes públicos eficientes, fatos esses que dariam o necessário suporte para a manutenção de um processo de desenvolvimento sustentado. Isso não se concretizou pela simples razão de que políticos, irresponsáveis ou corruptos, não votam leis contra os interesses dos seus grandes financiadores, aqueles que os perpetuam no poder – as grandes fortunas e os detentores de altíssimos salários.
O “povão” é um joguete na mão da classe dominante - desrespeitados na sua condição humana e de cidadãos. São usados como justificativas de políticas econômicas e sociais apenas nominais, sem efetiva concretização na história do país. Olhemos para o que foi propalado e prometido, pelos políticos demagogos, nos últimos cinqüenta anos e verifiquemos o que foi efetivamente realizado: educação de qualidade, rede de saúde publica eficiente, transporte publico eficaz, moradia popular decente, saneamento básico de qualidade, reforma agrária apropriada, estabilidade monetária, segurança publica efetiva.
Evidente que algumas coisas boas foram feitas, mas os erros estruturais permanecem e os governos, para evitar situações desesperadas que podem gerar conflitos e confrontações graves, corre para atender emergências em cada setor, os mais graves, sem nunca atingir o âmago da questão com soluções definitivas para os grandes problemas brasileiros que se perpetuam. Quando se trata de averiguar o que está sendo feito com a vida intelectual da nação, com a nossa cultura, o desastre é igual: um povo que prossegue, na sua marcha histórica, sem desenvolver seu espírito crítico, sem se preparar tecnicamente para as exigências de uma economia moderna, sem dispor de informações confiáveis sobre o que realmente está acontecendo no Brasil e no mundo, sem desfrutar dos prazeres estéticos da nossa musica, teatro, pintura, dança. Então, com essa lamentável visão critica, podemos concluir que este é um país de merda.
A imprensa, com raras exceções, diz e divulga o que os grandes anunciantes – os que financiam esse sistema iníquo – e os donos de jornais, rádios e televisões querem, (não poderia ser diferente, pois são expoentes da classe dominante...). Os programas apresentados são, quase todos, de uma grosseria, de uma vulgaridade, inacreditáveis. Os responsáveis por este crime contra o povo e principalmente contra a juventude, que tem na mídia o grande professor que ensina como se deve falar, proceder, pensar, tornando-se, assim, também vulgar, grosseira, debochada, violenta e egoísta, sem conhecimentos maiores que possibilitem apreender os ensinamentos históricos, científicos e éticos, capazes de orientarem suas vidas em formação, para patamares mais elevados de convivência humana, de felicidade pessoal, de participação política critica e responsável e de respeito pelos demais concidadãos.
É importante saber, no entanto, que apesar das graves falhas da mídia é por intermédio dela que o povo tem acesso aos grandes escândalos da corrupção, da violência, bem como é informado sobre os principais acontecimentos do país e do mundo. São brechas milagrosas que se abrem no sistema, de tempos em tempos, e que são aproveitadas por alguns honestos repórteres e chefes de redação para bem informar a população. Por essa razão que quaisquer censuras ou limitações da liberdade de imprensa devem ser evitadas. Muito do se fez de moralização no Brasil partiu das denuncias e reportagens da mídia, em suas várias formas de manifestação, pela iniciativa e coragem desses jornalistas que ousaram romper com os ditames do sistema dominante e cumprirem sua importante função de informar com correção. Devemos ter esperanças e confiar na capacidade da autocrítica dos donos e redatores da mídia que reconhecendo a importância que têm no processo democrático – realmente o quarto poder - abandonem a vulgaridade, a grosseria, a divulgação da violência, propiciando à população, de todas as idades e classes sociais, informações honestas, diversão e programas de nível compatível com o respeito merecido pelas pessoas, famílias e o povo.
É de se prestar cada vez mais atenção para o papel político e social que a internet pode vir a desempenhar. Hoje já é um poderoso instrumento de pesquisa, de estudo e de comunicação entre as pessoas e os povos. Amanhã poderá se transformar, também, em instrumento de participação política, aperfeiçoando as formas tradicionais de democracia representativa, complementado-a pela democracia participativa, com cada vez maior intensidade. Esse momento histórico futuro em muito dependerá do nível de escolaridade da população, bem como do nível de honestidade e de responsabilidade da mídia com vistas à manutenção de uma população bem informada. Tenho a certeza de que se essa idéia, hoje ainda é um sonho, amanhã será uma proposta vencedora. O que se está fazendo hoje no Brasil para que a maioria da população tenha acesso à internet e dela possa extrair toda a sua potencialidade de estudos gerais, pesquisas, informação e comunicação? Verifico, com preocupação, que a juventude a que à internet tem acesso, (ainda uma minoria), está muito mais interessada em jogos, diálogos geralmente fúteis, (“use no máximo 140 toques...”), pornografia, do que um uso mais sofisticado intelectualmente: - para muitos ainda é um passa tempo, apenas um divertimento interessante.
Quanto ao meio ambiente muito se fala, mas não se exige dos políticos e dos empresários, uma atitude preservação competente e conseqüente, do uso inteligente do ambiente que se deteriora rapidamente, com nefastas conseqüências, por exemplo, para o abastecimento de água potável, para o clima, para a manutenção do estoque genético que milhões de anos de evolução nos legaram, com animais e plantas, um patrimônio dos povos para o conhecimento do milagre da vida e do prosseguimento da história da humanidade em ambiente propício, auto-sustentável e saudável. Poucos reconhecem que se continuarmos a destruir o meio ambiente, como estamos fazendo, a vida humana em alguns poucos séculos correrá o riso de sobrevivência. E lá se vão as arvores da nossa Amazônia, a Mata Atlântica quase extinta, o cerrado sob a mira do agronegócio começa a padecer com os efeitos de um uso não planejado, na perspectiva da sustentabilidade. E os nossos políticos o que fazem? A população não sabe ou não está interessada sobre esses assuntos que tanto interessam ao futuro dos nossos netos...
As relações internacionais são conduzidas, cada vez mais, com uma acentuada falta de objetivos claros a serem alcançados, não só na defesa dos nossos interesses, mas, principalmente, da nossa afirmação no concerto das nações como protagonista que tem muito a contribuir para a paz, o convívio e o desenvolvimento equilibrado dos povos. A omissão de opinar e de defender posições morais passou a ser a regra da nossa ação diplomática nos últimos anos – deixar passar o tempo sem que o Brasil se comprometa com nenhuma questão importante. Lidar com nossos parceiros internacionais, com a regra saudável - mas que tem limites - da não intervenção nos assuntos internos de outros países é conduta fácil: nos dias de hoje não podemos apoiar, pelo silêncio, ditaduras escancaradas que oprimem seus povos, que censuram a mídia, que prendem e torturam seus opositores. Esta atitude da nossa diplomacia é ultrajante às nossas tradições. Só para recordar acontecimentos bem recentes, fiquemos com a enumeração da covarde omissão sobre a revolta na Síria; a falta de apoio a Israel, com o qual estamos comprometidos desde sua criação em 1948, (com a brilhante e corajosa participação de Osvaldo Aranha que contrariando interesses, colocou em votação, como Presidente da Assembléia da ONU, a declaração de criação do Estado Judeu, que esperava nas gavetas há meses); a omissão no atentado que abateu, recentemente, avião da “Malásia Airlines”, sobejamente conhecida a responsabilidade russa no escandaloso atentado; o silêncio quanto aos atentados aos direitos humanos praticados pelo ridículo governo “bolivariano” da Venezuela; a audácia boliviana de ocupar de forma truculenta instalações da Petrobras, ficando sem resposta das nossas autoridades; e a permanente visível hostilidade e má-vontade contra tudo o que é norte americano. Saudades de antigos diplomadas que não se curvavam às ideologias passageiras, porventura em postos de mando no governo, quando o Itamaraty sabia que seu papel é o de manter a dignidade e coerência históricas, que sempre tivemos, na lide internacional de defesa dos nossos direitos e do pensamento jurídico sobre os princípios que devem presidir as relações entre as nações livres e soberanas. Saudades do desassombro de um Barão de Penedo ao confrontar o governo Inglês, no final do Império, com independência, responsabilidade e altivez; de um Rui Barbosa ao defender em Haia, com sucesso, a tese da igualdade jurídica das nações; de um Barão do Rio Branco fixando a política de sempre arbitramentos na solução dos problemas surgidos com as demarcações das nossas fronteiras; de um Osvaldo Aranha confrontando o nazifascismo; de um Afonso Arinos de Mello e Franco, com sua inteligência fulgurante sempre na defesa da democracia e da liberdade. É triste perceber como adotamos a política da omissão, assumindo posições subalternas num momento histórico que exige posições claras e inteligentes, visando o futuro e a paz – não a subserviência a motivações passageiras de uma conjuntura política interna que tende a desaparecer em breve: a da incompetência e da corrupção.
Ocorreu-me escrever este trabalho, com este título aparentemente apelativo, quando li nos jornais que um ex-governador do Distrito Federal é novamente candidato a governador de Brasília, apesar de já condenado pela Justiça, em segunda instância, por roubo. Utilizando-se de prazos judiciais, não foi impedido pela Lei da “ficha limpa”, por ocasião do seu registro como candidato, e é o mais cotado, nas pesquisas, a ser o vencedor com mais de 60% dos votos do eleitorado da capital federal. É inacreditável, é o fim das esperanças perceber a existência de um eleitorado tão irresponsável, capaz de eleger, com ampla votação, um ladrão para a governança de Brasília.
O outro fato, também noticiado pela imprensa, foi a consagração de alianças políticas, nos vários estados da federação, onde os partidos, como verdadeiros balcões de negócio que são, associaram-se a outros em direta e completa oposição ao que os mesmos fazem, pensam e pregam. É um jogo de interesses locais sem a mínima preocupação com a decência e a lógica do processo eleitoral, que pressupõe que partidos nacionais devem ter uma atitude única em todos os estados, apoiando ou coligando-se com outras agremiações políticas com as quais tenham alguma afinidade, demonstrando coerência, honestidade e intenção clara de respeitar programas e ideologias políticas que os definem. Não a esta bagunça canalha que abastarda e falseia o processo democrático, enganando os eleitores, principalmente os mais humildes, que são a maioria, e que elegem os candidatos que se apresentam com tibieza de pensamento e desonestidade na ação de conquistar os votos do povo.
Não vou me deter em outros fatos que enojam, causando profundo mal estar físico e mental e que são de conhecimento geral, noticiados diariamente pela mídia: a corrupção generalizada, (tanto na área estatal como na iniciativa particular); a violência; o tráfico de drogas; o deboche institucionalizado nos programas de rádio e de televisão, onde nossas próprias desgraças são motivo de comicidade chula; a falta de educação e de mínima cortesia nas relações da vida cotidiana; o fracasso do processo educacional como um todo; a desagregação da família; o abandono dos valores morais consagrados pelas religiões históricas como se fossem estorvos à liberdade, à felicidade pessoal, à liberdade do povo e não os alicerces da vida civilizada em sociedade.
Basta. É preciso reagir de alguma forma. Por isso escrevi este artigo, que já se faz longo.
Quando no ano passado, em 2012, lancei o meu livro, (acima indicado), prestei homenagem a um cidadão francês, Stéphane Hessel, que em 2010 havia publicado um pequeno livro que causara e estava causando grande impacto na França e em vários outros países. “Indignez vous”. (Indignai-vos,) é o nome da obra. Hoje transcrevo, aqui neste trabalho, o que escrevi no início do meu livro citado: “ Com 19 páginas, das quais 13 são de texto, foi lançado por uma pequena editora – a Indìgene Editions. O autor, um senhor com 93 anos de idade, judeu, ex-participante da Resistência Francesa na segunda guerra mundial, ex-prisioneiro do campo de concentração do campo de concentração de Buchenwald, participou da elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos como membro da delegação francesa na fundação das Nações Unidas, (19480, depois viveu sua vida de pacato cidadão, mas sempre atento ao seu tempo. Seu nome Stéphane Hessel. Não suportando mais a apatia do povo francês, na defesa e na promoção dos ideais que lhe deram a razão de viver e de lutar em sua juventude, Hessel resolveu escrever um manifesto, que quase não conseguiu publicar pela falta de interesse dos jornais e das grandes editoras. A primeira tiragem do opúsculo foi de 6000 exemplares. Hoje mais de 6 milhões de livrinhos estão sendo publicados e lidos em vários idiomas. Hessel denuncia, com vigor e autoridade moral, a ignorância da população sobre o futuro, a apatia da juventude, que não denuncia as injustiças do mundo, o conluio dos políticos com o poder econômico, a subserviência às leis do mercado e às teses de desregulamentação da economia, a supremacia das questões financeiras nas preocupações governamentais, o abismo que se aprofunda entre os muito ricos e os muito pobres. Que belo manifesto! Denuncia que deveria partir dos trabalhadores e dos jovens, que geralmente estão abertos para as belas causas morais, para a defesa do humanismo ameaçado, mas que surge veemente da garganta angustiada de um cidadão quase centenário, responsável e coerente com o seu passado de lutas em prol da liberdade e da justiça.”
Costumo insistir, nas conversas e debates políticos, com o pressuposto, exposto pelo filosofo inglês Locke, que rege os sistemas democráticos da civilização ocidental desde o sec. XVIII. Esta tese, elaborada no ambiente e no período histórico de definições da democracia, (consolidação da democracia na Inglaterra, as revoluções americana e francesa), é hoje hegemônica em quase todo o mundo e ensina que na divisão dos poderes do Estado “o poder legislativo é o supremo poder”. Nele nascem as leis, nele o povo é representado, nele reside a força do ideal democrático da liberdade e da justiça por força de sua missão de legislar – propiciar as condições de convivência cada vez mais aprimoradas, no seio de uma sociedade democrática de direito. O poder judiciário interpreta e faz cumprir as leis, o poder executivo faz o que tem de fazer para gerir os interesses e necessidades comuns da sociedade, tomando e executando as medidas para a promoção do bem comum, segundo a Constituição e as leis votadas pelo poder legislativo.
É triste verificar que no nosso país este “supremo poder” é composto, na sua maioria, por corruptos, incompetentes, traidores do ideal democrático que, pelas suas ações e votos, deveriam estar aperfeiçoando. São idiotas e canalhas que estão no comando das nações e no nosso Brasil não há duvidas – lá estão eles há décadas, locupletando-se, mantendo iníquas estruturas de poder, desdenhando o povo sofrido que neles confiaram seus votos: - é uma grande merda institucionalizada como forma de governo e de viver.
É importante lembrar alguns nomes, honrados e coerentes, da nossa história política recente que, neste momento, fazem enorme falta, (fiquemos com os já falecidos para não corrermos o risco de esquecer alguns dos poucos heróis que hoje continuam a lutar pelo nosso país, com dignidade e coerência): Raul Pilla, Men de Sá, Franco Montoro, Tancredo Neves, Jose Richa, Mario Covas, Ulysses Guimarães, Carlos Lacerda, Ney Braga, Eduardo Gomes, Juarez Távora, Fernando Ferrari, entre outros. Se já tivemos personagens com esses perfis de dignidade e envergaduras morais por quê não renovar o Congresso Nacional com nomes com a mesma dimensão?
Por que os eleitores não se preocupam mais com a política? Faz poucos dias a nação estava mobilizada com a Copa do Mundo e atenta à seleção brasileira de futebol. Por que não dedicar igual interesse para o que está acontecendo com a política, para com as eleições que vão ocorrer no próximo mês de outubro, debatendo de forma pacífica e inteligente as opções que nos são oferecidas?
Por que os eleitores, mesmos aqueles com alguma formação acadêmica e informação sobre o que se passa no mundo, elegem, há décadas, para o Congresso Nacional e Câmaras Estaduais, uma maioria que abafa, pelo numero dos seus votos, as boas intenções de uma minoria de honestos e competentes, que existem e estão espalhados pelos vários partidos?
Com esta visão os eleitores são, em boa medida, responsáveis pela presente situação. Mesmo enganados e seduzidos pelos “marqueteiros”, muito bem pagos e que vendem com excelentes peças propagandistas, quaisquer produtos, inclusive candidatos, o povo poderia se organizar e se informar, e pelo voto – a maneira de se proceder a uma revolução democrática – varrer do cenário político este bando que nos arruína como nação e nos humilha como seres humanos naturalmente dignos. Essa tragédia não é um privilégio do Brasil – está acontecendo em todo o planeta.
Ficaria muito feliz se expressiva parcela da omissa intelectualidade brasileira, bem como os cidadãos e cidadãs que apreciam e cultivam a boa e correta informação, lessem o recente livro do grande escritor peruano, Mario Vargas Llosa, que escreveu uma obra, pouco divulgada e lida, (que substituiria pela sua erudição e atualidade este meu trabalho, com grande vantagem e ganhos para os leitores): “A civilização do espetáculo”, (Editora Objetiva, 2012). Nele Vargas Llosa desenvolve, com ampla citação de autores outros, a correta tese de que, hoje, mais vale a imagem oferecida pela mídia, em espetáculos e escritos leves, superficiais e ligeiros, do que a reflexão cuidadosa e densa dos autores responsáveis, artistas e intelectuais verdadeiros. Assim sendo o povo, como um todo, vai se afastando das fontes poderosas do saber do Ocidente e passa a se satisfazer com a mediocridade de uma falsa cultura e conhecimento. Podem até ser, e muitos o são, excelentes técnicos em suas profissões, mas não sabem nada, ou muito pouco, dos fundamentos culturais mais amplos que séculos de história nos oferecem como alicerces da cidadania democrática e do aperfeiçoamento da vida interior de homens e mulheres, que ainda se indagam, a cada instante, sobre o sentido da existência, da origem das sociedades, da importância das religiões, da reflexão filosófica, das maravilhas da arte como expressão maior do Humanismo e do viver civilizado.
Não resisto transcrever algumas passagens do livro citado, do excelente pensador que é Vargas Llosa: “... A diferença essencial entre a cultura do passado e do entretenimento de hoje é que os produtos daquela pretendiam transcender o tempo presente, durar, continuar vivos nas gerações futuras, ao passo que o produto deste são fabricados para serem consumidos no momento e desaparecer, tal como biscoitos ou pipoca. Tolstoi, Thomas Mann e ainda Joyce e Faulkner escreviam livros para derrotar a morte, Sobreviver a seus autores, continuar atraindo e fascinando leitores nos tempos futuros. As telenovelas brasileiras e os filmes de Hollywood, assim como os shows de Shakira, não pretendem durar mais que o tempo da apresentação, desaparecendo para dar espaço a outros programas igualmente bem sucedidos e efêmeros. Cultura é diversão, e o que não é divertido não é cultura. ... Para essa nova cultura são essenciais a produção industrial e o sucesso comercial. A distinção entre preço e valor se apagou, ambos agora são um só, tendo o primeiro absorvido e anulado o segundo. É bom o que tem sucesso e é vendido; mau o que fracassa e não conquista o publico. O único valor é o comercial. O desaparecimento da velha cultura implicou o desaparecimento do velho conceito de valor. O único valor existente é o agora fixado pelo mercado.(Obra citada. Pg 27). “ Claudio Péres, enviado especial de El País a Nova York para informar sobre a crise financeira,escreveu na sua crônica de 19 de novembro de 2008:’ os tablóides de Nova York estão como loucos em busca de um corretor da Bolsa que se atire no vazio do alto de algum dos imponentes arranha-céus que abrigam os grandes bancos de investimento, ídolos caídos que o furacão financeiro está transformando em cinzas’. Vamos reter por um momento esta imagem na memória: uma multidão de fotógrafos, de paparazzi, espreitando as alturas, com as câmaras prontas, para captar o primeiro suicida que encarne de maneira gráfica, dramática e espetacular hecatombe financeira que fez evaporar bilhões de dólares e mergulhou na ruína grandes empresas e inúmeros cidadãos. Não creio que haja imagem melhor que resuma a civilização de que fazemos parte”. (obra citada pg. 29). “ O que quer dizer civilização do espetáculo? É a civilização de um mundo onde o primeiro lugar na tabela de valores vigente é ocupado pelo entretenimento, onde divertir-se, escapar do tédio,é a paixão universal. Esse ideal de vida é perfeitamente legítimo, sem dúvida. Só um puritano fanático poderia reprovar os membros de uma sociedade que quisessem dar descontração, relaxamento, humor e diversão a vidas geralmente enquadradas em rotinas deprimentes e às vezes imbecilizantes. Mas transformar em valor supremo essa propensão natural a divertir-se tem conseqüências inesperadas: banalização da cultura, generalização da frivolidade e, no capo da informação, a proliferação do jornalismo irresponsável, da bisbilhotice e do escândalo”.(obra citada pags 29/30). “... O vazio deixado pela crítica possibilitou que, insensivelmente, a publicidade o preenchesse e se transformasse atualmente não só em parte constitutiva da vida cultural, como também seu vetor determinante. A publicidade exerce influência decisiva sobre os gostos, a sensibilidade, a imaginação e os costumes.A função antes desempenhada, nesse âmbito, por sistemas filosóficos, crenças religiosas, ideologias e doutrinas, bem como por aqueles mentores que na França eram conhecidos como os mandarins de uma época, hoje é exercida pelos anônimos ‘diretores de criação’ das agências publicitárias. ... Quando a cultura relega o exercício de pensar ao desvão das coisas fora de moda e substitui idéias por imagens, os produtos literários e artísticos são promovidos, aceitos ou rejeitados pelas técnicas publicitárias e pelos reflexos condicionados por um publico que carece de defesas intelectuais e sensíveis para detectar os contrabandos e extorsões de que é vitima’.(obra citada, pgs33/34).
Se quisermos uma revolução democrática temos a obrigação moral de fazer desaparecer, pelo voto, os omissos, os incompetentes e os corruptos que se apossaram do país e eleger os melhores, rostos novos, idéias novas capazes de resgatar o Brasil do atoleiro em que se meteu nestas ultimas décadas. Não estou fazendo propaganda deste ou daquele partido político – fico pasmo de vergonha de saber que meu país tem 32 partidos. Isto não existe, isto é uma farsa, isto é a consagração da tese de que essas agremiações são balcões de negócio à procura de oportunidades para vender minutos de propaganda eleitoral, nos períodos pré eleitorais em que é gratuita, com as alianças vergonhosas que fazem. Existem bons e excelentes cidadãos e cidadãs, em todos os partidos, verdadeiros heróis que se esforçam para fazer o melhor, que adotam com honestidade uma filosofia política com determinação, mas que são abafados nas suas intenções pela turba majoritária, do omissos ou corruptos, que só quer saber como aproveitar as ocasiões de eleição para ganharem alguma coisa a mais, enriquecendo seus patrimônios e aumentando suas parcelas de poder sobre a sociedade.
Quando ingressei na universidade, a PUC RIO, na antiga Escola de Sociologia e Política, em 1962, na cadeira de sociologia, estudávamos o livro do notável sacerdote jesuíta e sociólogo, o Pe. Fernando Bastos de Ávila S.J. uma obra excelente de “Introdução à Sociologia, (Agir Editora, 1962)”. Ao referir-se à personalidade sociológica como conceito sociológico, afirma o autor: “Esta é a configuração psicológica particular própria aos membros de uma determinada sociedade, que se manifesta por um estilo de vida no qual os indivíduos inserem suas variantes singulares. O conjunto das características que compõem essa configuração merece o nome de personalidade de base, não porque constitua exatamente uma personalidade, mas porque constitui a base da personalidade para os membros do grupo. Enfim é aquilo, porque o francês é francês, e o brasileiro é brasileiro”, (obra citada, pg 92). Logo a seguir indaga: “Tem o Brasil uma personalidade de base, comum a toda variedade de nosso arquipélago cultural? Cita, então, palestra do professor Alceu Amoroso Lima, pensador católico, crítico literário, que exerceu grande influencia sobre a intelectualidade brasileira por mais de cinco décadas de continuas publicações, palestras e artigos em jornais: “Elementos Constitutivos da Nacionalidade”, (conferência realizada no Instituto de Estudos Políticos e Sociais da PUC RIO, 1957, mimeografada). Certamente o professor Alceu aperfeiçoaria hoje o que disse há mais de cinqüenta anos, atualizando e expandindo suas observações extremamente corretas para a época e que já apontavam o campo fértil que se estava preparando, nos anos de 1950, para a instalação do trágico panorama que hoje vivemos. Apontava Alceu Amoroso Lima as seguintes principais características do povo brasileiro, não como criticas morais, mas como observações inteligentes de um privilegiado e competente observador do cenário nacional: “o primado do sentimento sobre a razão; o primado do teórico sobre o prático; a primazia da improvisação sobre a planificação; a primazia do talento sobre o esforço; a primazia do individualismo sobre o senso comunitário e a primazia do efeito sobre o valor em si”, (obra citada, pgs 93/94/).
Certamente que esses aspectos da realidade da personalidade sociológica do povo brasileiro, detectados nos anos de 1950, bem adequados a um país que vivia na periferia do mundo desenvolvido, poderiam ter sido alterados e corrigidos na perspectiva das exigências do mundo moderno, que se delineava. Se isso tivesse sido providenciado, com continuidade e persistência política, honesta e inteligente, hoje viveríamos outra situação social, econômica e política, muito diferente do atual quadro de desfazimento de sonhos e de aceitação do processo que denomino de “enmerdacimento” da nação.
O grande mal, desde o Império, foi nunca termos buscado a excelência do processo educacional para todo o povo. O grande erro foi termos feito vistas grossas à corrupção que se instalava. A desgraça nacional que se abateu sobre nós resultou do abastardamento da política, pela contínua eleição de uma maioria de corruptos, demagogos e incompetentes, nos sucessivos governos e legislaturas, impedindo que o Brasil alçasse os patamares de desenvolvimento integral e de convivência democrática, com que sonharam os nossos antepassados.
Onde estão as vozes de protesto e de alerta da intelectualidade brasileira, grupo de referência de qualquer nação, cada vez mais reduzido em relação ao total da população? Onde está a nova liderança política capaz de oferecer à uma juventude desamparada e desorientada propostas democráticas de organização e de funcionamento da vida coletiva? Com o fim da experiência comunista, o socialismo real, além do eficiente, amoral e muitas vezes injusto capitalismo, parece que não existe alternativa para a vida coletiva, mais humana, que se possa apresentar para as populações.
Onde estão as universidades com seus professores e alunos, pretensamente bem formados e capazes de formularem alternativas democráticas para a crise global que nos assola e ameaça nosso futuro? Estão caladas e afastadas dos reais problemas da sociedade. Uma lastima, uma vergonha histórica, essa omissão da academia.
Não receio grandes convulsões sociais, uma guerra civil – acredito que, no máximo, ficaremos com essas freqüentes passeatas truculentas, com os chamados “Black blocs” com seus capuzes negros, bandidos idiotas, que com o incêndio de ônibus, quebrando vitrines e tentando invadir prédios públicos e da iniciativa privada, pensam estar revolucionado o mundo rumo a um destino que nem mesmo eles sabem definir. Os “sem teto” continuarão a atuar, todos eles sem reivindicações concretas e exeqüíveis, capazes de contribuírem para a melhoria da situação nacional. Nestes momentos de bagunça a policia, e em alguns casos mais graves também as Forças Armadas, com maior ou menor eficiência, usando da necessária reação legal, restaurarão a ordem e os prejuízos materiais, como sempre, serão absorvidos pelos governos estaduais e o federal, com os empresários tentando o ressarcimento das suas perdas e tudo continuará igual. Esta acomodação, esta pasmaceira nacional é que me preocupa, pois, como já afirmei anteriormente, só pelo voto e com a eleição de bons candidatos é que poderemos começar a pensar em salvar o Brasil desse processo de progressivo “enmerdacimento” da nação, resgatando nossa dignidade e decência social.
Liberdade sem regras e limites, concorrência – cada um por si e que vençam os melhores e mais espertos - individualismo, egoísmo, são as grandes propostas políticas oferecidas pelo liberal capitalismo, já assimiladas e admiradas pela maioria dos povos, como sendo o sistema político vencedor. Neste ambiente desnorteado, sem pressupostos filosóficos, claros e estáveis, capazes de servirem de referência para a tomada de posições políticas, os cidadãos e cidadãs parecem agir ao sabor dos sempre renovados estímulos dos acontecimentos, sem reflexão crítica, sem clareza dos objetivos sociais futuros que pretendem alcançar. Quaisquer discordâncias ou censuras são entendidas como restrições à liberdade, retrocesso ou conservadorismo. Falta de ética é uma sentença elegante que se usa para acusar e condenar pessoas que foram flagradas cometendo crimes e foram denunciadas pela mídia - não indica mais a adesão individual radical a alguns valores morais que aprimoram a vida humana, fazendo com que o viver se aproxime do ideal pretendido pelo Deus Criador do Cosmos.
Os jovens, os povos, não têm mais com o que sonhar, propor ou lutar para tornar o viver coletivo mais humano...
Os políticos, os partidos políticos falharam, miseravelmente, nesta sagrada missão.
Nós todos, o povo brasileiro, somos responsáveis pelo futuro. Não podemos e não devemos nos contentar com a inação. Revolucionar a política brasileira, principalmente renovando o Congresso Nacional com uma maioria de senadores e deputados dignos, competentes, é nossa obrigação histórica. Não podemos nos furtar a este trabalho cívico que visa à promoção do bem comum.
Não quero perder a esperança de ainda ver a sociedade brasileira envolvida por um ambiente de alta densidade ética e de sentir que nossas relações sociais são presididas pelo ideal da solidariedade.
Possuído de duvidas, uma vez mais lanço um apelo, uma convocação, que desconfio que se perderá no meio das várias mensagens que as pessoas recebem a cada instante. Mas sinto-me moralmente obrigado a pedir, para que os meus concidadãos, que fiquem atentos ao que está ocorrendo e aproveitem a oportunidade, talvez a ultima, das eleições de outubro próximo e mudem o Brasil, indicando e votando em candidatos dignos, honestos, competentes, em caras novas, que possam nos oferecer, com maior probabilidade, um país mais justo, livre, desenvolvido, pacífico, solidário e democrático.
Não temos muito tempo para reagir à atual situação. Ou fazemos alguma coisa, agora, ou vamos todos nos acostumando com a fecal opção de vivermos na merda...
Ana Rech, agosto de 2014
Eurico de Andrade Neves Borba, 73, aposentado, ex-professor, ex Diretor de Departamento e ex Vice Reitor da PUC RIO; ex Diretor Geral da Escola de Administração Fazendária; ex Secretario Geral Adjunto do Ministério da Educação; ex Diretor Geral e Presidente do IBGE; ex Secretario Executivo da Associação das Mantenedoras de Escolas Católicas; é escritor, mora em Ana Rech (Caxias do Sul, RS).