Uma introdução ao Totalitarismo - Parte II

Em sua obra: Origens do Totalitarismo, Arendt retratou o estabelecimento dos governos totalitários através do apoio das massas. Segundo Arendt (1949 [2009]) o governo totalitário é algo radicalmente novo, diferenciando-se de tiranias, despotismos e ditaduras anteriores. Contudo, para a pensadora o termo totalitarismo deve ser utilizado com bastante cautela, pois se trata de um termo restrito a um determinado contexto que possui características próprias de outras formas de governo ou movimentos.

Inicialmente, procurando compreender o fenômeno do totalitarismo observou que o governo totalitário é uma forma de dominação política singular, exclusiva de países que possuem semelhanças organizativas como no caso da Rússia stalinista (1930 em diante) e a Alemanha hitlerista (1938 em diante). Arendt também evidenciou que outros países como a China maoísta dificilmente podem ser classificados como governos ou até mesmo movimentos totalitários. No caso desse país, o mesmo conseguiu se isolar de uma forma muito mais radical do que a Rússia stalinista. Apesar de obter poucas informações esclarecedoras sobre a China, na época Arendt (1949 [2009]) constatou que esse regime após sangrentos expurgos, não propiciou massacres de pessoas inocentes, nem categorias de inimigos objetivos, nem teve julgamentos para fins de propagandas.

Para Arendt (1949 [2009]) os regimes totalitários são baseados na supressão das classes e através do apoio e controle das massas que através de um sistema unipartidário que transfere o centro do poder do exército para a polícia. Assim, os movimentos totalitários objetivam controlar as massas e não as classes (ARENDT, 1949 [2009], p.358) Com relação a lealdade das massas, de forma assustadora mesmo diante de acusações de muitos crimes, os membros dos partidos continuem a colaborar com suas próprias condenações mesmo que isso resulte na sua própria sentença de morte.

Segundo Arendt (1949 [2009]), o termo massa diz respeito não só ao número de pessoas, mas também com relação a sua indiferença pelos partidos políticos ou organizações profissionais e por não exercer o seu poder de voto. A principal característica de um homem de massas para a autora é quanto ao seu isolamento e a falta de interações sociais normativas.

É importante notar que, conforme Arendt (1949 [2009]) afirmou, o sucesso entre os movimentos totalitários entre as massas dissipou a ilusão de que a maior parte da população participava ativamente da democracia. Outra desmitificação é quanto a concepção de que as massas são indiferentes e que não poderiam ser mobilizadas conforme interesses de grupos ou partidos políticos. Isolados dentro dos movimentos totalitários distinguem-se de outros partidos e movimentos devido a lealdade total e inalterável de cada membro que apoia o regime.

Arendt (1949 [2009]) evidência que o movimento totalitário só poder emergir através de uma enorme força brutal e de um grande contingente populacional que possa ser descartado dentro de um determinado território nacional. Diante dessa singularidade, a autora afirmou que o regime totalitário é algo muito improvável em países com o contingente populacional relativamente pequenos. “Na verdade, esses países simplesmente não dispunham de material humano em quantidade suficiente para permitir a existência de um domínio total” (ARENDT, 1949 [2009] p.360). Ademais, os ditadores e tiranos desses pequenos países – como no caso da Itália de Mussolini, Romênia, os Estados bálticos (Lituânia e Letônia) Polônia, Hungria, Portugal e Espanha – com o tempo foram obrigados a uma maior moderação e métodos menos sangrentos de domínio pelo motivo de não poderem correr o risco de perder uma parcela significativa de sua população.

Outra característica marcante dos regimes totalitários é com relação aos meios de utilização da propaganda. Durante a angariação ao poder ainda em um governo constitucional com liberdade de opinião, faz com que o partido que constitui o movimento totalitário busque na propaganda a aderência de um grande público que ainda não se encontra completamente atomizado. Mas para Arendt (1949 [2009]) no momento em que o regime totalitário assume o poder total, substitui-se a propaganda pelo emprego da violência e a doutrinação que tem como meta impor um caráter organizativo. “O fato essencial é que as necessidades da propaganda são sempre ditas para o mundo exterior, por si mesmos os movimentos não propagam e sim doutrinam (ARENDT ,1949 [2009], p.393). Desse modo, a propaganda passa a ser dirigida prioritariamente par o público externo ou em alguns casos, para as camadas da população que ainda não foram satisfatoriamente doutrinados. Mas no âmbito de uma guerra psicológica o terror e a ideologia passam a ser ainda mais fundamentais do que a propaganda passando a ser a base dos regimes e movimentos totalitários.

No caso da ideologia, conforme constata Arendt (1949 [2009]), ela só passou a ser plenamente eficaz como uso político através de Hitler e Stalin. Assim, nos regimes totalitários ela forma uma verdade absoluta sobre o movimento histórico. “No mundo totalitário a ideologia é o instrumento essencial para explicar absolutamente e de maneira total o curso da história: “os segredos do passado, as complexidades do presente, as incertezas do futuro” (ARENDT, 1949 [2009], p.521). O projeto político dos regimes totalitários não pode se voltar meramente de assuntos específicos, passando a operar através de um sistema de valores que mobilizam as massas de uma forma a estarem sempre em movimento através das leis da história (dialética) ou biológico (racial) tendo como meta o domínio mundial, mesmo que para isso leve séculos (ou mais) para ser concretizado

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Inã Cândido
Enviado por Inã Cândido em 23/02/2014
Reeditado em 23/02/2014
Código do texto: T4702682
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