VÃO NOS ILUDIR MAIS UMA VEZ?
É difícil prever quais serão de fato os resultados práticos dos últimos protestos na maioria das cidades brasileiras com as mais variadas reivindicações. Quando o tema se resumia ao aumento dos transportes públicos e na melhora desses serviços, houve algum resultado de imediato. Boa parte dos municípios acabaram ou cancelando o aumento ou promovendo algum tipo de redução na tarifa. Todavia, quanto à melhoria dos transportes públicos, isso só será possível avaliar em médio e longo prazo. Por outro lado, não se deve esperar uma melhoria significativa nesses serviços, uma vez que, além dos custos, há uma série de medidas que devem ser tomadas tanto pelas empresas quanto pelo setor público, as quais vão esbarar tanto na má vontade dos empresários quanto dos órgãos públicos para aumentar os gastos. E mesmo que alguma melhora venha a ocorrer, ainda sim está ficará muito aquém dos anseios daqueles que saíram às ruas para reclamar. Agora quanto às demais reivindicações, onde muitas delas dependem tanto dos governos estaduais e federais, e principalmente da Câmara dos Deputados e do Senado, estas serão ainda menos atendidas. Num primeiro momento, a fim de calar as ruas e diminuir os protestos, aquelas reivindicações que não afetam diretamente o bolso e o direito dos parlamentares serão atendidas. Foi o que aconteceu com a PEC 39, os royalties do petróleo para a saúde e educação e o projeto da “cura gay” por exemplo. No caso da “cura gay” e da PEC 39, a população exigia a rejeição das mesmas, o que de fato aconteceu. Por outro lado, os manifestantes e a própria presidenta Dilma queriam 100% dos royalties para a educação e o Congresso acabou aprovando apenas 75%, dando os outros 25% para a saúde, e assim contrariando em parte o clamor das ruas. Isso tudo não passa de uma forma de iludir a população a fim de desviar a atenção do problema mais grave, que é na verdade a questão política e a de representatividade. O abismo que há entre o parlamentar e o povo foi de certa forma um dos combustíveis das manifestações. Dir-se-ia que os nossos representantes vivem num mundo à parte como se não houvesse ligação entre a realidade deles e a de seus eleitores. E isso só pode ser corrigido numa ampla reforma política e eleitoral, onde o eleitor possa dispor de melhores mecanismos para cobrar dos eleitos as promessas de campanhas. E ao que tudo indica é justamente isso que os nossos deputados e senadores não querem de forma alguma. Vão fazer muito discurso, criar uma infinidade de obstáculos e no fim das contas, apresentar uma mudança ou outra sem importância apenas para deixar as coisas continuarem com sempre foram. Talvez, num futuro próximo, o povo tenha de voltar ás ruas. Para o bem do país, esperamos que não.