17 de junho de 2013: O grito das ruas contra o poder da tecnocracia
17 de junho de 2013: O grito das ruas contra o poder da tecnocracia
A linda manifestação nacional que tomou as ruas no dia 17 de junho de 2013 foi um marco na história do Brasil e um marco na vida política de toda uma geração. Toda uma geração que lutou antes pelo Passe Livre, que lutou contra o ReUni, que lutou contra a Reforma Universitária, que participou da campanha contra a ALCA e muitos que despertaram agora para a luta política e para o movimento social. É um movimento por direitos, contra o aumento das passagens de ônibus no Brasil todo, contra a corrupção e os gastos públicos dos megaeventos esportivos da Copa das Confederações, da Copa do Mundo e das Olimpíadas e contra a repressão fascista dos governos e das polícias e a manipulação da informação pela grande mídia. É uma expressão da mesma revolta que toma conta dos jovens em todo o mundo, no Egito, na Turquia, na Tunísia, na Espanha, na Grécia, nos Estados Unidos, na França, na Inglaterra, no Chile e na Islândia. A revolta de uma geração que foi enganada com as promessas de uma vida melhor se estudassem bastante e se qualificassem, priorizando a vida profissional e financeira acima de tudo, educada no individualismo e no consumismo neoliberais. Mas a crise econômica mundial frustrou as expectativas, não passando tudo de uma propaganda enganosa. E os jovens individualistas viraram jovens rebeldes. Irritaram-se com o desemprego, que é maior entre os jovens, e com o autoritarismo de seus chefes e governantes. Clamam por democracia, denunciando a mentira que é esta democracia. Querem uma democracia real e o direito à liberdade e à felicidade. Querem a recompensa pelos anos de estudo, que fizeram destes jovens trabalhadores os mais qualificados de toda a história, na forma de empregos dignos e salários decentes e tempo de lazer e o direito ao prazer. Neste dia 17, 220 mil brasileiros tomaram as ruas no país, sendo 100 mil no Rio de Janeiro e 65 mil em São Paulo. Uma das maiores manifestações de nossa história, mas que não é um raio em céu azul. A juventude de classe média está nas ruas na linha de frente das mobilizações desde a Passeata dos 100 mil no Rio, em 1968, passando pelo Fora Collor em 1992 e, nessa geração, com várias manifestações pelo Passe Livre. Nos anos de 2000 e 2001, no Rio de Janeiro, atos de 10 mil e 15 mil estudantes, respectivamente, tomaram a Rio Branco. Anos depois, atos pelo Passe Livre em outros estados do país deram origem ao MPL. Todo fato histórico tem um desenvolvimento histórico e um contexto histórico.
É preciso, no entanto, ir além da catarse. É preciso apontar para algo novo. É fundamental dizer NÃO a tudo que está aí. Mas é extremamente necessário uma afirmação, um ato de criação que vá além da crítica e da destruição. Aquilo que foi tentado artificialmente em 2011 na Cinelândia, inspirado pelas ocupações de praças públicas pelo mundo, pode ser feito agora de forma massiva e concreta. A ocupação da praça da Cinelândia pelos manifestantes de forma permanente pode fortalecer o aspecto organizativo e manter uma mobilização permanente e o mesmo pode ser feito em outras capitais do país. Um outro dia de atos nacionais nos estados também poderá servir para o acúmulo de forças contra os governos e o empresariado, fazendo-os recuar dos ataques que vem desferindo contra nós. Os trabalhadores devem se incorporar massivamente à luta e as centrais sindicais e os sindicatos das principais categorias e que são a vanguarda das lutas nacionais tem responsabilidade nesse momento. Deve-se chamar uma greve geral, aproveitando esse momento ímpar de mobilização. Os estudantes também podem iniciar essa greve, através da decretação de greves estudantis nas escolas e nas universidades em todo o país. Essa é a única maneira de fazer com que esse movimento ganhe uma consistência política maior e não se desgaste e se esvazie na mera demonstração política e estética da revolta, o que, no momento seguinte, durante o refluxo, poderia criar as condições para uma onda repressiva sem precedentes em nossa época com vários processos criminais e leis de exceção. O desejo totalitário dos nossos governantes é evidente. Eles gritam nos nossos ouvidos que vivemos numa democracia e se não acreditamos neles, batem-nos com os cassetetes para nos convencermos. Utilizam a mídia e um aparato de propaganda governamental massivo. E tentarão retomar as posições perdidas junto à opinião pública. Os manifestantes precisam se apoiar na situação favorável, com o apoio da opinião pública nacional e atos de apoio e solidariedade no mundo todo de brasileiros no exterior. Os encaminhamentos políticos corretos são tão importantes quanto a coragem e a disposição de luta e é o que de fato garante da vitória.
A geração adulta precisa entrar de vez na mobilização. O povo brasileiro deve acordar do sonho consumista neoliberal que associa qualidade de vida a padrão de consumo. Foi isso que gerou a crise econômica mundial nos países centrais do capitalismo. Os governos deram uma aparente trégua na repressão policial só para que seus agentes infiltrados agissem no sentido de desmoralizar o movimento perante a opinião pública, com a ajuda da ação inconsequente de setores ultra. É tempo de organização. Se a forma organizativa horizontal permitiu a massificação do movimento, também demonstrou sua fragilidade diante do individualismo de alguns que contribuem com atos que não estão de acordo com a maioria do movimento para a propaganda negativa promovida pela grande mídia, a hipócrita mídia burguesa brasileira, que chamava os rebeldes da Líbia, apoiados pelos EUA, de revolucionários, e condena qualquer tipo de ação mais violenta de manifestantes brasileiros. Nesse sentido, não podemos jamais confundir a necessária unidade de ação nos atos, que devem nesse momento ser absolutamente pacíficos, com fazer coro com aqueles que chamam de vândalos aos manifestantes que se excedem. Não podemos, de maneira nenhuma, ajudar a criminalizar companheiros de luta, mesmo que consideremos equivocados. Na ditadura militar, muitos eram torturados por serem subversivos e, segundo eles, terroristas. Agora chamam de vândalos e de terroristas aqueles depredam o patrimônio público. Mas nós que estamos desse lado devemos considerar depredação do patrimônio público também a privatização da Vale do Rio Doce por Fernando Henrique, a privatização dos aeroportos e portos por Dilma e a privatização do Maracanã por Sérgio Cabral Filho. Esses sim não cansam de vandalizar o patrimônio do povo brasileiro. E devem ficar calados diante da voz das ruas. O grito das ruas partiu dos jovens, jovens agora rebeldes, mas não como a classe dominante queria, segundo seus interesses; a rebelião da juventude é contra o sistema, contra a democracia representativa liberal, contra o Estado burocrático e autoritário, contra o controle totalitário das nossas vidas por uma tecnocracia e contra o capitalismo e a completa alienação da vida. O conjunto difuso, mas não abstrato, absolutamente concreto das pautas levantadas só indica uma coisa: que, assim como o movimento Occupy Wall Street, este é um movimento anticapitalista inconsciente. É preciso retomar a palavra-de-ordem da revolução e levantar, contra tudo e contra todos (que estão no poder ou que o sustentam direta ou indiretamente), a bandeira do socialismo. Os velhos que se venderam e que desistiram de sonhar e de lutar dizem que vivemos numa democracia, mas nós jovens, de classe média e trabalhadores, adultos radicais e velhos que lutaram e que ainda lutam, sabemos que a democracia é o governo do povo, o governo da maioria, e que nós, a maioria, os 99%, estamos fora dele. Queremos uma democracia participativa e a ampliação da democracia direta, uma democracia real e efetiva. Queremos um Estado que controlemos e não um Estado que nos controle. E queremos o fim da farra dos grandes empresários e dos banqueiros estrangeiros e brasileiros com a riqueza que nós produzimos e que entregamos a eles com o nosso trabalho e com os nossos impostos, que depois são repassados aos capitalistas por meio dos investimentos governamentais e empréstimos de grandes quantias por parte dos bancos públicos, além da isenção de impostos que nós não temos.
É preciso fortalecer o movimento e isso se faz com pluralismo e democracia. Nada de mandar baixar bandeiras. Todas as bandeiras devem ser erguidas, todos devem ter o direito de panfletar o que bem entenderem, todos devem construir esse movimento com generosidade, liberdade, solidariedade, compreensão e democracia de verdade e não com a voz do opressor gritando em seus cérebros para que se voltem contra a esquerda para que não sejam massa de manobra, só para que as elites tenham a garantia de que o povo brasileiro continuará a ser massa de manobra sua. Não se deve ouvir qualquer análise ou "recomendação" da Rede Globo. Essa emissora apoiou a ditadura militar e é nossa inimiga. Deve-se conhecer o inimigo e forjar alianças sólidas com aqueles que estão no mesmo campo que você para que se possa travar uma luta sem trégua rumo à vitória. Iniciou-se um novo momento na luta de classes brasileira e não sabemos onde isso irá parar. As grandes manifestações estudantis de 1968 foram derrotadas e terminaram com o AI-5. Não podemos ser ingênuos e deixar que a tragédia se repita. Temos tudo a conquistar e tudo a perder. E só podemos contar uns com os outros e confiar em quem está ao seu lado e que luta contigo ombro a ombro, que caminha contigo pelas ruas. Um amplo apoio passivo também é importante. Além da militância dos movimentos sociais nas ruas, professores devem falar sobre isso com seus alunos nas salas de aula, explicar, esclarecer e desmentir a mídia, os jornalistas comprometidos devem produzir matérias que informem o que de fato está ocorrendo para a população, blogueiros devem atuar no sentido de espalhar os vídeos dos atos por toda a internet. Com isso, criamos um sistema de contra-propaganda, de contra-informação para derrotar a máquina de propaganda da grande mídia e da classe dominante e fortalecer as manifestações. Só pode vencer quem sabe para onde vai e já chegou a hora de definirmos a nossa estratégia de guerra, os nossos objetivos concretos e nunca mais confiar naqueles que nos enganam, nos manipulam e que, ao mesmo tempo, nos oprimem e nos exploram. Só aqueles que lutam e sonham conosco merecem a nossa confiança.
Rafael Rossi