A VAIA FOI POUCA
Brasília...
A cena toda durou um minuto e sete segundos.
Mas repercute em todo o mundo.
As câmeras estavam focadas em Joseph Blatter e Dilma Rousseff.
Eles iriam declarar aberta oficialmente a Copa das Confederações.
Os protestos na sexta-feira e momentos antes do jogo já eram a senha.
O futebol era aceito.
Mas o gasto de R$ 1,5 bilhão na construção do estádio Mané Garrincha, não.
Assim como também os mais de R$ 30 bilhões envolvidos no Mundial.
A construção de 12 novas arenas.
Quatro delas reconhecidamente elefantes brancos.
Ou seja, o futebol de suas cidades não comporta estádios tão grandes.
Manaus, Cuiabá, Natal...
O próprio Mané Garrincha, dos inexpressivos clubes brasilienses.
O Mundial de 2014 será a competição mais cara de todos os tempos.
Somadas as três últimas Copas o valor não foi tão alto.
O governo brasileiro recebeu os cadernos de encargos.
Ali estavam colocadas as exigências da Fifa.
O governo brasileiro aceitou porque quis.
A promessa de que o dinheiro viria da iniciativa privada se diluiu.
Mais de 70% dos gastos são do dinheiro público no Mundial.
Muitas obras de mobilidade social...
E de modernização dos aeroportos não saíram papel.
As cidades que forem sede da Copa terão feriado facultativo nos dias de jogos.
Para que o trânsito possa fluir.
E disfarçar as obras de mobilidade social que não foram feitas.
Os ingressos para a Copa das Confederações são caríssimos.
De R$ 57,00 a R$ 418,00.
Para a Copa do Mundo haverá aumento.
Tudo foi problemático para a estreia de ontem.
Desde a venda pela internet até a retirada.
Filas de mais de três horas para quem já pagou.
Cambistas conseguiram comprar e faziam leilão pela Internet.
Os preços dos lanches na competição são abusivos.
Definidos pela Fifa.
Cerveja importada: R$ 12,00.
Cerveja nacional: R$ 9,00.
Cachorro-quente: R$ 8,00.
Chocolates, batatas onduladas, tortinhas e amendoins: R$ 7,00.
Água, refrigerante, energético e cerveja sem álcool: R$ 6,00.
A Polícia Militar de Brasília fechou quarteirões em um raio de três quilômetros.
Chegar ao estádio era uma façanha, ainda mais debaixo do sol inclemente de Brasilia.
Estacionamentos chegavam a cobrar R$ 50,00.
Taxistas insistiam em se aproveitar cobrando bandeira dois.
O mau humor, o descontentamento dos torcedores eram evidentes.
Blatter ficou completamente desnorteado com as vaias.
A esmagadora maioria dos 67.427 pagantes.
A arrecadação, de forma estranha, não foi divulgada.
Ele perguntou onde estavam o respeito e o fair play à torcida.
Foi ainda mais vaiado.
Olhou para Dilma constrangido.
Ela pegou seu microfone e logo falou sua frase obrigatória.
"Declaro aberta a Copa das Confederações."
Foi aí que as vaias tomaram de vez conta do Mané Garrincha.
Raposas políticas sabiam estar sendo fotografadas.
E trataram de sorrir e acenar para os torcedores.
Fazendo de conta não ouvir as vaias.
Esse foi um fenômeno que atingiu muita gente.
A Seleção Brasileira e Japonesa estavam de frente para a tribuna.
Acompanharam toda a cena.
A vaia foi ouvida até fora do estádio.
"Estava tão concentrado no jogo que não ouvi", disse Fred.
Os jogadores seguiram esse caminho para não se comprometer.
Havia só duas opções.
Apoiar os torcedores e ir contra Dilma e Blatter.
Ou apoiar os dirigentes e censurar a torcida.
Lavaram as mãos.
Luiz Felipe Scolari foi mais direto.
Perguntei a ele, nacionalista assumindo, sobre as vaias à presidente.
"Só falo sobre aspectos técnicos (do jogo contra o Japão)"
Não é bem assim, já que ele comenta sobre tudo nas coletivas.
Mas não valia a pena para o treinador se envolver na questão.
A TV Globo é proprietária dos direitos de transmissão do Mundial.
E por lei é obrigada a ceder três minutos do que mostrou ao Mundo.
Isso aos veículos de comunicação brasileiros.
A Globo iniciou a sua transmissão justamente mostrando a constrangedora cena.
A emissora carioca é parceira de longa data da Fifa.
São sócias em vendas de produtos ligados ao Mundial.
Tudo de forma aberta, transparente.
Essa ligação está gerando vários protestos.
As vaias da torcida a Blatter e Dilma são históricas.
Tanto quanto os protestos diante do estádio antes do jogo.
Os confrontos com a Tropa de Choque foram violentos.
O que começou pacífico acabou com 27 feridos e oito presos.
Dados da Polícia de Brasília.
Isso foi filmado e divulgado.
O problema da vaia dentro do estádio era muito maior.
Os veículos de comunicação brasileiros queriam o minuto e sete segundos.
Do jogo, só os gols.
Houve pedidos a Globo antes das imagens serem editadas.
Mas quando foram divulgadas, a abertura e as vaias foram omitidas.
Há um grande clima de revolta.
A situação fica ainda mais constrangedora.
Esconder o que bilhões de pessoas viram é bobagem.
As cenas estão disponíveis no youtube.
Outras redes do mundo todo as colocaram no ar.
E as postaram na Internet.
A defesa é inútil.
Blatter e Dilma não esperavam tantas vaias.
O presidente da CBF, José Maria Marin, não perdeu tempo.
Pelo contrário.
Aproveitou-se para se aproximar de Dilma.
E o consolo, a demonstração de apoio, serviram como desculpa.
Os dois conversaram muito ontem.
A presidente parece ter se esquecido das acusações a Marin.
Dos discursos do governador biônico contra Vladimir Herzog.
O jornalista acabaria assassinado no DOI-CODI durante a ditadura.
Já envolvida na corrida eleitoral para 2014, Dilma percebeu.
Aparições durante a Copa das Confederações podem desgastá-la.
Ela se poupará.
A tendência é que apareça apenas na final do torneio, no Rio.
O que aconteceu ontem foi um laboratório inclusive para a Copa.
Dilma que buscará a reeleição deverá estudar o que fará em 2014.
A Fifa também buscará medidas que a tornem mais simpática à população.
Ingressos populares e distribuição de entradas a índios...
Como também para a população carente e estudantes acontecerão na Copa.
A entidade deverá doar pequena parte dos R$ 5 bilhões do lucro com o Mundial.
Enquanto isso, os protestos deverão continuar no Brasil.
MSTS e estudantes deverão seguir se manifestando contra os gastos no futebol.
E usando os holofotes da Copa das Confederações.
As autoridades das sedes já estão atentas.
Não serão pegas de surpresa como aconteceu em Brasília.
Soldados militares e até do Exército já estão de prontidão.
Sabem que haverá protestos, mas tentarão minimizá-los.
E deixá-los o mais longe possível dos estádios.
Já Blatter e Dilma não podem fazer nada com os torcedores.
Eles pagam caríssimo para ver os jogos.
E vaiar é um direito universal.
Maneira civilizada de mostrar descontentamento, reprovação.
É o que aconteceu ontem aqui em Brasília.
Algo legítimo que emissora nenhuma poderá esconder.
Blatter e Dilma devem é repensar.
Escolherem um caminho que seja melhor para o amante do futebol.
O Brasil esperou por 64 anos para ter de novo a Copa do Mundo.
Mas o preço foi caro demais.
E o torcedor já percebeu.
Por isso vaia.
Blatter e Dilma fingem que não ouvem
Apenas acenam, sorriem.
José Maria Marin aplaude.
A TV Globo distribui imagens do jogo.
E se esquece das vaias da população...
(Após as cobranças a cúpula da Globo acordou.
Percebeu o ridículo da manipulação.
E à tarde enviou as imagens das vaias.
Os demais veículos de comunicação do Brasil agora podem mostrar.
Transmitir o que todos viram.
Nestes tempos de Internet, a manipulação é perda de tempo.
E de prestígio...)