Notícias da Venezuela 1
Parte 1
O presidente Hugo Chávez, recentemente falecido, quase nunca contou com pronunciamentos favoráveis a seu respeito por grande parte da imprensa sul-americana e de boa parte dos cidadãos sul-americanos. Sobretudo dos mais próximos da elite.
No entanto, parafraseando o parlamentar britânico George Galloway, deveríamos ter em conta que “o nosso problema é termos um conhecimento limitado sobre tudo”.
Nessa linha de raciocínio, isto é, com o objetivo de municiarmos as pessoas com informações que lhes permitam discorrer sobre determinados assuntos com maior fundamentação, retiramos de uma apresentação do próprio Chávez depoimentos seus que eventualmente podem não ser do conhecimento dos mais arraigados críticos do falecido presidente venezuelano.
Nessa apresentação, ele começa dizendo: “dêem patadas na moral e patadas na verdade. Mas a verdade é a verdade e é sabida pela maioria. Vocês sabem o que é Puente Llaguno? Onde fica?”
Chávez se referia a um viaduto próximo ao palácio presidencial, palco do que ficou conhecido como o Massacre de Puente Llaguno. De que poucos brasileiros têm conhecimento. Apesar da cobertura da Globo, como parte de uma estratégia midiática destinada a confundir as pessoas e justificar a derrubada de Chávez.
Na madrugada anterior ao dia 12/04/2002, “um golpe de estado derrubara do poder o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, após um grande protesto dos setores mais ricos do país contra a política de nacionalização dos recursos e controle da PDVSA (equivalente à Petrobrás venezuelana)”. O protesto transformou-se numa tragédia, que ficou conhecida como o Massacre de Puente Llaguno, onde perderam a vida 19 pessoas e 70 ficaram feridas.
Chavistas foram flagrados atirando nas pessoas de cima da ponte. O objetivo era atribuir a eles o massacre que “causou comoção e indignação dentro e fora da Venezuela”. Depois ficou provado que as imagens foram manipuladas para que não fosse revelado que os que atiravam de cima da ponte reagiam ao “fogo de snippers (franco-atiradores) postados em edifícios e agentes da Polícia Metropolitana a serviço da oposição”, os verdadeiros responsáveis pelos 19 mortos e 70 feridos.
Isso não é novidade pra gente. É só lembrar do episódio do Gasômetro, próximo à Rodoviária Novo Rio, no Rio de Janeiro, durante a ditadura instaurada a partir de 1964. Oficiais no comando da Aeronáutica decidiram explodir o Gasômetro para que a tragédia, certamente com um número expressivo de mortos, fosse atribuída aos “subversivos”. Felizmente o episódio não teve seguimento porque o capitão aviador conhecido como “Sérgio Macaco”, encarregado da missão, numa atitude heroica, resolveu não acatar as ordens superiores, sendo por isso punido e prejudicado posteriormente na sua vida funcional.
Ainda em seu discurso, Chávez traz informações que muitos brasileiros certamente não têm. Diz, por exemplo, que a Venezuela possui 330 bilhões de barris de petróleo, contra 20 bilhões dos EUA, constituindo-se na oitava reserva petrolífera do mundo, com 150 milhões de pés cúbicos. Diante desses dados, ele pergunta: “como pode um país de onde se tirou tanto petróleo terminar o século 20 com 60% de pobreza?”
Relata também que os EUA, a maior potência do planeta, detém sozinhos cerca de 32% do PIB mundial e mais de 50% do poder militar em todo o globo. Mas que são venezuelanos os primeiros investidores latino-americanos nos EUA, com 8 refinarias de petróleo, vários sistemas de distribuição de combustível, etc.
É citado pelo empresário Roberto Dias, diretor da empresa brasileira Norberto Odebrecht, envolvida na construção do complexo rodoferroviário venezuelano e da ponte sobre o Rio Orinoco, em 2006, obra das mais emblemáticas em termos de integração sul-americana. Que confirma o projeto de construção da infraestrutura energética ligando Argentina, Brasil e Venezuela, estabelecendo Buenos Aires, Brasília e Caracas, segundo Chávez, como o eixo geográfico do futuro para a América do Sul.
Lembra que, com a queda da URSS, houve a imposição do consenso de Washington, dando-se o fim de uma parte da História e da era tecnotrônica. Não obstante, observaram-se reações populares, como o Caracaço em 89, a rebelião na Argentina em 2001, a rebelião no México, etc. Numa demonstração de que o povo, na América Latina, como há 200 anos, se rebela agora contra a conservação da mesma ordem mundial. E considera que as correntes populares vão tomando a via da transformação, que é a da esquerda, reservando-se a via da conservação para a direita.
Para Chávez, a esquerda conteria os ideais da Revolução Francesa: liberdade, igualdade, fraternidade – numa palavra, a democracia. A direita representaria a tirania das elites, disfarçada de democracia, justificando a desigualdade com a afirmação de que a pobreza é inevitável, que é natural. Não contempla, portanto, a possibilidade de que a pobreza seja reduzida.
Perguntado se há miséria em Cuba, Chávez, fazendo um contraponto, começa afirmando que há muita pobreza nos EUA. Que há muita pobreza no Bronx. Que não houve maiores preocupações com a população mais pobre durante o furacão Katrina. Que deixaram os pobres se afogar. Ao passo que em Cuba, evacuam até as galinhas quando há furacão.
Maricá, 29/03/2013