Reinações de Cachoeira
      Sérgio Martins Pandolfo*
    Nesta já apelidada CPI do Cachoeira viram-se, por enquanto, coisas que até Deus duvida. Todos os adjetivos e superlativos que compõem o fornido acervo lexical da língua de Camões serão insuficientes para descrever e retratar, com justeza, o verdadeiro espetáculo circense que se tem visto, “ao vivo e a cores”, “via Embratel para todo o Brasil” (surrado bordão já prescrito) nessas sessões que seriam hilárias, não fossem antes assaz repugnantes. A desfaçatez, o cinismo, a impassividade, o ar de enfado mesmo do artista principal dessa comédia bufa às perguntas dos seus inquiridores - ávidos por tomarem a cena iluminados pelos holofotes midiáticos -, junto ao seu conspícuo advogado, postado de forma quase solene â sua ilharga, qual impávido colosso, a conferir e aprovar com meneios afirmativos de cabeça a pomposa sentença por ele repassada ao “ilustre” cliente e de pronto repetida, de forma acachapante, para os inquiridores: “Fui advertido pelos meus advogados para não dizer nada. Eu não vou falar nada aqui”.
     O próprio cognome do indigitado já nos aguça a curiosidade ou nos induz a tentar deduzir sua bizarra origem: Carlinhos “Cachoeira”. Cachoeira de quê? De negócios escusos? De malfeituras em cascata? De catadupas de notas de real e/ou dólar para intermediar ilicitudes entre políticos e homens públicos acima de qualquer suspeita? Fomos ao “pai dos burros” desta Idade Mídia, o Google, e não obtivemos resposta. Fato é que o inquirido permaneceu impassível, mudo e quedo às perguntas e mesmo a alguns impropérios formulados por membros mais exaltados da CPI, sigla que aqui melhor exprimiria Comissão de Pasmados Inquiridores; coisa que, aliás, já se previa iria ocorrer, pois seu advogado, ex-ministro da Justiça, havia solenemente anunciado tanto aos membros da comissão como aos órgãos de informação. Portanto, nada a estranhar. Dois outros convocados a depor perante a CPI seguiram o mesmo exemplo do “mestre”. Se calhar seria menos exasperante botar um “boneco-cachoeira”, em lugar do verdadeiro, como se fez aqui (em Belém) colocando um “boneco-Obama” a fiscalizar o trânsito junto às obras do BRT?
     O que sinceramente julgamos deplorável nesse rumoroso escândalo, que mexe com coisas e gentes do mais alto cenário político nacional, é o fato de um ex-ministro da Justiça, que até há bem pouco tempo era o responsável principal pela aplicação da Lei e da Ordem Pública no País, estar agora a soldo de um elemento apontado pelos órgãos de investigação mais categorizados - Polícia Federal e Ministério Público Federal - como corruptor-mor e intermediador dos mais solertes e despudorados atos de improbidade entre políticos dos três poderes da República, levado tão somente pela força do vil metal, à feição do traiçoeiro gesto de Judas Iscariotes contra Jesus Cristo por “trinta dinheiros”. Claro está que esses “trinta dinheiros” sobem aqui a quantias estratosféricas que, segundo se diz à boca pequena, chegaram a quinze milhões de reais só para aceitar a causa. Depois virá o resto. Isso pode até ser legal – e sabemos que o é -, mas será moralmente lídimo? Igualmente não desconhecemos que todo réu tem direito à ampla defesa, sustentada por advogado por ele custeado ou da Defensoria se demonstrar não reunir condições financeiras para tal. Não poderá mesmo ir a julgamento sem um causídico dativo a defendê-lo, o qual será designado pelo juiz caso o réu não haja sido enquadrado numa das duas situações precitadas.     
    
Não é o caso aqui, em que a pecúnia foi a mola mestra, está patente, haja vista que em 2004, Márcio Thomaz Bastos, à época Ministro da Justiça, no inaugural escândalo da era Lula protagonizado por Waldomiro Diniz, ao tempo assessor do ex-ministro José Dirceu, em vídeo gravado por Carlinhos “Cachoeira”, a receber propina para a campanha política do PT em troca de facilitações em concorrência pública carioca para suas firmas, fez formal jurispronúncia: Não há  como dar perdão a Cachoeira porque a lei exige que o réu, para quem se propõe o perdão, tenha colaborado no desvendamento da causa. Agora retorica: “Ele pode não falar nunca, se ele quiser, é um direito que ele tem. Ó tempore, ó mores!

Nota: na ilustração acima o zoobanqueiro Cachoeira fala a um de seus "contactos" com telefone de sua rede exclusiva, à prova de grampos.

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*Médico e escritor – ABRAMES/SOBRAMES
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Sérgio Pandolfo
Enviado por Sérgio Pandolfo em 01/06/2012
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