Voto para todos, democracia para poucos
Em período pré-eleitoral começamos a observar a movimentação dos partidos políticos no sentido de preparar a lista de candidatos ao pleito que se aproxima. Tem início, então, um jogo de poder e influências de candidatos interessados em uma vaga. Como em todas as áreas, o poder econômico tem grande peso. Qual o candidato que possui mais recursos? Qual terá a maior capacidade de atrair doações de campanha? Qual terá o maior apoio dos empresários e pessoas que têm mais dinheiro? Aquele que aparecer mais bem colocado na lista de resposta dessas três perguntas terá preferência sobre os demais.
Os coronéis e caciques dos partidos, aqueles políticos tradicionais, geralmente os mais ricos, bem como os que já estão exercendo algum cargo político, também vão exigir que pessoas leais a eles sejam colocadas na lista de candidatos. Além disso, empresários que prestam serviço ao setor público estarão de olho e atuantes, no sentido de dar apoio a quem possa privilegiá-los durante o mandato.
Lá no final da fila, correligionários que não serão candidatos a cargo eletivo fazem um trabalho nos bastidores, espalhando boatos, tentando influenciar uns aos outros, na tentativa de elencar a pessoa que mais lhes convenha para os cargos eletivos. Logicamente que não fazem isso por pura motivação de cidadania, mas porque preferem que seja eleito aquele que com mais certeza lhes nomeará para algum cargo em comissão, se eleito for.
Com certeza, diante de tantas forças e influências, prevalecerá o nome que tiver mais força dentro de cada partido. Aquele que conseguir angariar mais apoio entre os ricos, os coronéis, os já eleitos, os empresários e os correligionários, terá seu nome registrado como candidato. O melhor para o partido, com certeza! Dessa forma, as agremiações políticas se fecham em si mesmas, escolhendo aquele mais agradará a quem faz parte do grupo a que pertencem e esquecem de pensar em quem seria o melhor para a cidade, o estado ou o país.
Fora de todo esse processo, temos o eleitor. Aquele que só opinará naqueles poucos instantes em que estiver cara a cara com a urna eletrônica. O problema é que entre as escolhas que poderá fazer, o eleitor terá apenas aqueles candidatos que já passaram pelo crivo das suas agremiações e foram escolhidos como o melhor: para os partidos! Mas serão eles os melhores para o eleitor?
Vemos-nos, então, diante de uma democracia que exclui da lista de candidatos pessoas que têm realmente o interesse em servir ao público, sem segundas intenções, sem obrigações com esse ou aquele empresário, sem compromisso com esse ou aquele correligionário, sem projetos particulares. No entanto, essas pessoas não possuem o apoio de quem detém o poder econômico, não contam com a indicação dos coronéis ou caciques de partidos, não podem contar com a ajuda de correligionários, pois se negam a prometer cargos em troca de apoio.
Sobra, então, ao povo, a opção de votar naquele que, embora tenha uma grande lista de obrigações e interesses que sobrepõem suas obrigações e interesses com os cidadãos, pareça ser o menos corrupto, o mais humano e o mais competente. No entanto, como perder eleições virou pecado e praticar a verdadeira democracia agora é brega, as coligações têm prevalecido e diminuído ainda mais o leque de opções do eleitor. Constam na lista apenas aqueles que são melhor não para um partido, mas para vários deles, aumentando ainda mais o compromisso do candidato com quem garantiu que seu nome figurasse na lista.
A classe política, cada vez mais cínica e escancaradamente, percebeu que as notícias sobre corrupção são favoráveis aos seus interesses, porque punição de fato não ocorre e a banalização da corrupção afasta da participação política pessoas de bem, que não querem ser confundidas com quem pratica irregularidades. Dessa forma, o mundo político, que coordena os rumos da democracia, cada vez mais se fecha e perpetua seu poder, mantendo por perto apenas quem aceite vender a dignidade por um cargo ou privilégio do poder público.
O que fazer diante de tal quadro? A resposta não parece fácil. No entanto, acredito que não desistir ainda é o primeiro passo. Não desistir de tentar também, como eleitor, influenciar na escolha de candidatos a candidato, através da participação política em agremiações partidárias. Não desistir de participar da vida política do país de todas as formas possíveis. Não desistir de fiscalizar o trabalho dos candidatos eleitos que pisam fora da linha ou não representam o povo, para mostrar que as opções que nos foram dadas pelos partidos não eram as melhores. Não desistir, liderando associações e grupos de pessoas que, unidas, possam ter força para influenciar na escolha dos candidatos. Não desistir, mesmo que nossos gritos por moralidade e eficiência pública pareçam sussurros, diante do monstro do poder econômico e da influência de quem detém o poder político.
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