À (A) volta d’El-rei
Sérgio Martins Pandolfo*O rei d’Espanha, que durante a XVII Conferência Ibero-Americana, realizada na cidade de Santiago do Chile no final de 2007, se fez notabilizar em todo o mundo por ter passado um pito no boquirroto presidente venezuelano Hugo Chávez Frias com a famosa sentença: ¿Por qué no te callas? foi protagonista, há poucos dias, de um imbróglio pra Chávez nenhum botar defeito, ou melhor, para Chávez acudir-se e não mais entrar em frias. Paradoxalmente ele, o rei de uma nação em frangalhos pela crise europeia que parece não mais ter fim, que amarga uma inflação que em algumas camadas populacionais, v.g. jovens entre 18 e 25 anos, chega à desesperadora casa dos 40%, ele que foi peça chave e um dos sustentáculos para a redemocratização do Estado Espanhol pós-guerra civil que se seguiu à sanguinária ditadura Franco, ele que é presidente de honra em seu país da WWF, uma das maiores ONGs ambientalistas do mundo, saiu da cena política da União Europeia por alguns dias e foi refestelar-sena pobríssima Botswana, país da África austral que, para equilibrar suas receitas financeiras, permite a caça a animais selvagens, ao inverso da maioria de outras nações daquele maltratado continente, para... caçar elefantes.
Tudo entretanto teria passado absolutamente despercebido e o monarca voltaria de suas férias, quem sabe com o troféu do abate irresponsável, covarde, despropositado de alguns paquidermes, o que fará escassear, ainda mais, os exemplares desses molossos das savanas africanas, não fora o fato daiberomajestade, um provecto senhor de 74 anos – o que por si só já ensejaria pressupor ter criado juízo - ter sofrido um acidente que lhe acarretou uma fratura no quadril, que fez com que ele regressasse incontinênti a Madrid, a fim de se submeter a uma intervenção cirúrgica corretiva, fato trazido à tona pela imprensa espanhola. Intervenções desse tipo são, pelo geral,preocupantes e sujeitas a intercorrências e/ou complicações, mas que o monarca, ao que tudo faz por indicar, malgrado o susto tirou de letra e se recupera bem e rapidamente, apesar da idade já madura. O gosto de Juan Carlos I pela caça não era, na verdade, segredo e nem recente. Ao revés!
O anoso soberano ibérico teve que amargar a humilhação de pedir desculpas publicamente para aplacar a indignação do povo espanhol que se sentiu atraiçoado pela desfaçatez com que o rei o abandonou e foi curtir suas “vacaciones” em terras distantes e a cumprir um desiderato nada salutar ou elogiável, que a ex-atriz francesa Brigitte Bardot, ligada a causas ambientalistas, simplesmente classificou como “indigna”.
Pois a indignação do povão fez-se ainda maior ao tomar conhecimento da conta a pagar pelo real safári: a taxa a ser contraposta em Botswana para caçar elefantes varia entre 7.000 euros e 30.000 euros, indigesta para um país esfrangalhado financeiramente, valor maior do que o auferido pela maioria do operariado espanhol em um ano. Ao demais, o fato de o rei ser presidente de honra em seu país da WWF, desencadeou uma onda de execrações pelas chamadas mídias sociais, alicerçada e magnificada pela exibição de foto do Chefe de Estado espanhol junto a um dos animais abatidos (V.foto no alto), causando revolta aos internautas de todo o mundo e enorme rejeição dos sócios da WWF e da opinião pública espanhola, inclusive com parcela significativa a cogitar a renúncia do soberano, fazendo decrescer, proporcionalmente, a credibilidade da aludida ONG, que amarga descréditoa seus apelos e redução de seus aportes. O jornal El Mundo, em editorial afirmou: "A imagem de um monarca caçando elefantes na África em um momento em que a crise econômica cria tantos problemas para os espanhóis é um exemplo muito ruim."
Ficamos a pensar que, fosse hoje o encontro de Chávez e Juan Carlos, à frase espinafrante de El rei: ¿Por qué no ter callas? retrucaria o falastrão presidente venezuelano: ¿Y tu, por que no te mancas?
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*Médico e escritor. ABRAMES/SOBRAMES
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