PARADOXOS BRASILEIROS
Para alguns, paradoxos são absurdos, contradições. Parece-me, no entanto, que paradoxos não são propriamente contradições, nem absurdos, mas questões que contrastam tanto entre si que nos deixam sumamente admirados e perplexos. Não os conseguimos reduzir a uma lógica aceitável. São contraposições irreconciliáveis racionalmente. Os paradoxos estão para além, ou aquém, das idéias cartesianas claras e distintas. É difícil, senão impossível, conciliar paradoxos, mesmo quando se enquadram nas mesmas categorias de fatos. Neste sentido, encontramos na realidade brasileira inúmeras situações paradoxais. Vejamos algumas destas situações. Não é algo paradoxal que o nosso Real esteja tão valorizado em relação ao dólar, permitindo que mais brasileiros viajem ao exterior, quando o turismo interno se torna mais difícil? Em relação a eleições presidenciais, a mídia nos instrui melhor como se vota nos Estados Unidos, e o que se exige dos candidatos a Presidente daquele país, do que em relação aos nossos candidatos e mecanismos eleitoreiros. Exige-se em nosso país cada vez mais policiais, mas o número de homicídios continua vergonhosamente alto, e a bandidagem aumenta cada dia, até nos meandros de Brasília; muitas das nossas prisões estão desumanamente superlotadas; o Congresso Nacional constantemente acrescenta mais leis às centenas de milhares de leis já existentes, mas as fraudes e o desrespeito às leis se escancara aos nossos olhos; os impostos são escorchantes, mas os serviços públicos continuam deficientes; no Brasil há cada vez mais carros, mais IPVA, mas também cada vez mais estradas esburacadas. A linguagem de nossos governantes afirma que a saúde vai bem, na educação se investe cada vez mais, mas organizações internacionais constatam que o sistema de saúde no Brasil beira ao caos; em educação somos o país mais atrasado na América Latina, e no mundo ocupamos um péssimo lugar; a burocracia sufoca empresas e cidadãos, mas a corrupção se alastra como epidemia. Chegam ao Brasil enxurradas de dinheiros limpos e/ou sujos para especulação, e, ao mesmo tempo, cada vez mais brasileiros procuram sobreviver no exterior, trabalhando, lavando pratos, e coisas tais, porque no Brasil não há emprego suficiente. O Governo afirma que cada vez se criam mais empregos no Brasil, mas nunca se menciona quantos trabalhadores, entretanto, foram demitidos. A polícia federal arranca, de mês em mês, milhares de pés de maconha, mas as plantações e o consumo aumenta assombrosamente; a agricultura colhe, de ano em ano, mais e mais toneladas de sementes, no entanto o Governo amplia a bolsa-família para socorrer os miseráveis; cresce de ano a ano o número de beneficiados pelos subsídios do Governo, mesmo assim aumenta o número dos sem-teto, dos sem-terra, dos moradores de rua, dos excluídos. Anunciam-se políticas para inibir o desmatamento da Amazônia, mas as áreas desmatadas aumentam de mês em mês catastroficamente. O povo, no resto do país, “lascado”, e os burocratas e políticos de Brasília enfurnados em seus palácios e gabinetes, sem compartilhar a dor, a angústia, a violência, o desrespeito, a exploração, a escravização, os salários aviltantes, o analfabetismo, as enfermidades, o conformismo e a alienação de milhões de concidadãos espalhados por este imenso território nacional. Muitas vezes, até parece, que Brasília é uma ilha de insensíveis, de sarcásticos debochados, hedonistas bem nutridos nos restaurantes e bares, noturnamente sempre superlotados; burocratas centralizadores, sem compaixão e amor no coração. E haja paradoxos! Embora possuamos no Brasil todos os bens da sofisticada civilização de nosso tempo, as misérias mais absurdas das épocas obscurantistas e bárbaras nos rodeiam. Diante destes paradoxos, poucas e boas leis, observadas fielmente, nos redimiriam das insanidades que vivenciamos tão abundantemente neste maravilhoso país.
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Inácio Strieder é professor de Filosofia - Recife