Posso ser chamado de "sem-terra". Mas, vivo do trabalho honesto na cidade.
Posso ser chamdo de "sem-terra". Mas, vivo do trabalho honesto na cidade.
O MST acaba de ocupar, mais uma vez, uma fazenda no pontal do Panarapanema. E vai começar toda a lenga-lenga em torno do fato, como sabemos.
O que é um sem-terra? O conceito é frouxo: sem-terra seriam todos aquelas pessoas ou descendentes que, de um modo ou de outro, são oriundas do campo por conta do processo de transformação das relações de produção ou concentração da propriedade rural, como decorrência do mesmo processo e, que, de qualquer forma, não tem acesso à terra para o cultivo e sobrevivência econômica.
A despeito do largo conceito em questão, sou da opinião de que devam existir muito poucos sem-terra de verdade, no sentido de que sejam pessoas que se sintam alijadas de participação do sistema produtivo rural ou, que seja ao menos saudoso dele, pois a maioria deles se mandou da roça para a cidade, onde não eram proprietários rurais ou eram donos de propriedades rurais que não lhes davam sustento e renda bastante para o sustento da família.
Sabemos: lá pelo final dos anos 70, a maioria da população estava fixada nas cidades. E não me consta que tenha havido qualquer comoção a respeito. Quem deixou o mundo terrível do trabalho rural, passou, de um modo ou de outro, numa vida mais confortável na cidade, perto daquilo que é próprio do mundo urbano: energia elétrica, água tratada, escola regular e maiores ofertas ou oportunidade de trabalho (meu pai sempre me dizia quando era pequeno: só não trabalha quem não quer!).
De acordo com o conceito dos militantes dos movimentos da área, eu filho de um agricultor, que migrou de uma cidade do interior para a capital do meu estado, sou inequivocamente um sem-terra. Mas, o caso é que sou um sem terra que vive do trabalho honesto e burocrático na cidade.
"Trabalho honesto? O que quer dizer esse sujeito - que o trabalho do mundo rural, por acaso, é desonesto?", inquirirá o hipotético leitor. E eu retruco dizendo que não é nada disso e que apenas me acompanhe, nas linhas abaixo.
A idéia de acesso à terra (uma idéia em si vagabunda, pois tenho certeza que nenhum líder sem terra ou equivalente afirmaria, seriamente direito correspondente, em relação à indústria e ao comércio, no sentido de que ela seria uma suposta obrigação do Estado) está hoje intimamente a outra, a do conceito da tal da "agricultura familiar".
Agricultura familiar seria a boa, a desejada, aquela quer permite a susbsistência da família e, portanto, não está de nenhuma forma associada à idéia atribuida à sua contrafação, a má agricultura, de grande porte, voltada para o lucro, está associada ao arroteamento de frandes extensões de terra (e como não seria?), voltada para o mercado internacional.
Disto decorre que o agricultor familiar é uma espécie de mártir que encontra a sua redenção no cultivo de uma pequena, suficiente e idílica porção de terra. E o pequeno, médio ou grande produtor rural seria uma espécie de escroque, cuja vida decorre entre a extenuação da natureza e a busca insensível do lucro.
Segundo os líderes dos movimentos de sem terra (que vão se multiplicando Brasil afora, por motivo que explicarei mais adiante), o acesso à terra para o cultivo e subsistência é um direito natural do indivíduo, disto decorrendo a legitimidade do movimento pela reforma agrária.
Mas, apenas para ilustrar o surrealismo da idéia, registro que não conheço pessoa ou associação que alegue a ausência de acesso à empresa ou indústria e, por isto mesmo, reivindique uma espécie de reforma empresarial ou industrial, posto que, se sabe pela experiência, prática e história, estas estão umbilicalmente ligadas à liberdade de livre-empresa e a iniciativa individual (e aí, os exemplos não faltam: ...)...
(Se me visitou, grato, mas o tempo está incompleto. Volto daqui a pouco. Pausa para o almoço!)...