A FARSA DE PALOCCI. COM A COLABORAÇÃO DA GLOBO.
Após semanas se escondendo dos jornalistas e sendo blindado pelo PT, Antonio Palocci resolveu falar. Para isso, foi agendada uma entrevista com a emissora de maior alcance do país. Uma entrevista gravada, editada e que pouco ou nada esclareceu. O que já era esperado. Se Palocci quisesse dar uma satisfação à sociedade, aos que pagam seus vencimentos e aos que (infelizmente) o elegeram deputado federal, teria marcado uma coletiva, ao vivo, com a participação de vários órgãos de imprensa. Em todo esse episódio é de se discutir também a participação da TV Globo. Ao longo dos tempos, muito se tem dito sobre o papel (por vezes dúbio) da imprensa, especialmente nas questões políticas. Em época de eleição, não faltam acusações de favorecimento a esse ou àquele candidato. Vários parlamentares, inclusive, são proprietários de meios de comunicação. Por essas e outras, não é raro que a credibilidade da imprensa sofra seus abalos, assim como é histórico o seu uso pelos governos, tanto na democracia quanto em regimes de exceção. Durante a famigerada ditadura militar brasileira, militantes de esquerda capturados pelos órgãos de segurança eram levados para a frente das câmeras de TV e em ensaiados depoimentos confessavam seu arrependimento pelos crimes cometidos e reconheciam a "legitimidade da Revolução de 31 de Março". Não eram entrevistas e sim depoimentos gravados em que eventuais perguntas ou comentários adicionais eram proibidos. Obviamente que as pessoas mais esclarecidas sabiam (ou presumiam) que aqueles militantes tinham sido devidamente convencidos a dizer aquilo após várias sessões de tortura. Milhares de telespectadores, porém, acreditavam que aquelas declarações eram sinceras. Embora numa época e num contexto totalmente diferentes, a "entrevista" concedida por Palocci ao Jornal Nacional no último dia 3, nos faz questionar o papel da imprensa. Nos Anos de Chumbo, no auge da censura, não seria possível discutir as ordens dos generais e entende-se perfeitamente porque emissoras de TV exibiam material favorável à ditadura. Hoje, porém, mesmo com as restrições que o atual governo tenta impor à liberdade de imprensa na nossa incipiente democracia, servilismos são inaceitáveis. Na ânsia por mais um "furo" exclusivo, a emissora carioca parece ter aceito sem restrições as condições impostas pelo governo e se envolveu numa farsa. Além de aceitar as respostas óbvias do ministro, o repórter ainda perdeu a oportunidade de fazer alguns questionamentos. Talvez o mais importante fosse entender porque Palocci encerrou as atividades de uma empresa tão absurdamente lucrativa para viver do salário de ministro. Ou como conseguiu, por quatro anos, conciliar as atividades de parlamentar com a administração de uma empresa de consultoria, levando-se em consideração sua importância para o sucesso da empresa. Afinal, como disseram vários políticos do PT, o prestígio de Palocci como ex-ministro foi fundamental para o êxito da empreitada e para a obtenção de lucros estratosféricos. O nobre ex-parlamentar não deveria ter se dedicado apenas aos seus lucrativos negócios? Depois da farsa de sexta-feira, a Globo acabou, involuntariamente, contribuindo para a saída de Palocci, que agora poderá retomar as atividades de consultor bem-sucedido (e milionário). Com tantas críticas, vindas até de alguns políticos da situação, parece que a tal entrevista teve efeito contrário. Talvez as pessoas não sejam tão ingênuas quanto pensam o PT e a Globo. A queda de Palocci era questão de tempo. Como diria um certo ex-presidente: nunca antes na história deste país um mesmo ministro foi demitido duas vezes pelo mesmo motivo. Até nisso o PT está fazendo história. E a Casa Civil já virou a Casa da Mãe Joana. Os resultados práticos de mais este escândalo não tardarão a aparecer. Crise política, inflação, queda nas bolsas, insegurança econômica, investidores estrangeiros fugindo do país. Sem falar na credibilidade do Brasil, já bastante abalada. E aquele partido que durante anos posou de ético se afunda cada vez mais no lodo da corrupção, da ganância e na vontade de se manter no poder a qualquer custo. Tomara que ainda haja tempo de impedir que o país afunde junto.