Há liberdade da imprensa?
por Fabiano Fernandes Garcez
Você conhece aquela anedota do rapaz que passeava próximo ao estádio do Morumbi e viu que um Pit Bull iria atacar uma criança, então um homem aparece e mata o animal, salvando a garotinha. O rapaz, comovido com a cena, se identifica como jornalista e diz que colocaria a seguinte manchete em seu jornal: São paulino salva garota indefesa de animal feroz! O homem agradece, porém diz que não é são paulino e sim corintiano, no dia seguinte a manchete é: Corintiano assassina animal de estimação!
O interessante da piada, além da brincadeira com o clichê futebolístico e preconceituoso, é a reflexão que podemos tirar das manchetes, afinal, nenhuma delas é mentira. O Pit Bull é feroz e também é um animal de estimação, porém ao escolher determinadas palavras o autor do texto acaba por revelar um determinado juízo de valor, ou seja, o fato não foi fabricado, como acontece com muitos fatos no campo do jornalismo esportivo, no entanto a forma de transmissão desse fato foi manipulada. Nenhuma escolha semântica passa incólume, cada palavra que usamos a escolhemos para servir às nossas convicções, ideais, ideologias e, principalmente, interesses.
Nestes últimos dias, período de eleição, podemos notar que as grandes instituições jornalísticas —rádios, TVs, sites e jornais—, estão preocupadíssimas em eleger seus candidatos preferidos, —é necessário dizer que a maioria prefere o mesmo candidato? Jornalistas, articulistas, colunistas, cronistas publicam em seus espaços tentativas de justificar suas escolhas eleitoreiras ou seria a tentativa de induzir o leitor? É como escolher um dos termos animal feroz ou de estimação e depois apresentar justificativas para isso.
Alguns argumentos utilizados por esses jornalistas é o fim da liberdade de imprensa, porém muitos se esquecem que o fim da liberdade de imprensa começa dentro da própria imprensa, vide o caso, mais recente, da colunista Maria Rita Kell que foi demitida por defender o Bolsa Família em sua coluna no Estado de São Paulo, outro foi a saída do jornalista Heródoto Barbeiro do comando do programa Roda Viva, da TV Cultura, por fazer uma pergunta ao candidato José Serra sobre os caríssimos pedágios das estradas paulistas, ainda na TV Cultura existe outro caso, mais antigo, a jornalista Salete Lemos foi demitida por justa causa do jornal noturno da emissora por criticar as tarifas ilícitas cobradas pelos maiores Bancos brasileiros. Há alguns meses conversando com um jovem jornalista, jovem no sentido estrito da palavra, sem a atribuição de um valor negativo como: imaturo ou inseguro, me confidenciou que duas de suas matérias foram recusadas por seu editor, uma delas, sobre problemas de uma escola estadual, porém ele conseguiria atribuir o problema, não me lembro qual era, a União, a outra não poderia ser publicada por falar mal de “nosso patrão”, o governo do Estado de São Paulo.
No dia 27/10/2010, vi a capa do jornal O Estado de São Paulo e não havia nenhuma manchete sobre o escândalo da vez: A paralisação das obras do metrô de São Paulo por denúncias de fraude na licitação da linha Lilás. O que isso prova? Que a imprensa vive sobre a ditadura ideológica de cada jornal ou emissora ou até mesmo da instituição patrocinadora desses veículos, só um exemplo o contrato do Governo de São Paulo com o Grupo Abril é de R$ 3,7 milhões. Resta saber se que ouvimos, lemos ou vemos são realmente opiniões de seus autores ou é apenas a ordem dos donos dessas instituições, porque sabemos que caso discordem não se manterão no emprego.
O jornalista Heródoto Barbeiro quando entrevistado, disse que a função da imprensa é ser neutra, porque ninguém é imparcial, pois, segundo ele, somos humanos e temos opiniões e convicções. Será que a imprensa de hoje é mesmo neutra ou está mais para cabo eleitoral?
O leitor atento e crítico tem ferramentas para diferenciar cada caso, no entanto de todos os leitores do Brasil, quantos são atentos e críticos?
Infelizmente hoje a grande mídia reflete o bipartidarismo da cena política brasileira. Político com rabo preso é encontrado aos montes, não que isso seja natural, não é, mas menos natural ainda é jornalista com rabo preso. Tenho que fazer justiça aos pequenos diários de bairro e sites independentes onde a neutralidade ainda existe e é perceptível, diante disso surge a questão nas grandes instituições jornalísticas há liberdade de imprensa?
Obs.: Todos os dados mencionados aqui são facilmente encontrados em uma rápida procura em sites busca ou de vídeos, exceto, é claro, o que contei por ter vivido ou ouvido, não mencionei nomes por colocar em risco o emprego de terceiros.