O pragmatismo político e o PT (ou “Ele rouba, mas faz”)
O novo presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, José Eduardo Dutra, admitiu, em entrevista publicada na edição do jornal “O Liberal” de 17 de fevereiro de 2010, que o PT, depois de 30 anos, transformou-se numa legenda PRAGMÁTICA. “Por questão de sobrevivência a gente não aceitava aliança. Em 2002 chegamos à presidência. Um Partido que chega a administrar amplos espaços de poder tem que entender e se adaptar à realidade. Não pode perder seus princípios, mas também não pode ficar amarrado no principismo”, declarou Dutra.
O pragmatismo é uma corrente filosófica que se originou nos Estados Unidos no século XIX que tem como fundamento para a aquisição do conhecimento a EXPERIÊNCIA. A realidade não é tomada como algo material e/ou abstrato – como descreveu boa parte da tradição filosófica ocidental até então -, mas como um conjunto de experiências. Logo, para melhor nos conduzir, precisamos entender essa característica relacional e prática do mundo. Um enunciado somente pode ser considerado como verdadeiro se, diante da experiência (do pesquisador e de outros), for o mais cotado para ser intuído como tal. A experiência é o critério a ser considerado a cada investigação científica ou em nível de senso comum. Esse paradigma filosófico caracteriza-se, pois, pela ênfase dada às CONSEQUÊNCIAS – utilidade e sentido prático – como componentes vitais da verdade.
Não podemos nos esquecer que essa “ética consequencialista” já tivera como expressivo representante, no período renascentista, o grande filósofo Maquiavel. Mas, neste caso, a preocupação com os fins da ação tinha como “pano de fundo” a necessidade de organização de um Estado fragmentado política e economicamente: a Itália.
No campo científico e filosófico, o pragmatismo é controlado pela comunidade acadêmica; no político, é enfiado “goela abaixo”. O útil e verdadeiro são ditados pelos detentores do poder sem que ninguém os conteste. Para nos convencer das escolhas feitas em nome dos jurisdicionados, utilizam, paradoxalmente, categorias absolutas de pensamento, como bem estar, prosperidade, progresso, felicidade, etc.
O discurso do presidente do PT evidencia claramente esse tipo de pragmatismo. Na política partidária brasileira existem duas entidades metafísicas que não se misturam: o Partido e o Governo. Aquele é, por natureza, essencialista, com princípios e tudo; este, por necessidade, é pragmático. O primeiro tem como fundamento o discurso; o segundo, a ação. Quando a prática não produz bons resultados, o discurso se encarrega de justificar; quando o discurso é desrespeitado, o é porque a prática assim o exigiu. Em outras palavras, o pragmatismo político brasileiro admite contradições e mentiras, desde que seja para o “bem do povo”.
Essas manobras são facilitadas porque o pragmatismo, antes de qualquer coisa, é uma teoria, e, como tal, é construído por meio de jogos de palavras, que, normalmente, estão a serviço de alguém. Na política, a manipulação desses instrumentos é prerrogativa de quem se dispõe a participar do “jogo do poder”. Como essa doutrina defende o desapego a referenciais absolutos, acaba, em alguns casos, instituindo certo tipo de relativismo moral, com o qual se justifica qualquer coisa. Eis a razão de a população possuir aversão à política partidária no Brasil. Não é fácil pensar numa realidade que se amolda, a cada momento, aos fins de determinada pessoa ou grupo social, como se fosse de toda sociedade. Isso ocorre porque a estrutura psíquica do homem ocidental ainda é constituída por princípios supremos (verdade/falsidade, realidade/ilusão, juto/injusto, etc.). Somos psicologicamente platônicos (ainda sonhamos com seres ideais), mas temos uma prática política pragmática, porém no sentido mais torpe que o conceito pode admitir.
O pragmatismo do qual José Dutra parece se orgulhar, por não possuir controle e oposição responsável em nosso país (ela é, normalmente, aliciada com cargos e dinheiro público) justifica qualquer tipo de prática. Direto, moral, ciência ou qualquer outro corpo de regras e princípios se subordinam aos interesses do “chefe” sem qualquer propósito coletivo. O certo e o errado são aquilo que os “inquilinos do poder” desejarem. Com esse pragmatismo volátil e conveniente é possível justificar a tolerância com os “mensaleiros”, aliança com partidos fisiológicos, palanques “duplos” ou “triplos”, condescendência com fraudadores de obras públicas, desrespeito aos Tribunais de Contas, indicação de “apaniguados” para tribunais superiores, apoio a países que desrespeitam acordos internacionais e normas de direitos humanos, perdão ou condescendência a políticos corruptos, etc.
O pragmático lula é, acima de tudo, um grande psicólogo. Percebeu que todo político que se preza precisa dar algo que o povo quer para ser adorado. Com políticas assistencialistas e incentivos fiscais para determinados setores da economia, mesmo à custa da dívida pública, ampliou o mercado interno causando a sensação de prosperidade. Ele sabe que televisão, geladeira, móveis e um prato de comida é o sonho de consumo da maioria dos brasileiros. Já em educação o investimento foi pífio, posto que o conhecimento não é algo objetivamente mensurável. Aquilo que não é tangível e reconhecido como um bem pelo conjunto da sociedade, não recebe a atenção prioritária dos políticos que se associam a esse raciocínio de resultados.
Na política tunipiquim não falta mais nada. Utiliza-se de uma corrente de pensamento para sustentar práticas abomináveis. Neste caso, pragmatismo tornou-se sinônimo de pilantragem e safadeza, sem a qual não se faz política em nosso país. A coisa é tão esdrúxula e, às vezes, até hilária, que na terra do açaí e do asfalto ainda se costuma definir as “virtudes” de um líder político local com um jargão bastante “pragmático”: “ELE ROUBA, MAS FAZ”.