O Município na Federação Brasileira

O Município, hoje, na Federação Brasileira, ocupa uma posição de destaque, cedida pela própria Constituição da República de 1988. Entretanto, embora se configure dessa maneira, ainda é um objeto de grandes discussões quanto ao seu vislumbramento como ente federado. Deve ser assim considerado, ou apenas como ente da federação?

Dentre os doutrinadores, diversas são as posições, contrárias e favoráveis, a esse vislumbramento. Isso porque alguns defendem que a própria Constituição não eleva o Município à categoria de ente federado, ao passo que outros afirmam o contrário, que a Constituição deixa clara qual a real posição do Município em nossa Federação.

Ao analisarmos nossa Carta Magna evidenciaremos, deveras, certa obscuridade. Partamos, então, do caput de seu primeiro artigo, que nos diz o seguinte: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito [...]”.

Quanto ao artigo supra, José Nilo de Castro , em palestra proferida no II Congresso Mineiro de Direito Administrativo, em 1997, afirmou que a “união” ali descrita significa apenas junção, que difere de “União”, da União Federativa.

Entretanto, observamos esse posicionamento um tanto insipiente, visto que o autor se prende principalmente à questão semântico-gramatical, não considerando que, se a República Federativa é formada pela união, ou junção, dos Estados, Municípios e Distrito Federal, logo, estes são entes federados.

Ora, o artigo 18 da Constituição, na própria disposição gramatical de seu caput, afirma que “a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios [...]” , e mais: “todos autônomos, nos termos desta Constituição.”

Como se vê, além de deixar clara a posição do Município como ente federativo, tal artigo concede-lhe autonomia. Como defendem os ilustres Celso Ribeiro Bastos e Hely Lopes Meirelles , por sua importância, o município deve ser considerado sim um ente federado.

Bom, se analisarmos bem a posição e a disposição da União e dos Estados, tanto na Constituição quanto na prática, chegaremos à conclusão de que tais entes não passam de mera abstração e que sua “existência” se dá apenas pela aglomeração dos Municípios, que são o que, de fato, existem e estão próximos ao povo, e o povo deles.

Entretanto, alguns autores, como José Afonso da Silva , afirmam que outro fator comprobatório de que o Município não pode ser considerado um ente federado é o fato de não possuir representação no Senado Federal, como possuem os Estados-membros.

Ora, tal pensamento se mostra equivocado, visto que o legislador, ao propor somente representação estadual no Senado, não quis transformar o Município em um mero ente da federação, mas, em uma posição sensata, não quis apenas onerar ainda mais os cofres públicos. Afinal, seriam no mínimo 5.561 representantes a mais.

Tal é a importância do Município que vários encargos e responsabilidades lhe são impostos, nem sempre de maneira legal e constitucional nem de cooperação, tão-somente pela incapacidade de os Estados e da União de cumprirem suas responsabilidades, sejam quais forem os motivos: má gestão, irregularidades etc., como nos mostra Antônio Carlos Andrada .

Aliado a isso, verificamos algumas outras características que fazem do Município um ente federativo, quais sejam:

• Não haverá intervenção no Município, salvo em casos especificados pela Constituição da República (art. 35).

• Goza de certa autonomia. Possui autogoverno e auto-administração.

• Tem os Poderes Executivo e Legislativo.

• Pode legislar de forma suplementar (art. 30, II, CR/88).

• Tem competência administrativa privativa (art. 30, III a IX, da CR/88) e comum (art. 23 da CR/88), além de competência tributária.

Portanto, embora seja enorme e, talvez, infindável essa batalha entre os doutrinadores, encontramos vários indícios constitucionais e fáticos de que o Município pode, sim, ser considerado um ente federado.