Uma do Vovozim
Provecto como é, sempre novidades amigas e antigas tem o Zé. E esse Zé, nascido em 1931, em Pitangui, é só um dos 3 Zés, filhos do casal Zé Rodrigues e Aurora Santiago, respectivamente o Zé Vovô e dona Lóia. Além dos três varões, houve duas moças também, Terezinha e Lourdes, já falecidas. E dos dois Zés remanescentes, o caçula, bem entrado nos oitenta, vive em Goiás, porquanto o Zé do Vô, reina no Beco dos Canudos, e passou a ser referido como Vovozim, pra simplificar pra você e pra mim.
Vovozim foi barbeiro por décadas a fio, de navalha, sem provocar desafio ou desvario que valha. Fez cabeças de gerações e, se se afastou da Velha Serrana foi por abdução, mas jamais indo além de Plutão, hoje planeta-anão. Sua memória é a crônica da cidade. A ser escrita, mesmo quando escrota.
Uma prova dessa incrível capacidade mnemônica está no fato de haver ouvido pelo rádio aos 13 anos o noticiário do fim da Grande Guerra, na casa do amigo Antônio Leal, o Tõe Cuié, a execução do Hino do Expedicionário, e tê-lo guardado de cor, tanto para declamação quanto para o canto...
E conta causos e mais causos sobre personagens urbi et orbe...com uma consistência narrativa que impressiona . Chega a repetir diálogos e reconstruir em micro-detalhes situações de mais de oitenta anos. E numa dessas belas matinas de novembro, contou-me essa história:
De tenra idade era muito observador e curioso. E garrado no pai. Sempre o acompanhando e perguntando a razão de tudo. A razão e o porquê...Não perdia por nada as visitas breves do pai a uma comadre Sinhana. E sentadinho ao lado do pai ouvia pacientemente o prosear mas, o que mais apreciava mesmo era fitar aquela mocinha Anita, tão linda, filha única, em meio aos rapazinhos, de dona Sinhana. Ela era bonita demais, ele me diz agora.
E numa dessas ocasiões, não resistiu, pôs-se de pé, e cochichou no ouvido do pai o seu deslumbramento com a moçoila...
O pai resistiu menos a confidencialidade do filho, e a traduziu de alto e bom som para a anfitriã...
E o melhor, deu-se em meio ao completo embaraço do menino Zé:
Anita levantou-se, veio em sua direção e decidida quanto afetuosa, de pura graça e contentamento, beijou-lhe o ruborizado rostinho...agradecendo o reconhecimento do óbvio...