Rapport
Em qualquer tipo de comunicação que precisarmos manter com alguém é necessário que o nível de harmonia entre o emissor e o receptor seja o melhor possível para que a mensagem não seja contaminada pela desconfiança. Em PNL, a atmosfera de confiança que se estabelece entre pessoas envolvidas em um circuito de comunicação é chamado de rapport. Quando não há um adequado rapport no circuito, a mensagem não encontra canal adequado de circulação e o seu conteúdo acaba se desviando e até se perdendo.
Rapport é uma palavra da língua francesa que significa harmonia, confiança, sintonia. Em comunicação significa “entrar no comprimento da onda do receptor,” ou seja, entrar em sintonia com ele, guiar-se no mapa interno dele, acompanhá-lo em seus processos neurológicos de construção de pensamentos e sentimentos.
Em outros termos, o rapport mede o nível de empatia existente entre as pessoas que estão se comunicando. Quanto mais fina for essa sintonia, mais eficiente será a comunicação.
A primeira providência a ser tomada por um bom comunicador é estabelecer um adequado nível de rapport com o público receptor da sua mensagem. Uma vez estabelecida essa ponte, ela precisa ser mantida aberta se quisermos que a comunicação seja eficiente. Quando ela é obstruída, diz-se que o circuito se rompe e a sintonia desaparece. Perdeu-se o rapport.
É o que acontece muitas vezes quando estamos conversando com alguém, fazendo ou assistindo à alguma palestra. Uma palavra mal colocada, uma inflexão de voz desagradável, uma postura corporal ambígua etc., quebra o rapport e parece que a pessoa com quem estamos nos comunicando, ou nós mesmos, saímos do circuito como se de repente não estivéssemos entendendo mais nada, ou então, tivéssemos ambos, emissor e receptor, se desinteressado do assunto.
Manter o rapport na comunicação é como dançar diante de um espelho. Por isso, mais importante que a linguagem falada, a manutenção da sintonia em um circuito de comunicação depende muito da linguagem corporal. Se eu estou falando e a pessoa desvia o olhar e começa a rabiscar alguma coisa em um papel, imediatamente já sei que ela não está prestando atenção ao que eu estou falando. É a mesma coisa se ela, por exemplo, levanta-se, começa a remexer-se com impaciência na cadeira, ou fica constantemente olhando o relógio. Ela não precisa dizer que não tem o menor interesse no que estou dizendo, mostrando ou fazendo. Ela está me dizendo isso com todas as letras da sua linguagem corporal.
Como já foi dito anteriormente, o significado da nossa comunicação é a resposta que ela recebe. Assim, se alguém, com sua linguagem corporal, demonstra que a nossa mensagem não está “entrando nos circuitos dela” é porque nós não estamos no cumprimento da sua onda. Não soubemos estabelecer sintonia com os canais de comunicação dela, que são os seus sentidos. Em conseqüência, eles não estão recepcionando de forma adequada a nossa mensagem. Ela desvia sua atenção para outras experiências internas ou externas, porque a informação que estamos lhe passando não interessa, ou a partir de certo momento, deixou de interessar.
A partir desse momento, sua mente começa a operar um processo de cancelamento ou de distorção. Ela não deixa a informação entrar, ou então a distorce. Em conseqüência, a resposta que ela nos dá não é aquela que esperamos, mas outra, bem diferente, que não tem nada a ver com o que pretendíamos comunicar. Isso ocorre freqüentemente em nossas salas de aula e o professor, geralmente, pensa que é o aluno que não quer aprender. E à vezes até toma esse comportamento como ofensa e deboche, entrando em conflito com ele.
Quando uma pessoa se desinteressa da nossa comunicação, das duas uma: ou fomos nós que não soubemos estabelecer o adequado rapport com a platéia ou, se chegamos a fazê-lo o quebramos de alguma maneira, com uma palavra, um gesto ou uma postura mal colocada no contexto da comunicação, ou mesmo uma informação que rompeu o encadeamento normal do assunto que vem sendo comunicado. Se o rapport não foi estabelecido, é necessário estabelecê-lo ou, se foi quebrado, tratar de restabelecê-lo, senão o resultado da nossa comunicação estará fatalmente comprometido.
Espelhamento
Existem técnicas apropriadas para se estabelecer e manter um bom rapport. Uma delas é a que, em PNL, se chama espelhamento.
Em terapia, o espelhamento é o termo utilizado para designar o sentimento do paciente em relação ao terapeuta, no sentido de que este último reflete o seu estado interior. O espelhamento promove uma sintonia emocional inconsciente e tácita, na qual emissor e receptor se reconhecem mutuamente.
Em PNL o espelhamento consiste numa espécie de acompanhamento da comunicação não verbal da pessoa com quem estamos nos comunicando. Se ela cruza as pernas, nós fazemos o mesmo. Se ela respira profundamente, nós a seguimos nesse comportamento. Se olha para os lados, ou franze o cenho, nós a acompanhamos nessas posturas, se muda o tom de voz, nós também mudamos, se respira profundamente, nós acompanhamos a sua respiração, se gesticula, nós também gesticulamos e assim por diante.
Enfim, tudo que ela faz, em termos de postura, gestos, olhares,
nós procuramos acompanhar, duplicando esses comportamentos. Com isso, estamos entrando no mapa neurolingüístico dela, através de posturas que a sua mente inconsciente reconhece, porque são semelhantes aos que ela pratica. E como se o inconsciente da pessoa dissesse: “ hei, essa pessoa é legal, ela se parece comigo”.
É assim que a empatia é estabelecida. As pessoas “percebem” inconscientemente que estão no mesmo comprimento de onda conosco e começam a se sentir bem em nossa companhia. Nós não costumamos falar ou sentar de determinada maneira se estamos diante de um padre, uma pessoa mais velha ou uma criança? Não mudamos a forma de falar, de andar, gesticular, etc. se estamos tratando com alguma autoridade, ou em uma entrevista para um emprego, por exemplo? Quando tentamos consolar uma pessoa, não procuramos ajustar o nosso tom de voz, os nossos gestos, aos dela, para mostrar um tom de solidariedade?
Pois é, o que estamos fazendo, nesses casos, é puro espelhamento, só que é um espelhamento inconsciente, no qual estamos procurando nos adaptar ao ambiente e ao estado interno das pessoas o melhor possível, para não parecer que somos estranhos invadindo o mundo delas.
O espelhamento é uma atividade natural praticada pelo nosso cérebro emocional. Fazemos isso naturalmente embora não nos apercebamos disso. Crianças, por exemplo, fazem isso o dia inteiro. Duplicam as posturas e os comportamentos dos adultos e das outras crianças automaticamente. Fazemos isso com os nossos heróis, ídolos, pais, professores e pessoas significativas para nós. Isso ocorre não só com a linguagem corporal, mas também, e com mais freqüência, com a linguagem verbal. Nunca lhe ocorreu ficar repetindo frases, palavras, entonação de voz e outras manifestações verbais de alguma pessoa que você admira? Pois isso nada mais é que espelhamento.
Espelhar as pessoas é uma técnica muito eficaz para estabelecer
rapport. É claro que isso deve ser feito de uma forma muito sutil, para que elas não percebam e pensem que estamos imitando-as. Se isso acontecer, o resultado será o pior possível. Elas poderão pensar que estamos debochando delas e a partir daí nenhuma comunicação será mais possível.
Dale Carnegie, um dos pioneiros da literatura de auto-ajuda, tinha como hábito, ao conhecer uma pessoa, procurar em suas características físicas, ou na sua postura, uma qualidade digna de elogio. Uma forma característica de olhar, que podia lembrar um amigo, um parente, uma inflexão de voz que lembrasse um artista do qual a pessoa gostasse, uma pessoa das relações dela, uma postura qual quer que recordasse alguém dela conhecida, enfim, algo para conectar com uma imagem agradável ao indivíduo que ele acabara de conhecer. [1]
Identificadas essas características – forma de olhar, de sorrir, de arrumar os cabelos, de franzir as sobrancelhas, de falar, gesticular, etc. – passava a reproduzi-las sutilmente, de forma que o indivíduo não o percebesse conscientemente, mas “sentisse” a semelhança, e com isso, a ligação que havia entre eles. Fazia isso também com as posturas da própria pessoa. Era uma forma interessante de “ancorar” simpatia, que funcionava muito bem, segundo aquele autor.
Carnegie afirmava que nunca deixou de encontrar uma característica em alguém, fosse quem fosse, que não merecesse ser duplicada. Isso o colocava num estado de total empatia para com a pessoa, fazendo-a sentir que estava conversando com um velho amigo, ainda que tivesse acabado de conhecê-lo.
O espelhamento é uma técnica que também tem se mostrado muito eficaz na terapia conjugal, como bem mostra Coleman.[2]
Os cônjuges repetem as queixas do parceiro, utilizando as mesmas palavras e tentando reproduzir o mesmo tom de voz, as mesmas inflexões, as mesmas posturas, buscando duplicar, não só o sentimento, mas também o pensamento que o gerou. Essa estratégia tem como finalidade fazer com que um “sinta” o que o outro estava sentindo quando fez as queixas. É uma forma interessante de “calçar os sapatos alheios”, que, segundo aquele autor, funciona muito bem.
É bom que se explique, entretanto, que não estamos falando aqui do chamado “camaleão social”, ou seja, aquela pessoa que procura se amoldar a um ambiente que lhe é hostil, muitas vezes fazendo um esforço danado para ficar à vontade, falando coisas nas quais não acredita, concordando com outras com as quais realmente discorda, adotando posturas que internamente abomina, etc. A técnica do espelhamento não é um exercício de tortura psicológica, ou uma picaresca prestidigitação, na qual a pessoa se violenta para amoldar-se a um meio que não é o seu. Pelo contrário, trata-se de um exercício de acompanhamento de processos neurológicos, cuja execução pode ser muito interessante e prazerosa, pois torna o convívio social mais agradável e natural, já que ele não é praticado a nível de convenção social, mas sim de relacionamento interpessoal.
Como já referido, o espelhamento pode ser feito quanto à lin-
guagem falada ou corporal. Por isso, é muito útil observar como a pessoa se porta. Observar seus gestos, como cruza os braços, como olha quando está escutando, como gesticula quando fala, como move os olhos, como respira, como franze a testa, como contrai o rosto, como sorri, qual a entonação de voz, quando ela muda de tom, etc.; depois treinar em fazer o mesmo e observar o resultado. Eis algumas informações úteis que podem nos ajudar a fazer um bom espelhamento.
̶ Pessoas orientadas predominantemente pelo sistema visual constroem frases usando os verbos ver, figurar, imaginar, vislumbrar, ler, observar, focar, iluminar, brilhar, focar, etc, que são ações ligadas ao sentido da visualização. A linguagem corporal inclui fala rápida e respiração com a parte mais alta do peito, voz com tom um pouco mais alto que o normal, mais aguda, às vezes nasalada; a postura física apresenta certa tensão nos ombros e no abdome. Seus olhos se movimentam bastante, sempre procurando visualizar o conteúdo de informação. Quando estão analisando alguma coisa, costumam jogar os olhos para cima e quando estão tentando lembrar-se de algo, os olhos são dirigidos para baixo.
̶ Pessoas predominantemente orientadas pelo sistema auditivo constroem frases usando muitos verbos ligados ao sentido da audição, tais como, ouvir, soar, dizer, falar, afinar, trovejar, harmonizar, retumbar, etc. As características mais notáveis na linguagem falada delas são a fala modulada, pausada, nítida, seguindo sempre uma mesma tonalidade; quanto à linguagem corporal, apresentam respiração regular e profunda, diafragmática. Fisicamente, apresentam uma tensão muscular equilibrada, costumam cruzar mãos ou braços enquanto ouvem. Tendem a pender levemente a cabeça para os lados como se estivessem concentrando sua atenção nos ouvidos e movimentar os olhos para a direita e para a esquerda, conforme estejam analisando ou buscando memória de alguma informação.
̶ Pessoas orientadas predominantemente por cinestesia costumam construir frases com verbos que expressam sentimento, movimento, ação. São verbos do tipo, fazer, sentir, pegar, seguir, andar, bater, correr, pesar, esquentar, esfriar, etc. Seu modo de falar costuma ser rápido e sem pausas entre as frases. A tonalidade da voz tende para o agudo. Quanto à postura corporal, em geral, conservam os músculos tensionados, as mãos sempre em movimento, os olhos passeando de um lado para outro, para baixo e para cima, buscando memórias e exemplos já vividos para julgar a informação recebida. Geralmente mantém os ombros retos e com freqüência suas pernas estão sempre fazendo algum movimento, mesmo quando elas estão sentadas. .[3]
Acompanhamento
Não podemos nos esquecer que o oposto da empatia é a antipatia. E entre as duas mora a indiferença. Entre antipatia e indiferença eu não sei o que aborrece mais uma pessoa quando ela está tentando se comunicar com alguém. De qualquer modo, a presença de uma ou de outra, ou de ambas é sentença de morte para qualquer tentativa de comunicação.
Uma importante regra de comunicação, que ajuda a criar empa-
tia entre partes em um circuito de comunicação é a técnica conhe -
cida como acompanhamento.
Acompanhar significa seguir a pessoa nos caminhos neurológicos que ela trilha para construir sua comunicação, durante algum tempo, até estabelecer com ela um vínculo de empatia e confiança mútua. A regra aqui é não contradizê-la nem interromper o processo neurológico que ela está desenvolvendo, fazendo com ela se retraia e comece a opor resistência à nossa comunicação.
Palavras como mas, contudo, todavia, entretanto, que indicam adversidade, devem ser evitadas no processo de acompanhamento, da mesma forma que posturas que indicam indiferença, enfado, discordância, cinismo, incredulidade, etc. As vezes, um simples menear de cabeça, um bocejo, um franzir de testa, um simulacro de sorriso ambíguo, ou de deboche, com o canto da boca, um cochicho com a pessoa que está ao lado, posturas essas até inconscientes para o receptor, pode quebrar o “rapport”. E uma vez quebrado é muito difícil restabelecê-lo.
Aqui estamos falando de empatia no caso específico da comunicação, mas é sempre bom lembrar que a empatia está na raiz das mais profundas questões psicológicas e morais, como bem observou John Stuart Mill, ao descrever os sentimentos das pessoas quando estabelecem suas interações econômicas, sociais e afetivas. Essa constatação não é estranha se pensarmos que a empatia nada mais é que a capacidade de “sentir o sentimento alheio”; e nessa condição ela é uma qualidade que está na base da piedade, da solidariedade, da caridade, da confiança, da aceitação mútua e da compreensão, que, por sua vez, são elementos imprescindíveis da liga moral que resulta nos sentimentos mais íntimos que ligam as pessoas, que são a amizade e o amor.[4]
Por fim, é importante não esquecer o seguinte: as pessoas não se guiam pelo mesmo mapa do mundo que nós. E elas, por mais errado que nos pareçam ser os seus caminhos, sempre estarão, em princípio, dispostas a defender com unhas e dentes as suas próprias escolhas.
Cada pessoa tem sua forma própria de orientar o processo neurológico que está na raiz de suas respostas e estas são dadas conforme a montagem interna que elas fazem desse processo. Principalmente, não devemos nos esquecer que as escolhas de uma pessoa geralmente estão fundamentadas em crenças, convicções e valores que ela adquiriu em suas experiências de vida e adotou como critérios para “julgar” a informação que recebe. Contrariá-los, logo de início, é eliciar a sua resistência, pois a mente tende sempre a defender o “eu” que se hospeda em seu mapa de mundo. Afinal, esse “eu” é a sua personalidade e ninguém gosta de vê-la contrariada nem agredida.
Ao acompanhar uma pessoa em sua comunicação você está procurando ver o mundo da forma que ela vê, caminhando com ela pelos caminhos internos da sua mente. Acompanhar uma pessoa neurologicamente é uma estratégia extremamente refinada em comunicação.
Não se consegue conduzir ninguém se primeiro não formos capazes de acompanhá-los por um bom pedaço de caminho. Talvez por isso Jesus tivesse dado aos seus discípulos aquele genial conselho, que pouca gente entendeu até hoje: “Se qualquer um te obrigar a andar com ele uma milha, vai com ele outras duas”. Isso quer dizer: Acompanhar, acompanhar, para, em certo momento, passar a conduzir, eis uma regra básica, não só para a boa comunicação, mas também para a função que dela deriva, a liderança.
E principalmente para a vida, pois vivemos em sociedade, e ninguém conseegue ser feliz em total solidão.
[1] Dale Carnegie (1888 — Nova Iorque, 1955) foi um escritor e orador norte-americano, pioneiro da literatura de auto ajuda e treinamento empresarial no setor de comunicação. Autor de best-sellers como Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas e Como Evitar Preocupações e Começar a Viver, exerceu tanta influência entre os empresários americanos que chegou a ser conselheiro de vários líderes mundiais. Foi pioneiro na prática das técnicas de PNL, que seriam desenvolvidas academicamente três décadas mais tarde por Bandler e Grinder.
[2] Daniel Golemam- op. citado, pg. 160.
[3] Essas posturas foram observadas pelos criadores da PNL, Richard Bandler e John Grinder, e também têm sido confirmadas por outros estudiosos do tema, como Robert Dilts e Tod Epstein. Ver, a esse respeito, Joseph O’Connor e John Seymor; “Introdução à Programação Neurolingüística” – 1990, Ed. Summus.
[4] Na imagem o filósofo inglês John Stuart Mill (1806-1873), grande defensor do liberalismo e das liberdades públicas. Suas ideias no campo da economia, política, ética e moral são ainda hoje muito respeitadas.