NÃO LEVEIS DUAS TÚNICAS

“Não leveis pelo caminho (...) nem duas túnicas...” (Jesus em Mt 10-10)

Na minha casa de origem como em várias casas havia um quartinho onde guardávamos coisas que não tinham uso no momento presente mas que poderiam ter uma serventia futura. Era a famosa máxima: “um dia posso precisar!”. E acabava que essa máxima dava sustentação para a crença de que realmente era importante guardar coisas. E guardávamos, de carretel à Televisões queimadas.

E não eram poucas. Ferramentas do meu avô que nunca usamos. Restos de canos, fios, tomadas, pisos velhos, roupas, um paletó xadrez do meu avô, discos velhos, livros, cartões, convites, lembranças de igreja, tampas de caneta, pregos, parafusos, porcas, ganchos, tachinhas, dentre outras coisas, várias outras coisas, e uma ponta de ferrão de tocar gado. Isso mesmo uma ponta de ferro para se prender numa vara usada por vaqueiros na hora de conduzir uma boiada.

Certa vez meu pai, já aposentado, separava juntamente comigo umas quinquilharias dessas e no vidro de pregos, parafusos, porcas e porcarias achamos esse tal ferrão de tocar gado. Quando o indaguei sobre o que vinha ser aquilo, antes que papai me explicasse minha mãe passou por nós e numa sentença declarou: _ Joga isso fora Doca, não há serventia mais. E meu pai furioso disse que não iria livrar-se do objeto. Indagado pela minha mãe se ainda voltaria a lidar com gado naquela altura da vida, não hesitou em dizer que sim já irritado. Nunca me esqueci dessa cena. E sempre que me lembro do tema desapego recordo disso. É uma ancora muito bem instalada em minha mente.

Como herança de costumes, também tenho meus apegos a minhas quinquilharias, que hoje, depois do casamento diminuíram bastante. Mas confesso que me desfazer de certos objetos ainda me causam dor. Diga-se de passagem quando soube que meu irmão Gabriel havia doado meus vinis guardados na casa minha mãe a um amigo seu fiquei inerte. Quando me perguntou se eu me importava, já havia dado ao rapaz e eu sem graça disse que não me importava. Mentira das grossas, ainda hoje me recordo com pesar dos vinis que juntei com apreço e carinho. Alguns até eram relíquias. Mas foram-se. Melhor assim.

Desapegar-se realmente é algo que custa alguns trabalhos interiores na grande maioria das pessoas, inclusive a mim. A algum tempo já venho praticando o desapego a coisas, objetos. Já me desfiz de mais da metade de meus livros, bem como a papeis, roupas, calçados e outras coisinhas mais. Um outro tipo de desapego que venho estudando em mim e observando em pessoas, são os apegos imateriais.

Apegos imateriais tem a ver com títulos, cargos, situações de vida que uma hora ou outra mudarão. Hábitos que nem sempre trazem bons resultados. Hábitos e costumes que um dia tiveram serventia mas que no momento presente ou atrapalham ou nada trazem de bom. Quero me ater a dois apegos imateriais neste artigo: os medos ligados ao ego e aos resultados do que planejamos.

Quando perdemos nossa auto referência que é o EU nos atemos ao objeto referência que é o EGO. Deepak Chopra nos explica bem essa questão :

“Na experiência do Eu, chamada auto-referência, nosso ponto de referência interior é o espírito e não aquilo que nos rodeia. O seu oposto é o objeto-referência, cujo ponto de referência interior é o ego. Na experiência do objeto-referência nos deixamos influenciar pelo que acontece fora de nossa natureza interior; pelas situações, circunstâncias, pessoas e coisas. Neste estado, buscamos incessantemente a aprovação dos outros; nossos comportamentos antecipam-se a toda resposta, porque fundamentam-se no medo. No objeto-referência, nossa tendência é querer controlar as coisas, ter necessidade de poder externo. Todas essas situações – necessidade de aprovação, de poder externo, de controle das coisas – estão baseadas no medo. Esse tipo de força não é a da potencialidade pura, o poder do Eu, o poder real. Se experimentamos o poder do Eu, não há medo, não há compulsão para o controle, não há esforço para obter aprovação, ou para conseguir o poder externo.”

“No estado do objeto-referência o ego está em primeiro lugar. Mas, ele não expressa o que você realmente é. O ego reflete apenas a sua auto-imagem, a sua máscara social, o papel que você representa. Sua máscara social necessita de aprovação, de controle, de apoio no poder, porque você vive com medo.”

“Se o verdadeiro Eu – que é o seu espírito, sua alma – está livre dessas coisas, é imune à crítica, não teme desafios, não se sente inferior a ninguém. Mas, também é humilde. Não se sente superior porque reconhece que todas as pessoas representam o mesmo Eu, o mesmo espírito, com diferentes faces.”

“Essa é a diferença essencial entre auto-referência e objeto-referência. Na auto-referência você experimenta seu verdadeiro Eu, que não teme desafios, respeita todas as pessoas e não se sente inferior a ninguém. O auto-poder é, portanto, o verdadeiro poder.”

“Já o poder assentado no objeto-referência é um falso poder. Por estar fundamentado no ego, ele existe enquanto existir o objeto referência. Se você tem muito dinheiro, ou um título, um cargo importante – presidente de um país, presidente de uma empresa – esse poder tão apreciado desaparecerá juntamente com o dinheiro, com o título ou com o cargo. O poder baseado no ego, portanto, termina quando acabam essas coisas. Assim que desaparecem – seja o título, o cargo, ou o dinheiro – o poder também desaparece.”

“O auto-poder é permanente, porque está fundamentado no conhecimento do Eu. O auto-poder tem características próprias. Ele atrai não só as coisas que você deseja, como as pessoas que possam lhe interessar. Magnetiza as pessoas, as situações e as circunstâncias que alimentam seus sonhos, apoiando-se nas leis naturais. É também o suporte da divindade que se encontra num ser em estado de graça. É tão intenso esse poder que você encontra prazer em se ligar às pessoas e elas a você. É o poder do vínculo – vínculo originado do amor verdadeiro.”

Assim o apego as coisas ligadas ao EGO podem um dia se acabar e com ela deixarmos nos levar pelo desespero que os símbolos do EGO implicam em nos, no que somos e na forma como nos relacionamos com as pessoas. Portanto o desapego nessas questões fazem um bem enorme para nosso crescimento como pessoas, em nossa evolução.

Já o outro apego imaterial, o apego aos resultados. Novamente retomemos aos ensinamentos de Deepak Chopra em sua sexta lei espiritual do sucesso: a Lei do distanciamento.

“Segundo esta lei, para se conseguir qualquer coisa na natureza é preciso desistir do apego a ela. Isto não significa desistir da intenção de criar um desejo. Abandona, apenas, o apego aos resultados.”

“É uma atitude muito poderosa. No momento em que você desistir do seu apego aos resultados, misturando simultaneamente, intenção unidirecionada com distanciamento, terá tudo o que deseja. O distanciamento permite alcançar qualquer coisa porque ele se baseia na sua crença inquestionável no poder do seu verdadeiro Eu.”

“Já o apego está baseado no medo e na insegurança – a necessidade de segurança está fundamentada no desconhecimento do verdadeiro Eu. A fonte de riqueza, de abundância, de qualquer coisa no mundo físico é o Eu. É a consciência que sabe como satisfazer todas as necessidades. O resto é simbólico: Casas, carros, contas bancárias, roupas, aviões. Os símbolos são transitórios; eles vêm e vão. Perseguir símbolos é como instalar-se no campo e não nos territórios. Isto cria ansiedade e acaba levando você a se sentir vazio e oco por dentro, porque está trocando o seu Eu pelos símbolos do Eu.”

“O apego vem da pobreza de consciência, porque o apego é sempre pelos símbolos. Distanciamento é sinônimo de consciência rica, porque ele oferece a liberdade para criar. O envolvimento com distanciamento cria alegria e felicidade. Dessa forma, os símbolos de riqueza são alcançados espontaneamente, sem nenhum esforço. Sem distanciamento, somos prisioneiros da impotência, da desesperança, das necessidades mundanas, das preocupações triviais, do desespero mudo, da falta de humor – traços distintivos de vida medíocre e de consciência empobrecida.”

“A verdadeira consciência é a habilidade de ter tudo o que se quer, na hora que se quer, no mínimo esforço. Para viver esta experiência você tem de estar apoiado na sabedoria da incerteza. Na incerteza, você encontrará a liberdade para criar o que quiser.”

“As pessoas buscam constantemente segurança. Você descobrirá que buscar segurança é, na verdade, uma coisa muito efêmera. Até o apego ao dinheiro é um sinal de insegurança. Você poderia dizer: “Quando eu tiver milhões de dólares, estarei seguro, serei financeiramente independente e poderei me aposentar; aí poderei fazer o que realmente desejo”. Mas isso nunca acontece –nunca acontece.”

“Aqueles que buscam segurança perseguem-na por toda a vida e nunca encontram. Ele é sempre ilusória, efêmera, porque a segurança nunca pode vir só do dinheiro. O apego ao dinheiro criará sempre insegurança, por mais que você tenha no banco. De fato, as pessoas que têm mais dinheiro são as mais inseguras.”

“A busca de segurança é uma ilusão. Para a tradicional sabedoria ancestral, a solução para esse dilema está na sabedoria da insegurança, ou na sabedoria da incerteza. Isso quer dizer que a busca da segurança e da certeza é, na verdade, um apego ao conhecido. E o que é ele, afinal ? O conhecido é o nosso passado. O conhecido nada mais é que a prisão dos velhos condicionamentos. Não há uma evolução nisso – absolutamente nenhuma. E, quando não há evolução, há estagnação, desordem, ruína.”

“A incerteza, por sua vez, é um terreno fértil para a criatividade e para a liberdade. Incerteza significa entrar no desconhecido em todos os momentos da nossa existência. O desconhecido é o campo de todas as possibilidades, sempre frescas, sempre novas, sempre abertas para a criação de novas manifestações. Sem a incerteza e o desconhecido, a vida seria apenas uma repetição viciadas de memórias velhas. Você cairia vítima do passado e o seu torturador de hoje é o que sobrou de você ontem.”

“Renuncie ao seu apego ao conhecido, entre no desconhecido e você estará no campo de todas as possibilidades. A mera disponibilidade de entrar no desconhecido lhe oferecerá a sabedoria da incerteza que há nele. Isto significa que em todos os momentos da vida você terá excitação, aventura, mistério. Experimentará a diversão da vida – a magia, a celebração, o contentamento, a exultação do seu próprio espírito.”

“Poderá, então, diariamente, procurar a excitação do que acontece no campo de todas as possibilidades. Se você experimentar a incerteza, estará no caminho certo – por isso não desista. Não é preciso ter uma idéia pronta e acabada do que você vai estar fazendo nas próximas semanas, ou no ano que vem, porque se você já sabe o que vai acontecer e se apega a essa idéia, abre mão de toda a gama de possibilidades.”

“Uma das características do campo de todas as possibilidades são as correlações infinitas. Esse campo consegue reger uma infinidade de eventos no tempo-espaço para conseguir os resultados pretendidos. Mas, quando você está apegado, a sua intenção fica presa num rígido espaço mental. Assim, a fluidez, a criatividade, a espontaneidade inerentes àquele campo se perdem. Quando você se apega a uma idéia pronta, o seu desejo, antes fluido e flexível, fica congelado numa estrutura rígida que interfere em todo o processo de criação.”

“A lei do distanciamento não interfere na lei da intenção e do desejo no estabelecimento de um objetivo. Você continua com a sua intenção de seguir uma certa direção, ainda tem um objetivo. Entretanto, entre o ponto A(onde estou) e o ponto B (onde quero estar)há infinitas possibilidades. Graças à incerteza dessas infinitas possibilidades, você poderá mudar de direção no momento que encontrar um ideal maior, que descobrir algo mais excitante. É também improvável que você force a solução de problemas, pois isso irá impedi-lo de estar alerta às oportunidades. A lei do distanciamento acelera todo o processo de evolução. Quando você entende esta lei, não se sente compelido a forçar soluções. Se você forçar a solução de problemas, só vai criar novos problemas. Mas, se dirige a sua atenção para a incerteza e observa essa incerteza enquanto espera a solução emergir do caos e da confusão, o que aparecer será fabuloso e excitante.”

“O estado de alerta – a prontidão para o presente, no campo da incerteza – encontra o seu objetivo e a sua intenção, o que permite a você aproveitar a oportunidade. O que é a oportunidade ? Ela está contida em todos os problemas que você tem na vida. Em cada um desses problemas está a oportunidade de um benefício maior. Com essa percepção você se abre para toda a gama de possibilidades – o que preserva o mistério, o encantamento, a excitação, a aventura da vida.”

“Todo problema pode ser visto como uma oportunidade de benefícios maiores. Fica-se alerta para as oportunidades de benefícios quando se está assentado na sabedoria da incerteza. E quando a prontidão encontra a oportunidade, a solução surge espontaneamente.”

“O resultado disso é o que se chama comumente de “boa sorte”. Sorte nada mais é que a prontidão e a oportunidade caminhando juntas. Se as duas estiverem misturadas à observação atenta do caos, daí emergirá benéfica para você e para todos os que estiverem ao seu redor. Essa é a perfeita receita do sucesso. Ela está baseada na lei do distanciamento.”

Desapegar é um desafio. Exige coragem, força de vontade, consciência plena de seu estado atual e do desejado bem como disciplina. Principalmente se o apego for imaterial. Pense nisso!

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GLEISSON MELO - Master Coach Sistêmico.

Atendo pessoas individualmente bem como a empresas auxiliando-os em processos de mudança e aperfeiçoamento. E-mail: gleissoncoach@gmail.com / atendimento@institutolapidar.com.br

Gleisson Melo
Enviado por Gleisson Melo em 02/03/2015
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