Nazismo no palco

O Estado de S. Paulo entrevistou Zakk Wylde (21/06, páginas C1 e C3), guitarrista da banda de heavy metal Pantera. Na conversa, ele falou sobre a sua banda Zakk Sabbath, que é um tributo ao Black Sabbath, sobre a saúde de Ozzy Osbourne, entre outras coisas. O repórter também o questionou sobre músicos que “se posicionam politicamente” e citou o colega de banda de Wylde, o vocalista Phil Anselmo, como um exemplo.

Segundo o jornal, a resposta de Wylde foi: “Bem, se é isso que eles querem fazer… Quer dizer, estamos nos preparando para tocar algumas músicas do Zakk Sabbath, então estou apenas me certificando de que acertei as letras”. Se o repórter estivesse falando sobre posições políticas dentro do campo democrático, a “esquiva” de Wylde poderia ser compreendida e respeitada.

O problema é que o “posicionamento político” manifestado por Anselmo foi o nacional-socialismo. Durante um show em 22 de janeiro de 2016, ele fez saudação nazista e gritou “white power!” no palco. Esse acontecimento foi chamado de “um dos dias mais negros da história do metal moderno” pelo jornalista Matt Mills, da revista Metal Hammer.

Posteriormente, Anselmo pediu desculpas. Mas suas “justificativas” foram pouco convincentes. Em comentário a um vídeo postado no Youtube, que o mostra fazendo o sinal de lealdade a Adolf Hitler, ele disse que a apologia ao nazismo era, na verdade, uma “piada interna” sobre ter bebido vinho branco nos bastidores do show. Todavia, Robb Flynn, do Machine Head, que estava no evento, disse que “não havia vinho algum”.

Em outro vídeo, o mesmo em que ele se desculpou, Anselmo reafirmou a narrativa da “piada”. Depois o vídeo foi retirado do ar.

Em entrevista meses depois do vídeo deletado, ele afirmou que o gesto nazista foi - vejam só - uma “resposta” a acusadores na plateia que o chamavam de racista. Qual a melhor maneira de reagir a acusações de racismo? De acordo com Anselmo, fazendo saudação de supremacista branco. Uma ideia brilhante.

Com tudo isso posto, é relevante retornar à entrevista de Wylde e questionar se a resposta do guitarrista (“se é isso que eles querem fazer…”) foi uma postura infeliz. A meu ver, foi. Diante de uma questão cuja resposta é fácil e óbvia - ou seja, abominar o comportamento nazista -, Wylde optou por “lavar as mãos”, isto é, não assumiu a responsabilidade de criticar o colega de banda.

Além disso, a resposta de Wylde sugere algo pior: se o companheiro de banda quiser fazer propaganda nazista no palco, o guitarrista fará vista grossa, pois mais importante é “acertar as letras”?

O nazismo é hediondo. O repúdio a essa ideologia totalitária deveria se sobrepor a qualquer constrangimento que Wylde pudesse sentir com eventuais críticas feitas a Anselmo. Ao evitar comentar o infame acontecimento, o músico não fugiu de uma "polêmica”, como sugeriu o Estadão. A apologia a uma doutrina racista e genocida é muito mais grave do que uma mera “polêmica”.

Infelizmente, essa postura de Wylde é comum no heavy metal. É como Matt Mills diz: “O fato de que os fãs de metal não conseguiram concordar em condenar Anselmo por suas ações (nem identificar que não foi um erro único passível de desculpas como um erro bobo) representa o pior desta comunidade”.

RoniPereira
Enviado por RoniPereira em 22/06/2024
Reeditado em 23/06/2024
Código do texto: T8091576
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