A Central do Brasil
Andei nas ruas,
contei meus passos e as dobras que a calçada tem.
Gritei teu nome,
dobrei esquinas e na multidão não reconheci ninguém.
Vivi a tarde e a noite inteira
afinal, quem não vive frequenta o tempo de bobeira.
E eu fui muito mais além.
Espalhei meu sonho tóxico
Roubei a garota e a amante do próximo
Te fiz promessas
e te vendi falsas esperanças.
Dei bala e carona estranha ao teu filho
Mudei a direção da idéia que arranhava o trilho
Ensinei crianças como se fosse adulto
e agora elas separam sílabas batendo palma
quase que como se pedissem comida
Comprei com silêncio o som da vida.
Você deita a noite cansado e aflito
Sabendo que toda ideologia é um partido político
E se sente, bela e fera ancestral
a mistura de qualquer macaco com neanderthal
todo meio errado de se mudar destinos
com a vergonhas nuas igual teus primos.
Você homo sapiens duplo,
hetero, branco, católico, viril e sexual
que muda direções com a sua teoria da simpatia social,
se acha esperto, de terno, engravatado, bonito e correto.
Vai pro serviço e acha que sabe de tudo, eu sei.
Protege o rabo e brinca de criar lei
e no final do dia julga quem deve.
E nos viadutos, caminhos submersos dos pedestres
se mostram as cavernas, com seus grafites rupestres
avisando sobre a nova propaganda eleitoral.
Comprei meu pedaço de céu nessa terra de ninguém
onde os asfalto faz progresso, e o Estado diz amém.
Mais cuidado criança, bicho papão, aqui sai do armário
e a Central do Brasil é só um atalho.