Cinquenta anos sem Leonard Warren - um senhor barítono
Cinqüenta anos sem
Leonard Warren - Um senhor baritono...
Eurico de Andrade Neves Borba
Seu nome era Leonard Warren. Nasceu em 1911. Estudou canto na Itália. Faleceu em 1960, cantando “La Forza del Destino”, de Verdi, no palco do Metropolitan Opera House, em Nova Yorque. Estreara, em 1939, também cantado Verdi, em “Simon Bocanegra”.
Seu Rigolleto, no papel principal da ópera, era precioso. Seu Conde de Luna, no Il Trovatore, era soberbo. Seu Tonio em Il Pagliacci, inesquecível. Encantava.
Warren apresentou-se na época áurea da ópera – de 1946 até o início dos anos de 1980 – grandes cantoras, excelentes cantores, apoiados por tecnologia teatral inigualável de cenários, de iluminação e de acústica. Havia um mercado operístico... Hoje o publico escasseia, os espetáculos são caros para a montagem exigente dos cenários e da indumentária. Cantou com Maria Callas, Renata Tebaldi, Ana Mofo, Leontyne Price, Monserrat Caballé, Gigli, Tagliavini, Cappucili, Peerce, Bjoerling, Del Mônaco. Era um prazer imenso ouvi-los – poesia, música, canto e teatro juntos, coordenados por maestros exigentes, Túlio Serafin à frente, para homenagear o belo, como só a ópera sabe e pode fazer. Um momento civilizacional impar. Restam-nos as gravações.
Só o escutei em reproduções antigas e na não mais existente Rádio Difusora de Porto Alegre que, lá pelos anos de 1950, apresentava programas líricos da melhor qualidade. Vi algumas fotos suas – sorriso contido, olhar penetrante, cabelos bem penteados.
A bela mulher e maravilhosa soprano, Renata Tebaldi, com quem contracenava na noite em que faleceu, dizia que Warren tinha “voz aveludada e era verdadeiramente estupendo...”. De personalidade forte discutia com os colegas a interpretação teatral, com os maestros os andamentos das partituras, com os cenógrafos as concepções dos cenários, com seus agentes sua programação. Não era figura simpática nos backstages...
Se sua voz me fascinava, sua morte, no palco do Met, em plena interpretação, encheu meu coração de jovem amante e estudioso do bel canto de magia indescritível. Suprema glória para um ator, para um cantor – a tragédia levada ao ápice pelo desempenho adicional, que não constava do libretto... Morrer cantando. E cantando, até o fim a ária que se inicia com as palavras proféticas, como se constataria logo a seguir: -“Morir! Tremenda cosa! Si intrépido, si prode, ei pur morrà...”. Encerra as frases, a estrofe, para, olha o chão, pede ajuda e cai. Pouco depois morria vitima do derrame cerebral violento que o acometera. O espetáculo se encerra. O mundo da ópera veste luto e escreve mais uma pagina de dramática beleza. Silencia a orquestra, fecha o pano, apagam as luzes, permanece, no entanto, o canto do barítono que lembramos com saudades.