Moda-ALGODÃO DOCE
Dedicado àqueles que trabalham com moda ou mais especialmente em fiações e tecelagens.
ALGODÃO DOCE
Autor: Luiz Bento – Maio 1983
Doce Algodão do meu coração,
Que me veste, que me envaidece.
Meu peito reveste e à minh’alma aquece.
Doce Algodão do alto verão,
Do Nordeste, do Sudeste de Goiás.
Ou do Norte de Minas Gerais
Do Coração do agreste, do Centro Oeste,
Do pleno sertão do meu irmão
Cuja plantação e produção,
Passa pela mão do trabalhador peão.
Algodão no ninho, algodão carinho,
Tanto quanto linho, amassadinho.
Algodão que acaricia fibra macia,
Algodão mercadoria, fibra da alegria,
Que se transforma, que dá forma, que contorna.
Em pluma, enfardado,
Prensado, descaroçado,
Vai para o batedor, sem dor,
Nas cardas pardas, fita ou pavio,
Vibra o algodão no cio, em forma de fio,
Como se vida tivesse, como se triste estivesse.
Sensação que estremece, extasiado emudece,
Vendo a máquina que tece.
Rola Algodão do meu sertão,
No braço forte do peão
Nas frias maçaroqueiras, bobinadeiras.
Atrevidas retorcedeiras, urdideiras, engomadeiras,
Bate, bate, tecelão, operação torção,
Transformação, subdivisão em titulos mais nobres,
Ou mais pobres
Como na sociedade, das classes sociais,
Daqueles que querem mais
Ou daqueles que querem demais.
Bobinadeiras, retorcedeiras, espuladeiras certeiras,
Mulheres rendeiras, fiandeiras matreiras,
Belas e faceiras, feiticeiras,
Ouça, algodão do meu coração, este samba canção !
Este Hino de amor, esta nota com louvor.
Deste eterno sonhador, aprendiz de Vendedor.
Transforma-te algodão, na experiente mão,
Do humilde tecelão, ou da ex-camponesa,
Em títulos de nobreza, dividendos da riqueza,
A riqueza da nação, do algodão guardeão.
Na classificação da produção,
Do nobre artesão, do trabalhador tecelão,
Na firmeza ou na certeza, que dias melhores virão,
Com a fibra do sertão.
Querido algodão, do artesão tecelão,
Da grande cidade, da produtividade,
Com passividade, com exigida qualidade.
Para a exportação,
Ou para o industrial da confecção
Da Bermuda ou do Roupão,
Camisa ou camisão, calça ou calção,
Da cueca samba-canção.
Da Bandeira da nossa Nação
Ou do time do coração
Chora algodão do meu coração,
Que te quero, que te espero, sempre moderno.
Tu és eterno, apesar da Importação,
Do Governo trapalhão,
Fibra natural, que vira “tergal”.
Não faz mal.
Com elastano, vira outro pano.
No corpo profano, me deixa insano.
Salve algodão, do meu coração,
Do Industrial da tecelagem
Que projeta a sua imagem
No corpo que encanta, que espanta, que canta,
Que amarrota que desbota,
Que torce, retorce, no corpo da sereia.
Presa na teia, da minha mente feia.
Navalhado, branqueado, cozinhado,
Chamuscado, lavado, secado, flanelado ou lixado,
Amassado ou estampado, enrugado, crepado,
mercerizado, calandrado, amaciado, sanforizado,
Julgado, enrolado, rotulado, embalado.
Salve algodão do meu coração, do meu sertão,
De múltiplas cores, da mamãe Dolores,
Dos listados, bolados, geométricos ousados,
Dos florais, que adornam os lençóis dos casais,
Apaixonados, enamorados
Ou as festas juninas de São João,
Do sertão do tecelão ou do peão.
Salve algodão do meu sertão,
De estilistas prendados, criativos, viajados.
Respeitados, consagrados, idolatrados,
Muito bem remunerados,
Que o leva à mesa de corte, para um recorte,
Para um novo modelo que assente ao pêlo
Doce algodão, do meu coração,
Transformado em pano, pelo tecelão cigano.
E pelo artista insano,
Eis que finalmente, belo, imponente,
Serás novamente,
Surrado esfregado e amassado
E finalmente, será um trapo arruinado.
Velho abandonado, num canto jogado.
Doce algodão do meu coração,
Sua transformação foi em vão e...
Em breve, amigão, serás pano de chão.