AFINAL, TUDO É... POESIA ?!

AFINAL, TUDO É... POESIA ?!

"...é o demônio de maxwell /

deus termodinâmico ?! (...)

é o acaso todo de branco

na curva do meridiano ?

HAROLDO DE CAMPOS (trechos)

Me parece que tudo o que se escreve -- antes com caneta e caderno ou, agora, com PC e digitando -- é ou seria Literatura, isto vale para o iniciante, para o "badboy" que rabisca paredes com o seu nome ou apelido e/ou para quem se dedica a produzir textos, "mensagens na garrafa" que alguém lerá um dia, se o Autor tiver sorte. Apenas tenho a sensação que nem tudo deva ser POESIA, ainda que ruim. Está no âmago da "Poesis" grega falar ao coração, ao espírito; fazer-nos "ouvir estrelas" ! Se o poema "fala ao cérebro" (?!), nos exige examiná-lo, "traduzí-lo", descobrir (ou tentar) seu significado, "o que quer dizer AQUILO", perde-se o elo entre Autor e leitor, a "GESTALT", citavam nos anos 1970.

Se eu preciso questionar: 1) quem é Maxwell e porque tem 1 demônio ? e, 2) o que faz o Acaso num meridiano qualquer que, suponho, nem curva tem, alguma coisa está errada ! (*1) Recentemente me veio às mãos obra do famoso Oswald de Andrade, poemas ou, melhor dizendo, "coisas" que pretendia fazer valer como poesias. (*2) A meu ver, "um desastre"... boa parte era a descrição crua de imagens fugazes, lembranças "arrumadas em versos", à guisa de Poesia. O livro quase todo era uma crítica aguda aos poetas parnasianos, tratados como PÁRIAS da Literatura "moderna"; me refiro aos pessoal da escandalosa "Semana de Arte de 1922", na terra da garoa, que nem garoa mais tem.

Ora, se crédito cabe aos rimadores melosos (e melodiosos) afeitos ao Parnasianismo foi o de terem "criado" -- numa visão sinuosa de minha parte -- o CONCRETISMO. Sim, senhores, os que detestavam SENTIMENTO como "tônus", a ALMA do poema, inventaram o seu inverso, o oposto total: um apanhado de "frases" desconexas, a ridicularização da RIMA (tão combatida) agora empregada "em cataratas", em palavras sem nenhuma ligação entre elas, quase fazendo PIADAS enquanto "poemas modernos". E não mudou NADA em cem anos... esse "contorcionismo" supostamente literário -- "ENGENHARIA" que produz "enigmas" que nem o Autor saberia explicar -- continua intacto.

O que seria um... "deus termodinâmico" ?! Um ferro elétrico, um chuveiro, talvez um micro-ondas, se já existisse quando o "sósia" de Paulo Coelho produziu o seu "Concretão" de 800 e tantas páginas, em 1984 ?! O que se vê/lê atualmente -- neste século 21 de tantas novidades -- é um "meio termo" entre a Poesia convencional (ou tradicional) e os exageros e a "avacalhação" surgidos a partir dos tais Concretos. Lembro ainda do curioso "poema-imagem", iniciado lá pelos 1800 com Cruz e Souza, salvo engano. Poesia em forma de CRUZ (?!) falando de... cruz, cruzeiro, claro ! Os "diluidores", copiadores oportunistas, recriaram versões mil: letrinhas onduladas para falar de mar, em forma de arbusto ou flor, passarinho e por aí vai... até página "em branco" para ilustrar (?!) um esquisito "Poema Branco" !

Admiro o atual "poema livre", contudo me espanta a "ginástica gramatical" (mais do que literária) de quantos enveredam por tal "estilo" de escrita. Me pergunto se eles saberiam realmente EXPLICAR o que pretendiam (ou imaginaram) dizer "com aquilo". Ainda assim, é bem melhor que [ler] um poema CONCRETO fiel a "estética" dos antigos fundadores paulistas.

O jornalista Elias Ribeiro Pintos, de Belém -- "rebatendo" Affonso R. de Sant'Anna -- sai em defesa dos Concretos, a "Concretada" toda, mas (e há sempre 1 MAS) admite que 1) a "coisa" ENTOPE (?!) o cérebro; 2) "...situa-se na fronteira entre PROSA e poesia" (sem ser nenhuma, acrescento) e 3) "...o Concretismo foi vítima da própria camisa de força em que se forjou poeticamente, (...) até QUASE ABOLIR o verso". (in DIÁRIO DO PARÁ, de 15/16/março de 2025, pag. 12, cad. VOCÊ)

Não, caro leitor, estimada "leitriz" dessas mal traçadas linhas, eu não li os baluartes da "Semana de 22", nem os "menestréis" de 1972 e certamente não lerei os "concretóides" de 2022, se os houver. Ainda prefiro os legítimos e antiquados Parnasianos... e "gosto não se discute" !

"NATO" AZEVEDO (em 16/março de 2025, domingo, 2hs da madrugada)

OBS: (*1) - ainda que se admita certos textos como Literatura (?!), o Concretismo, "a grosso modo", não se impõe como poesia e nem como PROSA. Fica num meio-termo impreciso, pouco claro, uma "mistificação". Mas há quem goste !!!

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ADENDO AO TEXTO -- este artigo tem 1 "continuação", surgida depois. Sugiro ler também o "MURILOSCOPIA - CONCRETISMO TOTAL", aqui neste mesmo espaço.

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(*2) - Recentemente (em 4/abril de 2025, no DIÁRIO DO PARÁ, pag. B12) o jornalista Ruy Castro produziu quase um libelo contra o "concretóide" OSWALD DE ANDRADE, "pai" ou no mínimo "tio" da tal novidade, a Poesia Concreta. Reproduzo abaixo os termos "mais suaves" em relação ao escritor, do qual não gostei nem um pouco na única vez que o li ! (NATOAZEVEDO)

ANTROPOFAGIA PREDATÓRIA (trechos)

Durante seus 64 anos de vida (1890-1954) Oswald de Andrade fez do mundo um circo, com ele no centro do picadeiro. No começo, foi um sucesso. Mas o mundo passou de ano e cansou de assistir ao mesmo show -- frases de efeito, trocadilhos, insultos, brigas, reconciliações oportunistas e mais brigas. Nos dez anos anteriores à sua morte e nos primeiros dez que se seguiram, ninguém lhe deu bola. Em 1964, exumado pelos concretistas, Oswald foi entronizado como gênio rebelde e incompreendido. (...)

Dezenas de livros celebram suas lendas, em maioria disseminadas por ele próprio, 30 anos depois dos fatos e adotadas sem verificação. (...) Pela narrativa de Lira Neto (que não esconde sua admiração pelo autor), há muita coisa sem explicação em Oswald. Homofobia, racismo, rancores ciclópicos contra ex-companheiros, ingratidão (com Blaise Cendrars, de quem pegou a prosa telegráfica e o poema-piada) e um renitente copidesque de sua história sem apoio na realidade. (...)

Filho do talvez maior latifundiário urbano de São Paulo, viveu de vender os inesgotáveis terrenos e prédios que herdou em 1919, hipotecando-os, negociando com Bancos, credores e agiotas e bajulando poderosos para sair de encrencas. Aliás, a leitura de seu "Diário Confessional" confirma isso. No fim, o antropófago devorou a si mesmo.

RUY CASTRO (jornalista e escritor, membro da ABL)