A CUNHAGEM DA POESIA

Entendo que o poema na forma manuscrita psicologicamente está inscrito nos meandros da emoção, conquanto ainda não exista como concretude de peça de arte, exceto no âmbito discutível da poesia visual.

Atualmente sempre peço que me enviem o poema digitado. Antes era a técnica datilográfica uma de minhas escolhas de notório encantamento.

Bem, voltemos à tradução desse encanto que a Palavra sugere.

Parece-me, ao tempo do rabisco inicial, que a mente ainda não liberou o escrito (que o autor pretende poema) para o voo solitário capaz de encantar o leitor.

Fico coerente, aliás, com o que venho dizendo há mais de vinte anos: a garatuja recém-nascida é matéria inanimada até passar pelos olhos ávidos do leitor. É o poeta-leitor quem lhe dá vida.

Trata-se apenas de um intenso desejo de que o escrito contenha Poesia, trazendo à casa da palavra momentos explicitamente instigantes até o entendimento, se tal for possível àquele que vem de fora com a vontade irrepreensível de sonhar e curtir a subversão da linguagem cotidiana pautada pela estética do Belo.

Não esqueças de que o poema é a materialidade da Poesia e ele muito dificilmente a encontra num primeiro instante.

O rabisco é apenas o primeiro registro do espanto e magia do que é abstrato e para o devido entendimento ele necessita adquirir concretude, de modo a sugerir e chegar através da palavra à nova linguagem: a que o figurativo imagético imanente à Poesia proporciona.

É deste vezo que consigo constatar a Poesia exsurgindo da palavra, vale dizer, o poema ainda adentrado, porém emergindo dos escaninhos da caverna psíquica da criação.

É a letra de forma que sinaliza a pele da larva da borboleta ainda no casulo da criação.

Também é o primeiro sinal de que ela poderá colorir suas asas para o voo imagético, revoluteando o ritmo e a periferia concreta escondida sob as pálpebras afoitas do leitor ávido de beleza e musicalidade.

MONCKS, Joaquim. FAZIMENTOS DA PALAVRA. Obra inédita em livro solo, 2024.

https://www.recantodasletras.com.br/escrivaninha/publicacoes/preview.php?idt=8198491