O CHARCO ESTÉTICO

Sabes? Acho que a metáfora vertical ou profunda é quem causa este meu encanto para com a Poesia e o poema, sua materialidade formal. Ali, nascendo dentre as palavrinhas, ritmo e imagens, voeja o Mistério e o seu poder de encantamento. Eu sou apenas seu humilde servo, o arauto da mágica nascida em seus abismos.

A metáfora horizontal ou rasa passa batida em meus sentires, pouco me chama a atenção.

Com o decorrer do tempo e a descoberta de novas vertentes do mistério nos territórios da Palavra em seu vestir de “singeleza e lucidez enternecidas”, humilde e sábia, a Poética impregna-se com perceptível clareza, fruto de estudo e dedicação, e, enfim, a vislumbro propícia a um melhor entendimento e mais e melhor fascinam os enclaves do hermetismo, a ponto de alguns exigirem de mim a convivência com o enigma quase sem nenhuma inquietação ou angústia.

Afinal, a codificação e o sentido conotativo da linguagem levam à imagética, devido à transmutação dos signos. É por estes recantos da emoção e seus significantes que a palavra ganha significados e se ampliam os efeitos da palavra poética.

Neste território estético é que se encontram os mais lindos exemplares de flores da linguagem. É este o Belo que atrai e comove quem mergulha nas nuances da morada do Ser.

Dia desses vou à região amazônica só para admirar a vitória-régia e seu largo espectro de cores e florações. Mesmo que distantes, ainda no entorno dela, creio, estão assentados alguns dos meus buliçosos duendes da infância que, uma que outra vez, me visitam.

Esses sapecas abençoados dos lodaçais esverdeados, enlameados de riscos, em algazarras e risos, por vezes mesclados de assombros e medos, libertos nos rios, arroios, riachos, igarapés, rizomas banham-se descaradamente no meu insólito sangue neuronal, abençoados pelas retinas.

E, a cada vez que a vida ameaça se esvair em liquidez de finitudes, estas arrobas de reminiscências de histórias não esquecidas, por certo darão de comer aos peixes, ramagens, tubérculos, cascudos, muçuns, lambaris, carás, lagostins-do-barro, iguarias proletárias que saciam a boca sempre esfomeada dos tinhosos ribeirinhos.

São nesses camalotes entremeados de ovos e girinos que se vivificam e consumam os capilares inquietos da bendita flor Esperança-do-Dia-Seguinte.

MONCKS, Joaquim. CONVERSA DE HOSPÍCIO. Obra inédita em livro, 2024. Revisado.

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