Mostra Literária de Charqueadas:

cidade e cidadãos em prosa e verso

    

Por Rosilane Goulart Rocha, escritora, psicóloga e professora, mestre em Educação Profissional 

 

Nesta semana, depois de 11 anos, o Sarau Literário volta a ocorrer em Charqueadas, em sua oitava edição. Espaço de partilha, divulgação e construção de saberes sobre a literatura local, oportuniza igualmente a reflexão sobre outro evento ligado à prática literária já ocorrido por aqui: a Mostra Literária de Charqueadas, publicação que reúne textos de diferentes gêneros de autores locais e que teve como objetivo inicial oportunizar a divulgação desta produção.

           

No entanto, passados 23 anos do lançamento do primeiro livro da Mostra Literária, pode-se considerar outros aspectos do seu alcance, na medida em que seu conteúdo, embora de temas universais, traz igualmente tópicos específicos referentes à cidade, sua origem, sua história, espaços físicos, práticas econômicas e sociais, bem como personagens e sentimentos inspirados em moradores e situações típicas da cidade.

           

Considerando-se a intersecção entre história e literatura, justamente no que estas têm em comum, a narrativa, pode-se considerar as Mostras Literárias, corporificadas em quatro volumes, uma importante contribuição também para a preservação da história e da identidade da cidade, narrada pelos olhos dos autores e preservada ao longo do tempo através do registro escrito.

 

A produção literária certamente não tem como função registrar fatos verídicos, no entanto, traz em seu bojo a verdade de quem escreve, na medida em que um autor não escreve nada a partir de nada. Dito de outro modo, toda produção artística, e a literária não foge disso, nasce a partir da reflexão do autor acerca da realidade que o cerca, ele próprio sendo, de certa maneira, atravessado por esta mesma realidade, nada produz que não traga, de alguma forma, traços de sua própria constituição.

 

No caso específico dos textos selecionados para compor os quatro volumes, é possível identificar com muita clareza este fato, uma vez que são moradores produzindo literatura local, eivada de afetos, sentimentos, paisagens, lembranças e, muitas vezes, fatos ocorridos e que são narrados a partir da vivência de cada um neste espaço histórico-geográfico. Assim, pode-se dizer que é uma narrativa em prosa e verso sobre a cidade e seus cidadãos, traçando uma bela colagem, colorida em diversos tons, constituindo-se num rico mosaico que, mesmo não comprometido com a verdade histórica, traz, intrinsecamente, uma verdade literária, com a qual os leitores podem facilmente se reconhecer de algum modo, uma vez que os textos falam de um lugar comum a todos, possibilitando uma identificação fluída e real.

 

A arte, sem dúvida, nos humaniza. Mas quando se fala de produção local, ela igualmente propicia o estreitamento dos laços e a constituição de uma identidade, pois é composta de elementos comuns pertencentes a um mesmo espaço. Assim, a contribuição da Mostra Literária em seus quatro volumes, acaba por ultrapassar o objetivo inicial, constituindo-se numa prática cultural ocorrida num determinado tempo e hoje inserida na história do município.