O mito de Narciso

Narciso, um herói grego, tem uma interessante história que relata o amor ao belo e também da vaidade. Exatamente isso, amor ao belo, e ao mesmo tempo, outra faceta, a vaidade. É um mito que retrata a admiração de um jovem por usa própria imagem às margens de um lago. Segundo consta na lenda, o filho do deus Cefiso e da ninfa Liríope era extremamente belo e atraía a atenção de todas as ninfas. Uma delas, Eco, apaixonou-se por ele, mas, por não ter seu amor correspondido, jogou sobre ele uma praga. E a praga foi apaixonar-se pela sua própria imagem.

Pois bem, o que se pode extrair do mito de Narciso é, primeiramente, a excessiva vaidade. A tradição diz que Narciso apaixonou-se por sua própria imagem, mas, obviamente, não teve seu amor correspondido. Na psicologia, esse quadro deu origem ao narcisismo, que é um transtorno de admiração em excesso pela própria imagem.

Se analisarmos bem o mundo atual, veremos que essa admiração pela própria imagem ganha contornos sombrios, já que a busca pela imagem ideal tem levado pessoas a fazerem inúmeros esforços, muitos até questionáveis. Muitos até perdem a vida nessa busca pela beleza ideal. É a vaidade no seu mais sórdido efeito. Já outras pessoas, por não conseguirem atingir aquele ponto, entram em depressão. Dois casos graves, que mostram que o excesso de amor ao externo, à imagem, pode destruir uma vida. A vaidade em excesso não constrói, só destrói. Como no mito, onde Narciso morre por tanto admirar-se, pessoas igualmente morrem, em busca de satisfazer uma vaidade.

Basta ver o que diz a moda, os padrões ditos aceitáveis, e veremos que muitas pessoas sofrem em razão desses padrões. Não poderiam tais padrões ser apenas um modelo? Não poderiam surgir outros modelos para outras situações? Não poderiam ser apenas relativos, longe de serem ideais? Não pode a indústria da moda flexibilizar seus padrões e alargar o espectro da dita beleza? Não poderia essa beleza ser só relativa, apenas mais dentre tantas outras formas de se buscar o belo?

Por outro lado, podemos pensar ainda que o mito de Narciso aponta para a busca do belo. Ora, Narciso afeiçoou-se apenas pela aparência externa. Essa era sua busca. Esqueceu-se de que há algo mais do que uma simples imagem. Esqueceu-se de que o amor, que era sua busca, requer mais do que imagem. Ele prendeu-se e perdeu-se nisso. A busca do belo é mais do que a busca pela imagem ideal. Aliás, a própria arte mostra ou deveria mostrar isso, a busca do belo não se prende só à imagem. Há outras formas de se admirar o belo, através da música, da poesia, da literatura, da reflexão. Essa deveria ser uma das mais importantes características da arte, a busca pelo belo.

Por óbvio, aqui não é espaço para fazer um tratado sobre os mitos gregos, nem fazer um estudo profundo de psicologia. No entanto, em poucas palavras, é possível descobrir que os mitos gregos são sempre presentes, atuais, pois eles exploram temas que fazem parte do cotidiano. Entender esses mitos clássicos é abrir uma porta para entender a própria alma humana. E, no caso aqui exposto, é um convite para entender o que é o belo e qual é o limite sadio da vaidade.