O BELO IDEALÍSTICO

Aristóteles (*) preleciona, em seu tratado de Arte Poética: “Poesia só conta o que poderia ter acontecido.” Vale dizer, não relata fatos, e sim a farsa imagética criada, o Belo nem sempre possível, mas passível de ser sentido. O material forjador da Poesia é a fantasia, a farsa, o imaginário, o sonho, o relato criativo sobre um ato e/ou um inusitado acontecimento, de modo a que se consiga traduzir a sua emocional urdidura em palavras, que, em vez de os relatar ou contá-los tim-tim por tim-tim, ocorra o envolvimento do poeta-leitor com esta tradução da qual ele é parte integrante. O poema, como materialidade do gênero literário Poesia, é, enfim, um processo emocional/intelectivo simbiótico: uma associação intimista e profunda entre o poeta-autor e o seu receptor. E é este que dará curso e extensão à proposta prenhe de conceitos e sugestões. Desta maneira, cada leitor amplia ou minimiza aquilo que é inicialmente mera sugestão, através das imagens que fixa e cola à proposta original, fruto da simbiose desejada e havida. O que há de se ter em conta quanto ao pensamento aristotélico apresentado em sua Arte Poética, é no sentido de aclarar, de que fique assente que a ocorrência na realidade, isto é, no mundo dos fatos, não se destina a ser objeto de tradução pela Poética, e, sim, pela Prosa, tendo por suporte a capacidade racional e intelectiva. Sim, e como tal, na cabeça do poeta-leitor reconstrói-se algo que não é propriamente tangível ou palpável, porque pertencente ao território do idealístico, daquilo que é fruto da criação, da inventiva. Enfim, ao se falar de poética e do poema, estamos a navegar no âmago do pensamento. E tudo o que nasce dele não tem medição, não tem tamanho, somente aquele e este que surge, algo capaz de ser sentido como toque interior, mas que só exsurgirá ao plano do real na medida em que o patamar de sugestão seja tão forte que se consiga tornar materializado por ações e atos humanos verazes e capazes de atuarem como elementos transformadores da realidade fática. E, novamente me vêm à memória a lição do padre Vieira: “palavras sem atos são tiros sem balas, atroam, mas não ferem.” Muitas vezes o belo idealístico-estético causa comoção, alumbramento ou estupor, grande surpresa, espanto, assombro, sem que isto haja sido previsto na relação polarizada: autor e leitor. Enfim, a palavra não tem limites de grandeza no receptor. É este que lhe dará o devido vigor e dimensão. Insistamos no criar, assim o mundo se renova e passa a ser passível de alterações a nosso favor e que nos levem, no mínimo, a um bem-estar que nos pareça a Felicidade recém-chegada numa lufada de vento.

(*) Aristóteles, intelectual grego visto como um dos fundadores da filosofia ocidental (Estagira, 384 a.C. – Atenas, 322 a.C.), “foi o primeiro filósofo a consagrar todo um tratado, ainda que incompleto, ao exame do fenômeno poético, a “ARTE POÉTICA”. Ele se propunha a refletir acerca do objeto estético, ou antes, acerca da criação do objeto estético. Em Arte Poética, o filósofo trata da arte poética a partir de duas perspectivas, a definição da poética como imitação e a apresentação da estrutura da poesia de acordo com suas diferentes espécies. No primeiro caso, reduz a essência da poética à imitação – que crê ser congênita no homem. A sua importância, contudo, deriva do fato de que a mimese é capaz de fornecer ao ser humano, dois elementos essenciais: prazer e conhecimento. A Poética, provavelmente registrada entre os anos 335 a.C. e 323 a.C. (Eudoro de Souza, 1993, p.8), é um conjunto de anotações das aulas de Aristóteles sobre o tema da poesia e da arte em sua época, pertencentes aos seus alunos escritores (para serem transmitidos oralmente aos seus alunos) ou esotéricos (textos para iniciados). Fonte: Wikipédia.

– Do livro inédito OFICINA DO VERSO: O Exercício do Sentir Poético, vol. 03; 2015/19.

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