O AMADURECIMENTO DO TEXTO
O mais importante, nos teus jovens e lindos anos, não é a deliberada intenção de fazer poemas, e sim tratar de conhecer a linguagem, bem como o que a tua juvenil vivência propõe no mundo dos fatos. Agora, sim, é que vem à tona a tarefa mais difícil: tentar traduzir em palavras esteticamente bem encadeadas, vocabular e gramaticalmente, o que constatas no dia a dia, e que te causa estranheza, fascínio ou indignação. Sem primeiro procurares saber e/ou conhecer o idioma, de nada adiantará teres inspiração capaz de produzir o poema ou o texto em prosa poética. Então, anote-se: o trabalho verbal deve ficar, no mínimo, 100 (cem) dias de "molho", cozinhando no fogo lento do cadinho de reflexão, para então vir a ser revisado para os devidos fins: publicação na virtualidade ou na folha de impressão. Enfim, ganhar forma definitiva, ao menos para este primeiro momento. Não exponhas o teu talento ao ridículo. Ele é uma das coisas mais preciosas que guardas em teus alforjes. As pessoas que leem o texto não te irão falar, porém farão a crítica negativa, destoante, se descuidares da forma e/ou do formato do escrito, muito especialmente do conjunto de ideias e/ou fatos tidos, havidos ou criados, que são traduzidos pelas palavras que o compõem. As exigências formais e estéticas para o poema (com Poesia) são muito maiores do que as que são exigíveis e condizem com o jogo textual prosaico. Por ora é isso o que tens de ter cuidado. Muita cautela com o que jogas à rua para ser palavra com vigor e capacidade para impressionar favoravelmente o receptor. Uma coisa é a vontade de colocar as ideias na rua, no mundo fático, outra, ainda que correlata, é fazer isto com competência e vitalidade estética. Não te queima junto aos leitores, correto? Necessitas obter condições práticas e algum pouquinho de técnica, a fim de poderes criar o texto ou o poema. Até mesmo os gênios necessitam auxiliar a sua genialidade artística a se manifestar. Tenhas em conta que, para escrever o poema com Poesia, necessitas mais do que apenas sensibilidade, porque o texto poético se faz com palavras, não é somente o afloramento daquilo que provém docemente do coração, ou seja, da distensão de teus dotes emocionais. Digo isto para estimular a juventude a que se proponha a novos itinerários no criar talentosamente. Acredito e fico encantado com as cucas juvenis e seus dotes como espíritos criativos formatados de novas ideais e ideias expendidos pela palavra bailando em prosa e verso. O que tiver de vir é tudo a partir dessas ingênuas iniciativas de observação do mundo circundante. Mas é o que por ora podes contribuir, porque em literatura, e especialmente em Poética, nada nasce pronto, tudo é fruto de longos dias e noites de sedimentação de ideais fortes e proposições capazes de subverterem o ardente cadinho que nos move ao encontro do semelhante. Por antagonismos quaisquer podem se tornar empecilhos e acabam socavando fragorosamente alguns ideais puros e singelos, que tudo aquilo que ocorre no entorno se torna risível e descartável, ainda mais na contemporaneidade, a que Zigmunt Bauman taxou como “modernidade líquida”; tempos de instabilidade e volatilidade. A vida corre rápida em nosso tempo de terceiro milênio. Quem lê, e faz disso prazer e gozo por refração dos atos e fatos, percebe que o mundo pode ser mais amplo e abrangente do que nos parece ser a uma primeira vista. E que os significantes e os significados são faces de uma mesma moeda. É necessário ler para crer o que pode ou não o signo verbal. Também porque aos lerdos e dorminhocos o eventual sucesso não socorre. Tudo é resultado de trabalho, dedicação, pertinácia.
– Do livro inédito OFICINA DO VERSO: O Exercício do Sentir Poético, vol. 02; 2015/19.
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