METÁFORA, A GRAVIDEZ DAS PALAVRAS

Acaso queiras saber se um texto (cujo poeta-autor pretenda seja exemplar em linguagem poética) está formalmente elaborado, podendo vir se constituir numa obra esteticamente bem aquinhoada, procura identificar as figuras de estilo que tomam corpo na peça textual em exame, especialmente as metáforas. Poesia é linguagem em sentido conotativo, e esta é agregada ao conjunto textual exatamente pela presença das figuras de estilo, de retórica ou de linguagem, como são mais comumente tratadas. Sem estas, não há como chegar ao poema – que é a materialidade da Poesia – na modernidade ou na contemporaneidade formal, em que predomina o pós-modernismo. Nos tempos do classicismo eram o haicai, o acróstico, a quadra, a trova literária, a sextilha, a décima, e, já vão mais de setecentos anos, predomina solenemente o soneto como representante do formato tradicional. Poder-se-á constatar, também, que estamos diante de exemplar em prosa poética e/ou apreciarmos um poema em prosa, ou até uma especificidade doce, romântica, muito do agrado do naipe feminino, a que chamo carinhosamente de “recado ou bilhete amoroso”. E este, em regra pode consistir de um ‘quase-poema’, vale dizer, versos que constituem uma peça textual em que não se encontram os elementos constitutivos e caracterizadores da peça poética em que efetivamente comparece o gênero literário Poesia. O recado ou bilhete amoroso pertence genericamente à expressão poética, mas não o devemos aceitar nem o confundirmos como for uma peça que contenha a Poesia como gênero literário autônomo, único. É conveniente perceber que a Poética açambarca a Poesia e a Prosa Poética, e as duas consistem numa singela proposta, convite ou sugestão representada pela verbalização que o autor lavrou no conjunto verbal, resultando num convite para que o leitor, entrando no (seu) universo, faça uma reflexão sobre o tema ou temática que o conjunto textual propõe. Entretanto, no exemplar verdadeiramente poético (com a presença da Poesia), constata-se a utilização do sentido conotativo, nunca de uma linguagem clara ou derramada, sem nenhum código verbal que leve à criação de imagens, a que denominamos imagística ou imagética. Neste espécime – o poético – o seu autor utiliza palavras com maior ou menor índice de codificação de linguagem, o que invariavelmente exigirá várias leituras a fim de que o receptor melhormente o compreenda, justamente devido ao aparecimento das imagens que as metáforas sugerem e efetivamente criam na cabeça do poeta-leitor. A metáfora é a subversão do sentido original ou genuíno do vocábulo. Através da metaforização, a palavra adquire novo significado. No gênero literário Poesia, as metáforas denominam-se polivalentes, verticais ou profundas. Na Prosa Poética – que é uma espécie híbrida formada pela conjunção estética da prosa e do verso – elas são denominadas de monovalentes, rasas ou superficiais. A presença de cada uma das especificidades referidas atesta ou representa maior ou menor codificação do texto, respectivamente. O bom poema tem de estar grávido. Vale dizer, a palavra em Poesia carece da metáfora, a fim de que, com a utilização dos vocábulos, diga por si mesma dos sentidos que propõe, e assim possam se multiplicar para o deleite dos leitores frente à riqueza estética e interpretativa. O restante, sim, este é por conta do que o poeta-leitor tem para contribuir na interpretação do texto e o seu imanente contexto. Este rico processo se dará a partir do talento e do patamar de leitura do receptor, que é um passante apressado convidado a pensar e a refletir sobre a matéria da vida e, por vezes, o seu papel neste contexto.

– Do livro inédito OFICINA DO VERSO: O Exercício do Sentir Poético, vol. 02; 2015/19.

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