AO SABOR DAS PALAVRAS

Em Poética, a síntese vocabular sempre há de ser muito expressiva, tem de dizer muito, daí a comunicação codificada em singelos versos que nem chegam graficamente ao final da linha – de margem a margem – como é o que comumente ocorre no formato prosaico. A singeleza verbal é o que a faz estranha, no universo da linguagem. Essa estranheza provém do Mistério – o único que realmente produz Poesia. E este, nunca sabemos de onde provém, porém sentimos sua existência através da invulgar materialidade de linguagem com que se apresenta no contexto. O possível "grande significado" pertinente à peça poética, depende do entendimento e da compreensão, enfim, do que vai na cabeça do poeta-leitor. Da dimensão de sua massa cerebrina e de sua afeição para com o Outro e/ou para com o coletivo, traduzido pelo universo dos significantes e significados que dela promanam. Talvez por essa razão é que Poesia, no dizer do mestre Armindo Trevisan, é "a lucidez enternecida". Enfim, o lírico amoroso precisa dizer muito com poucos vocábulos e, por vezes, colocar ingenuamente uma genuína pitada do gosto de infância, como queria Quintana. E tudo acontece de maneira assaz curiosa, porque a lucidez da criação poética é que vai escarvar o universo emocional do seu anônimo leitor, produzindo a comoção. Sim, porque é a isso que se destina o poema: mexer com a intimidade psíquico-emotiva daquele que se identifica com a proposta, com a sugestão que se vai transformar em imagens, graças à estranheza decorrente da subversão do sentido original dos vocábulos – a metaforização – e do corpo imagético prenhe de sugestão que suas palavras contêm, agregam e propagam. Por vezes o poema é um somatório de aparentes nadas, de inquietações e ansiedades que se alçam, tomando corpo, e, pelas verdades estranhamente forjadas através da inventiva, da farsa, da fantasia e dos sonhos, podendo adquirir sobrevivência literária e até a tal de imortalidade – que é o traço da boa ficção de literatice associativa – para o seu autor. Todavia, também as palavras morrem conforme a ação do tempo, frente à roda do gostar e desgostar e a exposição à fortuna crítica através dos tempos, e, enfim, aos seus efeitos dela na fenomenologia midiática. Todavia, como vimos falando de nascimentos, deixemos que os pósteros digam do envelhecimento e do eventual desaparecimento de tal ou qual palavra. Estamos vivos e recriando: a nós cabe a louvação da riqueza da gênese do criar, fazendo-se os devidos créditos aos seus intimoratos autores.

MONCKS, Joaquim. Atônito, a moer solilóquios. Obra inédita, 2020.

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