AMAR DE INVENÇÃO

O amor não se inventa. Ou ele existe ou não, no desejo e na vontade de um dos polos da relação amorosa, excepcionalmente nos dois. E nada importa a predileção: se homo ou heterossexual. O amor me parece o mesmo ou muito similar em ambos. O que varia, acrescendo ou minimizando, são os seus circunstanciais. O que o poeta faz criando é idealizar o polo afetivo, colocando nele o seu afeto escolhido e nem sempre possível ou factível. Veja-se o que ocorre normalmente com os poetas, homem ou mulher: dificilmente alguém canta o amor caseiro que se tem no dia a dia – o crucial cotidiano – e sim a figura amorosa que se não tem na mão ou ao alcance do abraço, do beijo e dos jogos do erotismo. O prazer (e o gozo consequencial) existente no poema é o jogo amoroso entre os neurônios, na cuca, e não os de acima dos joelhos. A farsa, a fantasia e o sonho produzem o gozo da irreal sedução. Por amor se morre e se vive todos os dias. É a farsa dos desejos que produz a vida que flui. Por vezes nem tão plácida ou fiel.

– Do livro inédito A VERTENTE INSENSATA, 2017/19.

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