Mensagem vista por Voltaire

François Marie Arouet (1694-1778) nasceu tão magro que a parteira lhe deu pouco tempo de vida, mas viveu quase 84 anos. A senhora sua mãe faleceu em 1701, quando o garoto tem apenas seis anos de vida. O senhor seu pai, advogado forense e tabelião de sucesso, como seu irmão Armand Arouet, eram jansenistas, um movimento religioso de doutrina cristã sobre a graça, predestinação e rígida moral humana. Além de não querer nada com o pensamento religioso da família, François, o parisiense de nascimento, anos mais tarde, negou sua paternidade e se declarou filho bastardo de Fochebrun.

Desde a infância, o garoto escreveu versos, como investia longas horas em leitura, revelando tendência literária. Foi devido a essa sua tendência, que a cortesã Ninon de Lenclos, ao falecer, deixou a herança de dois mil francos para o garoto ter uma boa educação secular. Assim, o menino foi educado pelo abade Coucrigny, um mestre cético e livre-pensador. Aos dez anos, François ingressou no famoso colégio Louis-le-Grand, dirigido por jesuítas, onde aprendeu a arte da Dialética.

Aos 17 anos, ao concluir seus estudos, o rapaz seguiu a carreira de escritor, uma “profissão de inúteis e vagabundos”, na visão de seu pai. Compondo versos, frequentando tabernas e chegando bêbado altas horas da madrugada, em casa, o senhor seu pai o enviou a um seu parente em Caen, com ordem expressa de mantê-lo confinado na residência, mas o “carcereiro” se encantava com o comportamento espirituoso do jovem parisiense.

Ele retornou à casa de seu pai, em 1713, e com a ajuda política do senhor Arouet, em setembro, o jovem iniciou carreira diplomática como secretário do Marquês de Châteauneuf, em Haia, na Holanda. Contudo, em dezembro, desempregado, devido às constantes puladas noturnas do muro da casa de Pimpette, uma jovem filha de um refugiado jansenista, François retornou à França e começou a estudar Direito. Com a idade de 21 anos deixou Caen e seguiu para Paris, exatamente, quando ocorreu a morte de Luís XIV, o Rei Sol, em 1º de setembro de 1715.

Irritado pela irreverência de dois poemas do jovem poeta que o acusou de querer usurpar o trono vacante, o regente real o meteu na Bastilha, no dia 16 de maio de 1717, onde permaneceu durante onze meses, tempo que usou para compor a peça teatral Édipo e o poema Henríada. Ao deixar a prisão política, em 18 de novembro do ano seguinte, adotou o pseudônimo Voltaire, com o qual se tornou mundialmente famoso. O teatrólogo fez um bom dinheiro com a encenação da peça teatral Édipo. Ela permanece encenada por 45 noites consecutivas em Paris, e lhe rendeu cerca de quatro mil francos.

Em 17 de abril de 1726, aos 30 anos, o famoso teatrólogo foi insultado pelo Cavaleiro de Rohan, durante um jantar no castelo do Duque de Sully. O simples fato dele, um plebeu, responder ao senhor feudal, era considerado um insulto, quanto mais o de lhe dar uma resposta sarcástica, como a deu, foi considerado crime de traição.

O aristocrata contratou um bando de vadios que, durante a escuridão da noite, deu uma surra em Voltaire. No dia seguinte, mesmo manco e todo enfaixado, ao se recuperar da ação nefasta, o plebeu apareceu no camarote do burguês e o desafiou para um duelo; depois, dirigiu-se a sua residência e passou o restante do dia treinando espadachim. Mas como o ofensor era primo do Chefe de Polícia, apelou a este por proteção. O desafiante foi novamente metido na Bastilha. Ele deixou a prisão quinze dias depois, sob a condição de se exilar na Inglaterra, por três anos.

Nos dias da dinastia dos Bourbons, um cidadão com título de nobreza gozava de poder absoluto. Assim, sem julgamento algum, podia enviar qualquer pessoa, sem título político, para a prisão.

Na terra de Sua Majestade, o exilado conviveu com Isaac Newton, Thomas Hobbes (1588-1679) e John Locke (1632-1704). Com este, Voltaire aprendeu o pensamento filosófico que despreza o sobrenatural. Envoltos pela teoria do conhecimento, os iluministas britânicos refutavam “verdades absolutas”, ao acariciar o conceito de que o conhecimento brota da experiência. Assim, iluminado pela filosofia iluminista inglesa, o jovem teatrólogo de temperamento ferino e sarcástico retornou a seu país, em outubro de 1728.

Em 1729, o astuto investidor comprou todos os bilhetes de uma loteria francesa, e assim ganhou sozinho o prêmio. Pelo restante de seus dias, o escritor famoso se tornou um astuto capitalista. Ele chegou até a financiar traficantes de escravos humanos.

Após o insucesso de sua peça teatral Artemire, o famoso escritor contraiu varíola, curando-se com a ingestão de oitenta litros de limonada.

Cerca de quatro anos depois, sem seu consentimento, um editor francês publicou o livro Cartas Filosóficas sobre os Ingleses, uma obra literária que fazia severas críticas aos costumes franceses. O Parlamento condenou a obra à fogueira ardente. Ante a iminência de apodrecer na Bastilha, o sarcástico escritor, aos 40 anos, fugiu com Emília Breteuil, de 28 anos, Marquesa de Châtelet, para o Castelo de Cirey, de propriedade de sua jovem amante. E para essa instalação se dirigia a elite francesa. Seu tempo foi gasto com escritos, os quais chegaram até a encantar a czarina Catarina I da Rússia.

Nesse período monárquico, devido aos “casamentos de conveniência”, nos quais belas donzelas da elite eram forçadas por seus pais a se casarem com maridos velhos e ricos, a jovem esposa gozava o direito de acrescentar um amante ao ninho, desde que as aparências sociais fossem cultivadas pela trindade sexual. E foi devido a essa brecha social, que o famoso teatrólogo, feio por natureza, mas irresistível de lábia, fugiu de Paris com a jovem Marquesa para um ninho entre as estrelas.

Protetora de filósofos, Madame de Pompadour, inimiga do Clero Romano e a preferida do monarca, concedeu a Voltaire o título de historiógrafo e o nomeou para a Academia Francesa, mas o escritor teve que assinar uma declaração formal de que era católico apostólico romano de carteirinha.

Após ser empossado como imperador da Prússia, Frederico II, livre-pensador, poeta e compositor, convidou Voltaire para integrar a corte de Potsdam. Então, em 1750, o famoso literato seguiu para Berlim. Entretanto, devido a aplicações financeiras proibidas pela coroa prussiana, como a intrigas outras, o famoso sarcástico francês deixou a corte e fixou residência na vila suíça de Les Délices, em março de 1754, próxima a Genebra, onde permaneceu por três anos. Contudo, dois anos depois, com a publicação de Ensaio sobre a Moral e o Espírito das Nações, de Carlos Magno a Luís XIII, na qual condenava o direito divino dos reis, o escritor ficou proibido de retornar a seu torrão natal. Revogada a pena, três anos depois, Voltaire comprou uma propriedade em Ferney, na fronteira com a Suíça, para onde convergiam intelectuais desse período histórico.

A ação policial implacável do Clero Romano tornou Voltaire um acirrado crítico da intolerância jesuítica que manipulava o pensamento do povo. E muitos casos perversos para isso contribuíram. Os cinco primeiros volumes de a Enciclopédia, obra de um grupo de intelectuais franceses, tais como Diderot, d’Alembert, Voltaire e outros, foram apreendidos pelo Clero intolerante.

O gênio do pensamento francês lançou mão do vocábulo superstição para caracterizar a ação nefasta desses religiosos. Os jesuítas eram os donos de tudo no reino dos Bourbons, e o povo morria de fome.

Não muito distante de Ferney, encontrava-se a cidade de Toulouse, cujos cidadãos se jactavam em comemorar o massacre aos protestantes franceses na famosa Noite de São Bartolomeu, como a revogação do Edito de Nantes, aquele que havia concedeu liberdade de culto ao povo protestante.

Nessa cidade, bastião do Clero, devido a leis discriminatórias, nenhum cidadão protestante podia exercer, livremente, o ofício de advogado, médico, farmacêutico, negociante, livreiro ou editor, enquanto empresários e comerciantes católicos romanos ficaram proibidos de contratar empregados jansenistas, huguenotes, albigenses, valdenses e demais ramos do protestantismo desses dias de intensa perseguição religiosa. Seis anos antes, em 1748, uma cidadã foi obrigada a pagar uma multa de três mil francos, pelo fato de contratar os serviços de uma parteira huguenote.

Protestante de Toulouse, Jean Calas tinha uma filha convertida ao Catolicismo, como um filho que se enforcou, supostamente, devido a fracasso nos negócios. Segundo uma lei francesa em vigor, o corpo nu de todo suicida devia ser posto sobre uma carruagem, com o rosto pendurado para baixo, circular pelas ruelas da cidade, e finalmente enforcado.

E, para evitar que o corpo de seu filho fosse arrastado, amigos testemunharam que o jovem falecera de morte natural. Em meio a esse turbilhão efervescente, ecoou o falso boato de que o rapaz havia sido assassinado por seu pai, para que o jovem não se convertesse ao Catolicismo. Em 1761 Jean Calas foi acusado, preso, torturado e assassinado, a mando de jesuítas do Clero Romano. A mãe e a irmã do suicida fugiram para Ferney e denunciam a ação perversa dos jesuítas a Voltaire.

Cerca de quatro anos depois, o jovem protestante de dezesseis anos, La Barre, foi acusado de mutilar crucifixos. Impiedosamente torturado, foi obrigado a confessar o crime, que não havia praticado. Em seguida, o protestante foi decapitado e seu corpo queimado em praça pública, juntamente com o livro, Dicionário Filosófico, uma obra escrita por Voltaire, a qual o jovem mantinha consigo. Como advogado, o famoso escritor defendeu as duas vítimas junto aos tribunais franceses.

A exemplo de Émile Zola (1840-1902) e de Anatole France (1844-1924), bravos franceses que, um século antes, se levantaram com seus escritos em defesa de Alfred Dreyfus, também, Voltaire, Diderot e d’Alembert se levantaram, com escritos de fogo e enxofre, para destruir a tirania da Superstição, a poderosa instituição religiosa que encharcou o solo francês com rios de sangue protestante. As canetas desses líderes foram tão penetrantes, que os embaixadores do deus Vaticinium, desesperadamente, usaram Madame de Pompadour para tentar comprar a consciência do ferino sarcástico, e esta lhe ofereceu o Chapéu Cardinálico por seu silêncio sepulcral. Mas, a oferta foi recusada pelo intelectual iluminista.

Sabiamente inspirado em Catão, o Censor (243-143 a.C.), que costumava finalizar seus discursos no Senado romano, dizendo: “Delenda est Carthago , o bravo e ferino francês, também, passou a concluir seus famosos escritos com a máxima sarcástica: “Ecrassez l’infame .” Em poucos dias, o grito de guerra de Voltaire contra o terrorismo de Estado, praticado por jesuítas, foi estampado em seu Tratado de Tolerância, que vendeu mais de 300 mil exemplares.

Em 1770, estando em Paris, seus amigos levantaram fundos para erguer um monumento ao famoso teatrólogo. Enquanto isso, poucos anos depois, aos 83 anos de idade, o famoso escritor resolveu visitar sua cidade natal. No dia 28 de fevereiro de 1778, ao chegar a essa capital, o abade Gauthier foi selecionado para que o escritor se confessasse com ele. O jesuíta exigiu que, publicamente, Voltaire confessasse sua fé no Catolicismo. Apesar de assinar a retratação, Voltaire morreu detestando a Superstição.

Ele faleceu no dia 30 de maio, e em seu túmulo, a seu pedido, foi gravada a seguinte inscrição: “Ele defendeu Calas”. Em Paris, os sacerdotes da Multinacional do Tibre, que era a proprietária dos cemitérios da cidade, recusaram enterrar o cadáver do homem mais popular da França; todavia um sacerdote de Scèllières garantiu o enterro ao corpo do mais famoso gênio de seu tempo.

Porém, em 1791, a Assembleia Nacional da Revolução Francesa obrigou o monarca Luís XVI a transportar os restos mortais do famoso escritor e depositá-los no Panteão de Paris.

O homem mais feio e mais popular da França tinha composição física de um esqueleto, nariz muito comprido, rosto marcado pela varíola, olhos como bolinhas de vidro e uma expressão sarcástica.

Esse gênio costuma dizer que as palavras voam, que os escritos permanecem, e que os livros governam o mundo.

Ele, que não cria ser Jesus de Nazaré, o Caminho, a Verdade e a Vida (João 14.6), passou sua existência terrena pesquisando escritos de ícones geniais da Antiguidade em busca da Verdade, e não a encontrou.

O célebre francês Victor Hugo se gabava em dizer, que, enquanto a Itália deu ao mundo a Renascença, e a Alemanha a Reforma Protestante, a França produziu Voltaire.

Voltaire, Rousseau, Mirabeau, Diderot, D’alambert, e famosos enciclopedistas alimentaram a Revolução Francesa, trilhando a vereda aberta pelo terror dos jesuítas. Discípulo dos escritos de Aristóteles, Voltaire foi um reacionário aos desmandos do Clero Romano, uma casta de jesuítas, que, em nome de Deus, exterminou inúmeros cientistas, enciclopedistas e protestantes franceses.

Entendemos que o famoso escritor francês cerrou uma forte oposição à Bíblia Sagrada, devido a ações de terror cometidas por jesuítas da igreja estatal e de escritos de iluministas britânicos com os quais conviveu na Inglaterra. Com o britânico Locke, o escritor francês aprendeu a rejeitar o sobrenatural, a refutar o conteúdo das Sagradas Escrituras e a reprimir a gestão do Criador sobre a Criação.

Conduzido a esse extremo perigoso, o virtuoso iluminista afirmou que a Bíblia e a fé cristã desapareceriam cem anos após sua morte. Todavia, no centésimo aniversário de seu falecimento, a Sociedade Bíblica de Genebra comprou a casa e a editora que haviam pertencido ao admirador de Aristóteles, e nessas instalações, passou a publicar Bíblias para iluminar o mundo. E cerca de 205 anos após sua morte, 1983 foi declarado O Ano da Bíblia.

Figura central do movimento filosófico iluminista, Voltaire rejeitava tudo o que não fosse baseado na razão humana. Este deísta acredita na existência de um Criador, mas que este não intervinha na administração das coisas que criou. Segundo o amante da liberdade de pensamento, o Universo obedece às leis da Mecânica, e que o ser humano deve se ater à luz da razão. Fervoroso crítico da ideia de que o Criador se revela à Criatura, o iluminista criticava a Bíblia, os milagres nela contidos e o sacrifício vicário do Nazareno no Calvário.

Iluminado pelos holofotes da razão, o famoso deísta enfatizou: “Estou cansado de ouvir dizer que doze homens estabeleceram a religião cristã. Eu provarei que basta um homem para suprimi-la.” Mas um primitivo reformador protestante observou que a Bíblia é a “bigorna que tem gasto muitos martelos”.

Postado no leito de sua cama, antes de falecer, o famoso filósofo bradou durante toda a noite por perdão. A enfermeira que o assistiu, e que é de formação protestante, apavorada com o desespero do intelectual, declarou ao médico que assistia o filósofo francês: “Por todo o dinheiro da Europa, não quero mais ver um incrédulo morrer!”. Ao longo da noite que antecedeu sua morte, o moribundo bradou: “Fui abandonado por Deus e pelos homens, eu irei para o inferno”.

A Bíblia é soberana

Raimundo Nonato Freitas de Cerqueira

Florianópolis, Santa Catarina, Brasil

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RNF Cerqueira
Enviado por RNF Cerqueira em 27/03/2019
Reeditado em 12/10/2023
Código do texto: T6608871
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