À BEIRA DO POEMA I e II
À BEIRA DO POEMA I – Álvaro Giesta & Frassino Machado
- Álvaro Giesta. Já disse que gostei e agora digo que andais todos, e tu também, a tentar dar-me a volta - tu mais poeticamente – para eu não deixar de escrever poesia. Ora bem, grato pela essência do teu poema, mas digo que vou mesmo dedicar-me ao ensaio - tenho um a meio, de que já apresentei resenha, durante uma hora e meia no Palácio do Egipto, o ano passado - e requer muito mais estudo da obra de Pascoaes e de quem já sobre ela escreveu, para a completar (a minha). Como fazê-lo, dedicando-me tanto à poesia? Há que fazer uma pausa!
De qualquer modo tenho os quatro manuscritos mais o HÚMUS – com publicação assente para Setembro do próximo ano – não falando dos dois do Miguel Faia, há muitos anos guardados e a amadurecer nas gavetas.
Meu caro Frassino, a verdade é só uma: não vou acabar só quando tiver a voz roufenha como a da Amália… Abraço e até dia 3 (se não for antes).
Álvaro Giesta
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- Frassino Machado. Ó Álvaro, ao ler este teu "apressado texto", o qual eu entendo bem (oh, se entendo!) teria, de imediato, umas assertivas palavras para te aplicar. Mas – diz-me cá uma suposta "inspiração" – que será mais prudente que o nosso amigo TEMPO as tempere, em conformidade.
Por hoje apenas entalo aqui esta dica (que se usa muito lá para as bandas do alto Minho): olha, vai-te encher de brio, que o mesmo é dizer "de moscas". Eu já sei o que a casa gasta. Tu – e ninguém obviamente me contradirá – serás sempre um poético-dependente. Já nenhum físico (por mais “prodigioso” que seja) te curará desta doença: ela passa mas… volta logo na primeira esquina! Todavia, também sei que a «santa liberdade» sempre foi e será o teu forte. Daí que não há muito a fazer.
Bons auspícios e melhor Luz!
Um cordial abraço do poetAmigo Frassino Machado
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À BEIRA DO POEMA II – Frassino Machado
Fico reconhecidíssimo por teres apreciado o texto-poético-crónica acerca da minha presença no teu último lançamento. Gostei sobejamente da Sessão porque ficou mais que comprovado, verdadeiramente, que a arte poética pode conter fraternidade e partilha. Bem hajas por isso e parabéns pela excelente convivência que aí ocorreu. Bom seria que pudessem acontecer, aqui e além, “sessões” análogas.
Estando nós, os dois, discorrendo acerca destas circunstâncias que nos são comuns – as lides poéticas – compete-me dizer-te que, no que me toca de procedimento dialogal, é meu timbre utilizar uma linguagem sem “muralhas” e com o mínimo de sombras possível… esperando obviamente que abarques para lá dos cem por cento (assim o espero) o verdadeiro sentido deste meu arrazoado.
Quero iniciar este pensa-que-pensa/sente-que-sente, de que me orgulho em alto nível, com uma “confissão de fé poética” que não partilho daquela «ideia» que manifestaste na tua sessão do domingo passado: que não acreditas em INSPIRAÇÃO (aquilo que vem do espírito) nem sequer em MUSAS (delegadas de Belo, deus do canto das águas, em Pascoaes)! E tu, ademais, que estás pensando num largo «Ensaio» sobre este distinto poeta!? Prepara-te, que nessa longa travessia pelas “terras do Marão” há que esvoaçar, e bem, por dentro e por fora… de tal forma que o melhor, provavelmente, é ires antes pelo “túnel da montanha” em busca de novas claridades e novas radiações anímicas.
No contexto, atrás sublinhado, em que situação ficará o Miguel Faia? Imagino…
Uma sugestão, que deixarei disponível por aqui, é ires pensando numa daquelas “gazuas” monumentais para perfurar a dita montanha. E a mais adequada – quanto a mim – dá pelo nome de «poesia». Sendo assim precisarás certamente de inspiração/suspiração/transpiração e, acima de tudo, emoção!
Emoção, sim, pois doutra forma nem com ajuda das Musas lá chegarás. A não ser que metas uma “cunha” a Belo! Se bem que, pelo traquejo que já vais tendo, com um pouco de calma e perspicácia talvez possas lá chegar com algum Ensaio. Quem sabe, um «Ensaio Poético». Todavia, podes crer, que com algo de Inspiração e uma empiscadela esporádica a uma ou outra Musa talvez consigas vislumbrar uma luz ao fundo do dito túnel.
“Há que fazer uma pausa”? Eh, pá, nem parece de ti! Pausar, parar, tresolhar (como um “tolo” no meio da ponte) … a não ser o Pobre Tolo do referido Pascoaes que, esse, coitado “ébrio de luz, sorri, contente” … e, quem sabe, talvez chegue incólume ao outro lado da ponte, à outra margem do rio que, para qualquer poeta é a realização do seu poema. Logo, aqui, só chegarás “incólume” ao fim do teu projecto num incessante e profícuo fluir das circunstâncias.
Por isso o próprio Pascoaes, mais que ninguém neste amorfo país, proclamou aos quatro ventos – na música da voz do povo – que parar é morrer. O poeta, não pode ter pausas! Até porque, podes ter a certeza, o “bichinho da poesia” não te deixaria jamais descansado e corroer-te-ia fatalmente com uma “epidemia saudosista” – a mesma que “matou” o poeta de Marânus.
Não, poeta Álvaro Giesta, jamais deixarás a Poesia. Já o nosso conhecidíssimo Jorge de Sena o disse: “ninguém nasce poeta porque ele se revela no fluir do tempo e jamais reverterá!” E, agora digo eu, mesmo que deambulemos pelo ensaio, pelo conto, pelo drama, pelo romance, ou até pela filosofia (tal e qual o fez Pascoaes) iremos sempre “cair na poesia”. Veja-se Raul Brandão. Nunca se assumiu como poeta mas, no dizer de Maria Angelina, o genuíno espírito que ele respirava era a sua “alma de poeta”. E isso, verdadeiramente, se revela página a página ao longo de toda a sua literatura. Não é preciso ir mais longe: basta ler/reler e reflectir o seu Húmus. É mesmo de espantar, tu que o digas (?).
Aqui te deixo um enormíssimo abraço e te desejo os melhores auspícios para a tua Poesia, quer dizer, para a tua «arte de escrever».
Post Scriptum: Lembrei-me agora – espera lá! – Suspeito que o teu desabafo dubitativo poderá ter a ver com um certo cansaço literário (?). Se assim for melhor seria projectares um relax (tipo férias terapêuticas) na Pascoalina Quinta da Paz. Dizem os especialistas destas coisas da alma que uma mudança oportuna de tarefas favorecerá uma bem-vinda regeneração. E vem a talho de foice recordar que o remédio mais comum é uma passagem por actividades agrícolas. Já, inquieto, inquiria duplamente Pascoaes que “A enxada será irmã da pena? A fome de pão parecer-se-á com a fome de luz?”.
O teu poetAmigo sempre Frassino Machado